De acordo com o calendário das
consciências, o 5 de Outubro é também o Dia Mundial do Professor. Algumas
notas.
Sem novidade, tenho para mim que
miúdos e professores são os dois grupos em que assenta qualquer comunidade nas sociedades contemporâneas. Os
miúdos porque são o futuro e os professores porque, naturalmente, o preparam,
tudo passa pela escola e pela educação. Hoje em dia e em Portugal, este
entendimento ainda me parece mais justificado porque, devido a ajustamentos na
organização social e familiar e, é minha convicção, devido a políticas sociais
a políticas educativas inadequadas, os miúdos passam tempo excessivo na escola,
diminuindo a influência real das famílias no quotidiano dos miúdos o que
sobrevaloriza o papel da escola através dos professores.
Raramente a profissão professor
tem estado tanto em foco como nos últimos anos bem como a necessidade de
defender a qualidade da escola pública sob ameaça significativa. Têm verificado
múltiplas acções políticas que contribuíram para degradar a sua função, a sua
imagem social e o clima e a qualidade do trabalho desenvolvido nas escolas
Opções políticas assumidas e em
curso têm contribuído para uma atenção continuadamente dirigida para a educação
e para os professores. Essa atenção advém de boas e más razões. Não cabe aqui
um balanço, e entendo que, tal como os miúdos, os professores não têm sempre
razão. No entanto, gostava de deixar algumas notas.
Em primeiro lugar importa desde
logo sublinhar que ser professor no ensino básico e secundário por razões
conhecidas e por vezes esquecidas, é hoje uma tarefa de extrema dificuldade e
exigência que social e politicamente justifica o maior reconhecimento. Pensemos no que é ser professor em algumas
escolas que décadas de incompetência na gestão urbanística e consequente
guetização social produziram.
Pensemos ainda na forma como
milhares de professores cumprem a sua carreira, muitos deles sem a
possibilidade de desenharem projectos de vida para si quando são os principais
responsáveis por lançar projectos de vida para os miúdos com quem trabalham.
Nos últimos anos milhares de professores, de bons professores e professores
necessários, foram constrangidos à reforma e muitos ao desemprego por uma
política de contabilidade inimiga da educação pública e da qualidade. Como
exemplo extremo veja-se o caótico processo em curso de colocação de professores
e as situações dramáticas que a incompetência e a arrogância do MEC produziram.
Pensemos em como os professores
são injustiçados na apreciações de muita gente que no minuto a seguir a dizer
uma ignorante barbaridade qualquer, vai numa espécie de exercício
sadomasoquista entregar os filhos nas mãos daqueles que destrata,
depreendendo-se assim que, ou quer mal aos filhos ou desconhece os professores
e os seus problemas.
Pensemos como é imprescindível
que a educação e os problemas dos professores não sejam objecto de luta
política baixa e desrespeitadora dos interesses dos miúdos, mesmo por parte dos
que se assumem como seus representantes.
Pensemos em como a forma como os
miúdos, pequenos e maiores, vêem e se relacionam com os professores está
directamente ligada à forma como os adultos os vêem e os discursos que fazem.
Pensemos finalmente nos
professores que nos ajudaram a chegar ao que hoje cada um de nós é, aqueles que
carregamos bem guardadinhos na memória, pelas coisas boas, mas também pelas
más, tudo contribuiu para sermos o que somos.
A valorização social e
profissional dos professores, em diferentes dimensões é uma ferramenta
imprescindível a um sistema educativo com mais qualidade. Aliás, uma das
características dos sistemas educativos melhor considerados é, justamente, a
valorização dos professores.
Gostava ainda de deixar uma ideia
do enorme João dos Santos, “O Professor João, foi meu professor porque foi meu
amigo” e uma convicção pessoal que a idade cada vez mais cimenta, qualquer
professor ou educador, tanto ou mais do que aquilo que sabe, ensina aquilo que
é.
A prova é que de todos os
professores que connosco se cruzaram os que mais nos marcaram positivamente foi
sobretudo pelo que eram e menos pelo que nos ensinaram.
Maravilhoso o que acabo de ler! Me traz uma esperança e (re)alimenta meu processo de retomada de minha identidade profissional, identidade esta, colocada a prova após experimentar por diversos sentidos da minha condição humana, a barbárie cometida contra os professores tratados a bomba, spray de pimenta, ataques de cachorros e cavalos numa praça que deveria ser do povo!
ResponderEliminarNo entanto, um tempo depois, após experimentar uma greve longa e sofrida, estive em Lisboa para participar de um congresso e numa manhã após ter ouvido atentamente uma fala que me chamou atenção por questões teóricas, mas sobretudo, pela fala de um Professor que mostrava não somente o que sabia, mas o que era (é) e que se confirmou quando numa conversa rápida, dessas que estabelecemos nos corredores por ocasião desse encontros, me disse: "que ensinamos aquilo que somos, muito mais do que aquilo que sabemos" (desculpe professor mas falo do modo como senti, percebi). Esse dia, ficou marcado em minha memória e embora por vezes em minha volta ao Brasil quisesse reproduzir aos meus colegas e amigos de trabalho e de vida aquilo que havia me tocado, não consegui reproduzir em palavras; mas hoje, lendo essa homenagem crítica e amorosa ao Dia do Professor que aqui no Brasil comemoramos no dia 15 de outubro, a conversa rápida apresentou-se de maneira nítida, trazendo à tona o encontro, a fala, o sentido atribuído que nunca é um só, a lembrança dos professores que cruzaram minha vida e hoje, no exercício de minha docência, a grata satisfação de ser lembrada por alguns de meus alunos, não somente pelo que foi partilhado do pouco que sei, mas sobretudo, pelo que expressam do que sou.
Fica aqui meu agradecimento por esse momento raro de resgate de memórias afetivas. Gratidão!
Olá Simone. Como é evidente não tem que agradecer o que quer que seja.
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