AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quinta-feira, 28 de novembro de 2019

UM TRABALHO SOBRE INDISCIPLINA ESCOLAR


Face ao volume de referências a episódios de indisciplina escolar tentámos desenvolver um trabalho a partir de uma situação concreta.
Numa escola pública da periferia de Lisboa, um aluno do 9º ano envolveu-se numa discussão com um colega durante um trabalho de grupo na aula da Inglês e acabou por dizer um palavrão acompanhado de um gesto explícito a condizer. A cena foi, como de costume, registada num telemóvel e rapidamente apareceu no Youtube. Procurámos alguns comentários a mais este grave incidente que afectou o espaço escolar. Começámos pelo Parlamento.
Um deputado do PS referiu que graças à eficácia e à bondade das políticas educativas do governo do PS a situação estava incomparavelmente melhor pois tem a informação do Director da escola de que na semana anterior o mesmo aluno tinha dito dois palavrões na aula de Matemática.
Ouvimos uma deputada do CDS-PP que, depois de um "Oiça", disse que, tal como o CDS-PP sempre tem afirmado, o PS transformou o espaço escolar num espaço de delinquência e insegurança frequentado por imigrantes e filhos de utentes do Rendimento Social de Inserção, pelo que problemas desta natureza são frequentes e, também num tremer de pálpebras, citou Paulo Portas, "se não prendem esta gente, nada será como antigamente".
O deputado do PCP que ouvimos referiu-nos que até a própria juventude começa a dar sinais de contestação tomando posições firmes contra a ditadura das políticas de direita da 5 de Outubro. Um membro dos Verdes que ia a passar disse não ter mais nada a acrescentar.
Entretanto, uma deputada do Bloco manifestou a sua satisfação pela atitude não conformista do adolescente e a capacidade de erguer a sua voz minoritária para dizer o palavrão que mais ninguém disse.
Finalmente, ouvimos um deputado do PSD que nos referiu a falta de credibilidade do Primeiro-ministro como causa para incidente tão grave.
A deputada do Livre analisa o episódio à luz da defesa de uma identidade e no activismo promotor dessa identidade. Um deputado do PAN aponta na necessidade de que cada aluno possa ter um animal de estimação consigo o que minimizaria os riscos de indisciplina. O deputado da IL defendeu que era importante que todos os bons alunos, os que querem aprender e se portem bem, fossem para estabelecimentos de ensino privado pois aproveitariam melhor e as escolas públicas ficariam para os que não querem aprender e se portam mal.
Finalmente o deputado do Chega com a sua tshirt branca ainda vestida, defendeu que mais do que professores seria necessário um polícia em cada sala de aula e se assim não for, será uma vergonha.
Uma representante de um pensamento educativo conhecido por "eduquês", seja lá isso o que for, afirmou que se tratou de uma expressão positiva de desconforto por parte do adolescente, na afirmação da sua autonomia e competências interpessoais no quadro de uma sala de aula interactiva. Pois.
Conseguimos ainda a opinião de um reconhecido especialista, Miguel Sousa Tavares, que entende o episódio como mais uma prova de incompetência de uma classe que tem três meses de férias, não é avaliada e ganha balúrdios.
O conhecido opinador Santana Castilho, que ia a passar, disse também qualquer coisa que não se percebeu muito bem, mas clamava que estava contra e que tinha saudades do tempo em que foi Secretário de Estado e a educação em Portugal era um paraíso.
Desistimos do trabalho.
Agora mais a sério, indisciplina na escola e a sua gravidade são, também um espelho do clima social em que vivemos com reflexo na percepção de autoridade, estilos parentais, sistema de valores, etc. Algumas das dimensões relacionadas com o problema estão estudadas, são conhecidas. Vejamos algumas sem ordenação de importância, tempo de permanência excessivo dos alunos nos espaços escolares com actividades desadequadas, inexistência de recursos humanos de mediação de conflito envolvendo alunos, professores e pais, desajustamentos dos normativos e determinações processuais, inexistência ou insuficiência de dispositivos de apoio a docentes e alunos designadamente no que se refere a comportamento e relações interpessoais, fragilidades na liderança e autoridade em professores e directores escolares.
Sem se intervir seriamente nestas matérias, vamos sempre constatar que os episódios de indisciplina são demasiado frequentes, o que não é estranho, mas nada adianta.

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