A vinda do Papa Francisco a
Portugal no contexto do centenário do fenómeno de Fátima não pode deixar de ser sublinhada, mesmo para um não crente como eu. O
peso da Igreja Católica no nosso país e no mundo justifica a referência se bem
que sejamos constitucionalmente um estado laico pelo que a tolerância de ponto
aos funcionários da administração, ainda que habitual, não deixa de ser pouco
justificada.
O discurso da Igreja sobre Fátima
na sua face mais pública entrou em reversão, para recorrer a um termo em moda.
Duas figuras da Igreja em Portugal
produziram afirmações importantes. O Bispo D. Carlos Azevedo, Delegado
pontifício da Cultura no Vaticano, afirmou “Maria não vem do céu por aí abaixo”
e entende que é o momento de usar uma “linguagem exacta” sobre os
acontecimentos de há 100 anos na Cova da Iria, aconteceram visões imaginativas,
místicas, não aparições.
Por outro lado, em entrevista ao Expresso o Padre Anselmo Borges diz, “É evidente que Nossa Senhora não apareceu em
Fátima”.
Aguardo com alguma curiosidade a
forma como o Papa Francisco se referirá às circunstâncias que motivam a sua
visita.
No entanto, apesar de alguma
frescura nos discursos e comportamento do Papa Francisco não estou
particularmente confiante numa mudança de substantiva embora, mesmo como não crente,
a julgue essencial pelo papel e significado que a Igreja ainda mantém nas
nossas comunidades.
A propósito das mudanças na
Igreja, ou da sua ausência, recordo que D. Manuel Martins, bispo emérito de Setúbal, afirmava
em 2012, em entrevista ao JN, que a Igreja não está à altura do momento, está
"atrasada" e não presta atenção às "transformações do
mundo".
A afirmação de D. Manuel Martins
lembrou-me o conhecido enunciado, "no entanto ela move-se". Ao que a
história ou a lenda rezam, no séc. XVII Galileu Galilei reagiu com esta mítica
afirmação à sua condenação no Tribunal do Santo Ofício pela defesa do modelo
heliocêntrico, a Terra move-se em volta do Sol.
Do meu ponto de vista, a
reconhecida perda da influência da Igreja Católica, sobretudo nos países mais
desenvolvidos, deve-se também ao seu imobilismo, à forma conservadora como não
reage às óbvias mudanças sociais, políticas, económicas e culturais sustentando
um progressivo afastamento da vida das pessoas, como reconhecia D. Manuel
Martins.
Um dia, talvez a instituição
Igreja aceite e perceba a importância e a necessidade de mudança no discurso e
nas atitudes relativas ao divórcio e casamento, às uniões entre pessoas do
mesmo sexo e adopção por parte destes casais, à anticoncepção, ao celibato dos
padres, à abertura do sacerdócio às mulheres, o combate à ostentação visível em
parte das estruturas da igreja, etc. Aliás, estas foram justamente algumas das
questões referidas pelo Padre Anselmo Borges na entrevista ao Expresso e para
as quais entendia a necessidade de mudanças na Igreja
No entanto, considerando o que se
tem ouvido e é conhecido das intervenções da poderosa hierarquia da Igreja, não
creio que, apesar de alguns comportamentos e discursos do Papa Francisco e
também da significativa mudança de estilo face ao seu antecessor Bento XVI,
seja de esperar um movimento de alteração significativa nas posições da Igreja
sobre estas matérias.
Eppur si muove.
Eppur si muove, "COM MUITA COSMÉTICA"
ResponderEliminarVIVA!