AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quarta-feira, 14 de novembro de 2018

COMPORTAMENTO E AUTO-REGULAÇÃO


O Projecto Geração 21 é um estudo longitudinal de âmbito europeu que em Portugal acompanha 8600 crianças nascidas em 2005 na área metropolitana do Porto e que são regularmente avaliadas em diferentes dimensões.
A avaliação mais recente considera a idade 12 e 13 anos em que estão as crianças seguidas. Os dados já conhecidos são importância significativa.
Para além de informação que merece a maior reflexão relativos, por exemplo, aos estilos alimentares e excessos e desequilíbrios evidentes, no âmbito dos processos educativos também emergem alguns indicadores que justificam análise séria.
Por razões de espaço retomo um deles que muitas vezes abordo quer aqui, quer em espaços e contextos de intervenção profissional, conversas com pais, por exemplo, a pouca autonomia deste grupo etário e a forma como a promovemos ... ou não.
De há muito e sempre que penso ou falo de educação afirmo que a autonomia é a essência da educação, seja familiar ou escolar, em qualquer idade.
De facto, o que se pretende num processo educativo será a construção de gente que sabe tomar conta de si própria da forma adequada à idade e à função que em cada momento se desempenha. Este entendimento traduz-se num esforço contínuo de promover a autonomia das crianças e jovens para que "saibam tomar conta de si próprios", no fundo, a velha ideia de, "ensinar a pescar, em vez de dar o peixe".
Torna-se, pois necessário que proactivamente adoptemos comportamentos que favoreçam esta autonomia dos miúdos e dos jovens como também é necessário que sejamos consistentes na definição de regras e limites que regularão as suas decisões. No entanto, é minha convicção que por razões que se prendem com os estilos de vida, com os valores culturais e sociais actuais, com as alterações das sociedades, questões de segurança, por exemplo, estamos a educar os nossos miúdos de uma forma que não me parece, em termos genéricos, promotora da sua autonomia.
As crianças são permanentemente solicitadas para a aquisição de saberes e realização de actividades que serão obviamente importantes para o seu desenvolvimento e para o seu futuro mas, ao mesmo tempo, são miúdos, pouco autónomos, pouco envolvidos nas decisões que lhes dizem respeito cumprindo agendas que lhes não dão margem de decisão sobre o quê e o porquê do que fazemos ou não fazemos. Acabam por se tornar menos capazes de decidir sobre o que lhes diz respeito, dependem da "decisão” de quem está à sua volta, companheiros ou adultos.
Boa parte do comportamento desregulado em contexto escolar ou familiar que observamos em crianças e adolescentes radica na sua baixa capacidade auto-regulação pois, sabendo obviamente quais são os comportamentos adequados em cada contexto é “incapaz” de decidir assumi-los quando ainda consegue ser apoiado por boa parte dos pares no seu “mau comportamento”. Um exemplo, para clarificar. Um adolescente não habituado a tomar decisões, a fazer escolhas, mais dificilmente dirá não a uma oferta de um qualquer produto ou um a convite de um colega para um comportamento menos desejável. É mais difícil dizer não do que dizer sim aos companheiros da mesma idade. Num sala de aula é bem mais provável que um adolescente tenha um comportamento adequado resistindo à aprovação que teria por parte de muitos colegas porque "decida" que é assim que deve ser, do que por "medo" das consequências ou .
Só crianças, adolescentes e jovens autónomos, autodeterminados, informados e orientados sobre os riscos e as escolhas serão mais capazes de dizer não ao que se espera que digam não e escolher de forma ajustada o que fazer ou pensar em diferentes situações do seu quotidiano, na sala de aula, no bairro ou em casa. Este entendimento sublinha a importância de em todo processo de educação, logo de muito pequeno, em casa e na escola, se estimular a autonomia dos miúdos. É que se eles não tomarem bem conta se si passaremos, pais e professores, boa parte do tempo a "tomar conta deles" e ... muitas vezes não conseguimos. O clima o comportamento em muitos contextos familiares e em muitas salas de aulas é eloquente relativamente a esta questão.
Creio que este entendimento está pouco presente em muito do que fazemos em matéria de educação familiar ou escolar e para todos os miúdos.
Todos beneficiariam, miúdos e adultos, professores ou pais.

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