AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

sexta-feira, 10 de abril de 2015

PODERÍAMOS VIVER SEM A ATENÇÃOZINHA, O JEITINHO, MAS NÃO ERA A MESMA COISA

Na imprensa de hoje surgem umas referências a uns "jeitinhos" que o "Dr." Miguel Relvas pediu ao Presidente do Instituto dos Registos e Notariado e que foram, obviamente,  rapidamente realizados. Nada de estranho, o trabalho dos "Facilitadores" é este mesmo facilitar. Aliás, creio mesmo que este comportamento quase faz parte da nossa cultura cívica. "Dar um jeitinho", "fazer uma atençãozinha" são coisas do dia a dia. Mesmo os que de nós, também me incluo, vociferamos contra isto já nos deixámos uma vez ou outra envolver no "jeitinho" ou na "atençãozinha".
Depois é uma questão de escala, pode ir de meia dúzia de robalos a milhões colocados em zonas francas. Diversas vezes aqui tenho me referido a essa espécie de traço da nossa cultura cívica "a atençãozinha" ou a sua variante "dar um jeito". Trata-se de um fenómeno, um comportamento, profundamente enraizado e com o qual parecemos ter uma relação ambivalente, uma retórica de condenação, uma pontinha de inveja dos dividendos que se conseguem e a tentação quotidiana de receber ou providenciar uma "atençãozinha" ou pedir ou dar um jeito, sempre "desinteressadamente", é claro.
A teia de interesses que ao longo de décadas se construiu envolvendo o poder político, a administração pública, central e autárquica, o poder económico, o poder cultural, a área da justiça e segurança, parte substantiva da comunicação social e toda a relação do dia a dia com a "atençãozinha" à recepcionista que nos passa para a frente na lista de espera ou ao funcionário de quem esperamos que possa dar um "jeito", dificulta seriamente qualquer alteração substantiva neste modo de funcionar.
Combatê-lo passará, naturalmente, por meios e legislação adequada, mas passa sobretudo pela formação cívica que promova uma outra cidadania. Estarão lembrados que há algum tempo atrás foram divulgados estudos evidenciando a nossa atitude tolerante para com a corrupção.
Certamente que poderíamos viver sem a "atençãozinha" ou o "jeitinho", mas não era a mesma coisa.

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