AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

sábado, 21 de setembro de 2019

DOS COMPORTAMENTOS EM CONTEXTO ESCOLAR


No Expresso encontram-se duas peças sobre uma mas mais preocupantes questões no universo dos mais novos e da educação, a violência de diferente natureza, incluindo psicológica, presente nas relações interpessoais entre adolescentes e jovens e a percepção de normalidade relativa a vários tipos de comportamento. Muitas vezes aqui tenho abordado esta questão mas é preciso insistir.
O primeiro trabalho refere que o ME tem em preparação um plano e uma campanha com o lema, “Escola sem bullying. Escola sem violência” dirigida para o bullying que envolverá a rotina de serem reportados pelas escolas todos os episódios de bullying e iniciativas que visam melhorar a identificação de alerta, orientação para docentes e escolas ou a disponibilização de formação para professores e de uma plataforma com conteúdos de orientação para alunos, famílias e escolas.
A generalidade dos estudos sugere valores entre 10 e 25% de vítimas de bullying envolvendo adolescentes e jovens sendo que é ainda mais preocupante o crescimento da variante cyberbullying que, dada a sua natureza não presencial e permanente, contém riscos de crescimento e sofrimento muito fortes.
Na segunda peça é divulgado o programa de intervenção da responsabilidade do Departamento de Educação e Psicologia da UTAD, designado Prevint, que foi operacionalizado em mais de 100 escolas e apresentado a perto de 14 000 alunos e que originou uma ferramenta de apoio agora disponível online. O Programa é direccionado para a identificação, intervenção e prevenção no âmbito da violência presente de diferentes formas e com incidência preocupante nas relações interpessoais de adolescente e jovens.
Retomando notas já aqui escritas é importante sublinhar que uma das características do fenómeno, nas suas diferentes formas, incluindo o emergente cyberbullying, é justamente o medo e a ameaça de represálias a vítimas e assistentes que, evidentemente, inibem a queixa pelo que ainda mais se justifica a atenção proactiva e preventiva de adultos, pais, professores ou funcionários. Importa ainda não esquecer o risco acrescido e documentado de alunos de grupos minoritários, alunos com necessidades especiais ou com orientação sexual diversa, por exemplo.
Tal como se define na iniciativa do ME e no trabalho da UTAD, neste universo importa considerar dois eixos fundamentais de intervenção por demais conhecidos, a prevenção e a intervenção depois dos problemas ocorrerem. Esta intervenção pode, por sua vez e de forma simplista, assumir uma componente mais de apoio e correcção ou repressão e punição, sendo que podem coexistir. Com alguma demagogia e ligeireza a propósito do bullying, como de outras matérias como a indisciplina, por exemplo, as vozes a clamar por castigo têm do meu ponto de vista falado mais alto que as vozes que reclamam por dispositivos de prevenção, intervenção e apoio para além da óbvia punição, quando for caso disso.
A incidência de episódios de bullying, como também de indisciplina, mostra a necessidade de dispositivos de apoio e orientação absolutamente fundamentais para que pais, professores e alunos possam obter informação e apoio. Existem, felizmente, várias iniciativas com um trabalho positivo, mas apesar da colaboração em projectos nas escolas, muitas destas iniciativas vêm de fora da escola. Todas as iniciativas, campanhas e projectos são relevantes mas é nas escolas e com as escolas e as suas equipas que tudo deve acontecer, não esquecendo, obviamente, o contexto da educação familiar.
Assim, a existência de dispositivos de apoio sediados nas escolas, com recursos qualificados e suficientes, a presença suficiente de assistentes operacionais com funções de supervisão dos espaços escolares, são algumas das prioridades. Sem entrar numa lógica de corporativismo profissional, creio que o papel dos psicólogos de educação podem dar um contributo sério mas o seu número nas escolas e agrupamentos e rácio excessivo verificado inibem uma melhor intervenção e participação.
Do meu ponto de vista, o argumento custos não é aceitável porque as consequências de não mudar são incomparavelmente mais caras. Depois das ocorrências torna-se sempre mais fácil dizer qualquer coisa mas é necessário. Muitas crianças e adolescentes evidenciam no seu dia-a-dia sinais de mal-estar a que, por vezes, não damos atenção, seja em casa, ou na escola, espaço onde passam um tempo enorme.
Estes sinais não podem, não devem, ser ignorados ou desvalorizados. O resultado pode ser grave.

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