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quarta-feira, 27 de março de 2019

O ACESSO DOS ALUNOS DOS CURSOS PROFISSIONAIS AO ENSINO SUPERIOR

Li com alguma perplexidade e preocupação a decisão agora conhecida do Ministério da Ciência e Ensino Superior de estruturar já para o próximo ano lectivo um projecto-piloto destinado ao acesso ao ensino superior por parte dos estudantes que concluam o secundário através dos cursos profissionais.
Em vez de realizarem os exames nacionais como a generalidade dos candidatos com as dificuldades decorrentes do seu trajecto curricular candidatam-se em concursos locais às licenciaturas (instituições) que pretendem frequentar. Cada instituição, universidade e politécnico, decidirá que dispositivo e critérios regularão a ordenação das candidaturas dos estudantes vindos cursos profissionais. Algumas notas.
Em primeiro lugar reafirmar o que de há muito defendo, a conclusão e certificação de conclusão do ensino secundário e a candidatura ao ensino superior deveriam ser processos separados.
Os exames nacionais destinam-se, conjugados com a avaliação realizada nas escolas, a avaliar e certificar o trabalho escolar produzido pelos alunos do ensino secundário e que, obviamente, está sediado no ensino secundário. Neste cenário caberiam também as outras modalidades que permitem a equivalência ao ensino secundário, como é o caso do ensino artístico especializado ou os cursos profissionais.
Entendo também que o acesso ao ensino superior é um outro processo que deveria ser da responsabilidade do ensino superior e estar sob a sua tutela minimizando também os efeitos pouco positivos reconhecidos pela OCDE na relação estabelecida por alunos, escolas e famílias com os exames e os efeitos dessa relação. Sublinho minimizando equívocos que a questão não está na existência ou importância dos exames finais do secundário que não me parece colocar grandes dúvidas. A questão é que os resultados obtidos nesses exames deveriam constituir apenas um factor de ponderação a contemplar com outros critérios nos processos de admissão organizados pelas instituições de ensino superior como, aliás, acontece em muitos países.
Em segundo lugar uma nota para sublinhar importância do combate ao abandono escolar precoce e ao entendimento da qualificação, designadamente de natureza superior, como um bem de primeira necessidade e recordar que ainda estamos longe dos indicadores ideais nesta matéria.
Dito isto e apesar da proposta do MCES deslocar para as instituições de ensino superior o processo e os critérios de acesso, o facto de apenas envolver os alunos dos cursos profissionais levanta-me sérias dúvidas.
Existindo ofertas formativas abertas a todos os estudantes porquê estabelecer critérios “próprios” apenas para quem vem dos cursos profissionais? Que escrutínio deste processo? Temo que, tal como aconteceu com o Programa Novas Oportunidades que partiu de uma boa ideia, possamos cair no equívoco de confundir “certificação” com “qualificação” com efeitos “estatísticos” mas … de robustez qualitativa duvidosa.
Trabalho numa instituição de ensino superior privada dependente das propinas pagas pelos alunos pelo que mais à vontade para afirmar que esta reserva não tem a ver com qualquer espécie de elitismo relativo ao acesso ao ensino superior. Remete exclusivamente para a imperiosa necessidade de termos pessoas qualificadas e não de pessoas com um diploma debaixo do braço onde conste a certificação de uma habilitação e competência que causem alguma sombra de desconfiança com reflexos sérios na empregabilidade e na confiança social.
Os critérios e formas de acesso ao ensino superior devem ser pensados para todos os jovens que estejam em circunstâncias de poder concorrer e não para um grupo particular, os alunos dos cursos profissionais.
Esta medida, apesar do princípio me parecer ajustado desde que bem regulado e transparente, pode ser um enorme tiro no pé e na credibilidade imprescindível a estas processos.

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