AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

domingo, 3 de maio de 2020

DA LIBERDADE DE IMPRENSA


Hoje, 3 de Maio, também se assinala o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa.  Como não podia deixar de ser, os tempos duros que vivemos também afectam significativamente a imprensa nos seus diferentes suportes. Muitos títulos, sobretudo ao nível da imprensa escrita regional, mas também em termos nacionais estão ameaçados de sobrevivência, em risco de encerramento.
Por outro lado, mais do que nunca precisamos de uma imprensa autónoma e independente que na luta pela verdade combata … também a imprensa e todos os que trabalham e se alimentam de “fake news”, “factos alternativos” ou da fabricação da “pós-verdade”. Há uns anos numa entrevista ao Público, Tom Rosenstiel, especialista em comunicação, afirmava que se o jornalismo, (os jornais), deixar de ser rentável e, como tal, corra o risco de desaparecimento, as democracias poderão sofrer um "cataclismo cívico".
No entanto, mesmo não desaparecimento, sem liberdade de imprensa o risco de "cataclismo cívico" permanece. Precisamos que a imprensa cumpra o seu papel, seja proactiva e não só reactiva.
Se analisarmos o nosso quotidiano nesta matéria creio que parte da imprensa é, frequentemente complacente com as lideranças económicas e políticas, mas também frequentemente esta complacência assenta no seu próprio alinhamento. Em qualquer dos casos um mau serviço prestado à cidadania, à liberdade de imprensa.
Acho deplorável, por exemplo, que muitos profissionais da imprensa aceitem a forma como algumas figuras reagem ao ser abordadas sobre assuntos sobre os quais, por várias razões, não lhes interessa discorrer, mas que são relevantes em nome da liberdade de imprensa. Surgem então as afirmações patéticas, “não tenho nada a acrescentar”, “desculpem, não comento”, “não estou aqui para falar dessas matérias,” etc., etc.
É grave a existência de uma comunicação social, boa parte dela, passiva e resignada, que não confronte as figuras públicas com estes comportamentos, não os denuncie, e que acorram solícitos quando essas figuras entendem que têm algo a dizer, frequentemente irrelevante. Esta subserviência interessará a alguns que também têm as suas agendas. Às vezes são recompensados.
Recordo que em 2017 o Sindicato dos Jornalistas apelou a que a classe "boicote" as conferências de imprensa ou declarações em que não sejam permitidas questões. É de recordar que no Congresso dos Jornalistas realizado em Janeiro de 2019 foi aprovada por unanimidade uma decisão no mesmo sentido, as iniciativas com a proibição de perguntas não seriam noticiadas.
Como é evidente esta decisão não teve qualquer consequência e recorrentemente assistimos a situações deploráveis de desrespeito pelo direito à informação.
Levada a sério e posta em prática poderia ser um forte contributo para combater o modo como muitas lideranças entendem o papel da imprensa, serve para divulgar apenas a mensagem que lhes interessa mostrando-se indisponíveis para responder a questões. A imprensa é apenas um veículo publicitário dos seus produtos ou “verdades”.
Para além desta atitude seria ainda desejável que quando colocam questões, os jornalistas façam as perguntas adequadas e não uma encenação de diálogo que mais não é que um monólogo a dois, ou seja, independentemente das perguntas, o inquirido fala do que quer sem que isso lhe seja cobrado. É importante o movimento de “fact checking” que tem vindo a ser estruturada em alguns títulos ou grupos de comunicação, mas é preciso mais.
Também é importante que no âmbito de uma cidadania mais responsável, e, portanto, mais informada, tenhamos consciência de que a existência de uma imprensa com liberdade e que cada vez mais está em suportes digitais tem custos, a dependência económica para a sobrevivência não é amigável para a independência. Neste contexto, também nos compete contribuir, pagando o acesso a conteúdos e, assim, suportar parte dos custos de uma imprensa com maior liberdade.
Sei que não será fácil, todavia também tenho a convicção de que seria uma forma de proteger a imprensa e o seu insubstituível papel como um dos pilares de sociedades abertas e democráticas.


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