AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quinta-feira, 16 de junho de 2016

TEMPO DE FÉRIAS ESCOLARES

À medida que se cumpre o calendário de exames, este ano mais leve sem os exames obrigatórios de 4º e 6º ano, vão chegando as férias escolares, começando pelos mais novos.
Depois de um trabalho que alguns acham leve e outros, como eu, acreditam bem pesado, cerca de dez semanas sem aulas aguardam os alunos. A duração das férias escolares de Verão entre nós está dentro do que em termos médios se verifica nos países europeus, embora para muitos alunos o tempo de estadia na escola seja uma enormidade, pois entre actividades curriculares, actividades de extensão curricular e a utilização de um dispositivo chamado de Componente de Apoio à Família, existem crianças e adolescentes que passam mais de 50 horas por semana na escola. É obra, pelo que são totalmente merecedores de férias.
Para além da maior ou menor satisfação com os resultados escolares, as férias trazem um problema sério a milhares de famílias: o que fazer com os mais novos enquanto não chegam as suas férias ou as aulas?
De há uns anos para cá tem emergido o que se pode chamar de nicho de mercado, sempre o espírito empreendedor e atento do mercado, que vem ao encontro desta necessidade. A esta oferta emergente deve juntar-se a que existe ligada, por exemplo, a instituições de solidariedade social, a autarquias ou a associações de pais que assumem um papel relevante num contexto de devastadoras dificuldades para as famílias. Esta oferta global é importante, ainda que para muitas crianças, em particular nos tempos difíceis que vamos vivendo, permaneça inacessível por razões de natureza económica apesar de alguma oferta mais "acessível".
No entanto, o olhar para o que é fortemente divulgado, uma gama sem fim de possibilidades, não deixa de sugerir alguma reflexão.
Temos as oficinas, os ateliers, os playcenters, os workshops, os espaços lúdicos, etc. destinados à música, do jazz à clássica, à dança ou à literatura, contos e histórias, às actividades expressivas, plásticas ou artísticas, a designação também varia, em toda a sua gama e diversidade. Temos a filosofia para crianças destinada, eventualmente, aos mais reflexivos. Temos as actividades desportivas, várias modalidades, indoor ou de ar livre em diferentes versões e natureza, quintas pedagógicas, contacto com animais e espaços de aventura, campos de férias, praia ou campo, naturalmente, etc.
As referências poderiam continuar dada a criatividade e capacidade de inovação dos proponentes disponibilizando, enfim, uma oferta para todas as bolsas, ou quase.
Sei bem que neste universo existem iniciativas de excelente qualidade, no entanto, creio que devemos adoptar uma atitude de alguma cautela. Instalou-se um pouco a convicção de que é fundamental para o desenvolvimento e bem-estar das crianças a sua participação em inúmeras actividades, todas imprescindíveis à excelência, porque os miúdos devem ser educados para ser excelentes.
Entende-se, muitos pais o afirmam, que a realização de todas, mesmo todas, estas actividades é imprescindível aos miúdos, pois promove níveis fantásticos de desenvolvimento intelectual e da linguagem, desenvolvimento motor, maturidade emocional, criatividade, interacção social, autonomia e certamente de mais alguns aspectos que agora não recordo.
Este entendimento, que por vezes já se verifica em tempo de aulas, cria o que costumo designar por "criança agenda", isto é, a criança que está sempre envolvida em qualquer actividade, a quase todas as horas.
Os pais, alguns pais, seduzidos pela sofisticação desta oferta, pressionados pelos estilos de vida que não conseguem ou podem ajustar e com a culpa que carregam pela falta de tempo para os filhos, aceitam, por vezes para não ser injusto, que os miúdos sejam fechados dentro destes “espaços de liberdade”, comprando, assim, mais um serviço educativo.
Não esqueço, sublinho, que nestas iniciativas algo de interessante e importante pode acontecer para as crianças, também não duvido da seriedade e competência dos responsáveis, mas inquieta-me um pouco a pressão criada sobre os pais que corre o sério risco de transformar as férias dos miúdos em algo de cansativo, cheias de "tempos livres" que de livres muitas vezes têm pouco.
Talvez seja ingenuidade, mas gosto de pensar que para ajudar nas férias dos miúdos de forma menos sofisticada, mais aberta, menos exigente em "quantidade de actividades",  "realização" ou no "desenvolvimento", poderíamos também recorrer a equipamentos que muitas vezes existem nas comunidades e a avós que vivem nos lares, sem netos a quem contar histórias e com quem passear, estimular as relações de vizinhança integrando o acompanhamento das crianças nas "funções do condomínio" e que rotativamente pode ser assegurada, etc.
Era bom que as férias fossem, tanto quanto possível, isso mesmo, férias, tranquilas. Portanto, boas férias. As férias possíveis.

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