AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

domingo, 21 de janeiro de 2018

A COLETOTERAPIA

Confesso que senti um sobressalto de inquietação quando li a notícia do Público que recorrendo a um trabalho do The Guardian refere o facto de se assistir com frequência crescente em escolas da Alemanha ao recurso à colocação de coletes de areia com peso variado em crianças diagnosticadas com Perturbação de Hiperactividade e Défice de Atenção. A medida, dizem alguns testemunhos terá efeitos positivos e será menos “agressiva” que a medicação. A evidência científica sobre estes efeitos é frágil  e por isso vale a pena ler toda a peça do The Guardian.
Umas notas breves.
Conhecem-se todas as reservas que em diferentes países se têm vindo a colocar relativamente à base científica para o exponencial aumento de diagnósticos deste tipo de problemas e o consequente disparar do consumo do metilfenidato mais conhecido por um dos seus nomes comerciais, Ritalina. Portugal é um bom exemplo. Segundo dados do Infarmed, em 2010 prescreveram-se no SNS 133 562 embalagens e em 2016 o número foi 270 492. É ainda de considerar que em 2015 63% do volume do fármaco foi usado entre os 10 e os 19 anos e 26% até aos 9 anos. Os adultos consumiram “apenas” 7% do volume total de prescrições. Um cenário que merece a maior das atenções.
No entanto, a minha inquietação remete para a natureza da “opção” terapêutica ou educativa, por assim dizer, vestir um pesado colete de areia às crianças melhora a sua hiperactividade e/ou défice de atenção.
Será que pode valer tudo em nome de uma suposta melhoria provocada por um peso às costas que condicionará a mobilidade. Terá também propriedades relaxantes como se anunciam para alguns dispositivos naqueles inenarráveis anúncios televisivos das horas de almoço?
Ainda segundo a notícia do The Guardian os coletes oscilam 1,2 e seis Kg têm custos entre 140 e 170 euros. Como será calculada a “dose terapêutica” adequada?
Tenho um enorme respeito pelas dificuldades sentidas por pais e educadores que lidam com as crianças e os problemas que as possam afectar. Tenho ainda mais respeito pelas crianças que sofrem em diferentes circunstâncias, sejam pelo que realmente as afecta, seja pelas consequências de intervenções desenhadas com base no que se “acha” que as afecta.
No entanto, considero que a dignidade das crianças é uma linha vermelha que não pode, não deve, ser ultrapassada.
É também o entendimento de alguns especialistas citados pelo The Guardian.

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