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segunda-feira, 25 de janeiro de 2016

O PRESIDENCIAL VETO A DUAS MÃES E DOIS PAIS

Cavaco Silva num dos últimos exercícios da sua passagem por Belém vetou a adopção de crianças por casais homossexuais pois, afirma, “Está por demonstrar” em que medida a adopção plena “promove o bem-estar da criança”. Também legitima a sua decisão através de habilidosas considerações jurídicas
Cavaco Silva pode afirmar o que entende, parece-me legítimo, não pode é transformar os seus valores e opiniões em ciência.
Algumas notas velhas.
Em primeiro lugar e desde logo está provado que uma família que goste e cuide da criança cumpre melhor o papel de cuidador e educador que uma instituição por mais competentes e empenhados que sejam os seus técnicos. Cavaco Silva deveria saber que Portugal é ainda um país com alta taxa de crianças em instituições. Talvez fosse boa ideia pensar no seu bem-estar”.
No que respeita à homoparentalidade e à falta referida por Cavaco Silva do “amplo debate” recordo uma revisão de algumas dezenas de estudos sobre este conjunto de razões realizada pela Associação Americana de Psicologia que motivou uma resolução da Associação, em 2004, que não confirma nenhuma destas preocupações do argumentário contra e que são, basicamente a eventual dificuldade da criança em lidar com a sua orientação sexual, a vulnerabilidade psicológica e o risco de problemas de comportamento e também o risco acrescido de serem alvo de discriminação, por exemplo, em contextos escolares.
Cavaco Silva também e não quer saber que em 2010, a Associação Americana de Psiquiatria afirmava "apoiar as iniciativas que permitam a casais do mesmo sexo adoptar e co-educar crianças".
Também em 2014 a Ordem dos Psicólogos de Portugal referiu em parecer que "os resultados das investigações psicológicas apoiam a possibilidade de co-adopção por parte de casais homossexuais, uma vez que não encontram diferenças relativamente ao impacto da orientação sexual no desenvolvimento da criança e nas competências parentais". Na mesma linha foi divulgada mais recentemente uma outra revisão de estudos sobre esta matéria mostrando que a homoparentalidade não afecta o desenvolvimento das crianças.
Podemos também lembrar a Cavaco Silva que a maioria das pessoas homossexuais terá sido educada em famílias heterossexuais, que existem muitas crianças com sérios problemas emocionais e vulnerabilidade psicológica, a experimentarem condições de mal-estar devastador integrando situações familiares heterossexuais ou, finalmente, que existem múltiplos casos de crianças discriminadas por variadas razões em contexto escolar o que não nos faz retirar, por princípio, as crianças da escola mas, pelo contrário, combater a discriminação, sejam quais forem as circunstâncias.
Do meu ponto de vista e de uma forma propositadamente simples, a questão central é que o que faz com toda a certeza mal às crianças, é serem maltratadas e os maus tratos não decorrem do tipo de famílias, mas da competência humana e educativa, por assim dizer, de quem delas cuida, pais, mães ou educadores.
Quando as crianças são bem tratadas e crescem com adultos que gostam delas, as protegem e as ajudam a crescer, elas encontram caminhos para lidar com dois pais ou com duas mães.
Insisto, o que as crianças terão dificuldade em resolver é ter por perto adultos, heterossexuais ou homossexuais, que não gostam delas, que as maltratam, negligenciam, abandonam, etc. Isso é que faz mal às crianças.
O resto é uma discussão não conclusiva, assente em valores de que não discuto a legitimidade, mas que não podem ser confundidos com ciência ou com um discurso de defesa das crianças de males que estão por provar. Cavaco Silva deveria saber que a decisão do Presidente da República não deve assentar na ignorância e no preconceito.
Quando se trata do bem-estar dos mais novos parece bem mais importante defendê-las dos males comprovados e que todos os dias desfilam aos nossos olhos.
Como disse, este texto não é novo, parte dele já o divulguei como artigo de opinião no Público. Enquanto for necessário e porque não julgo que mereça alteração, voltarei, insistindo.

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