AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quinta-feira, 23 de abril de 2015

AINDA AS METAS CURRICULARES

Como várias vezes tenho afirmado, as metas curriculares, tal como estão definidas, parecem ser parte do problema e não parte da solução.
As metas curriculares podem e devem funcionar como uma ferramenta orientadora e útil para o trabalho de alunos e professores. Para que isso aconteça deverão ser de simples utilização e operacionalização e decorrentes de modelos curriculares diferentes dos actuais, demasiado extensos, prescritivos e espartilhados.
Como exemplo vejamos apenas o 1º ciclo em Matemática e Português.
Em Matemática são definidos 3 domínios que se desdobram como segue. No 1º ano, em 8 sub-domínios, 13 objectivos e 62 descritores, no 2º ano em 11 sub-domínios, 22 objectivos e 82 descritores, no 3º ano em 11 sub-domínios, 22 objectivos e 98 descritores e no 4º ano em 6 sub-domínios, 15 objectivos e 81 descritores o que em síntese corresponde a 72 objectivos e 323 descritores para Matemática do 1º ciclo.
Se juntarmos Português teremos um total de 177 objectivos e 703 descritores. Por anos, temos: no 1º ano, 33 objectivos e 143 descritores; no 2º, 47 objectivos e 168 descritores; no 3º, 51 objectivos e 202 descritores e no 4º, 46 objectivos e 190 descritores. É obra, uff.
Este entendimento pode levar a que o ensino se transforme na gestão de uma espécie de "check list" das metas estabelecidas implicando a impossibilidade de acomodar as diferenças, óbvias, entre os alunos, os seus ritmos de aprendizagem. Múltiplas notícias e referências mostram como o trabalho dos professores e alunos está fortemente condicionado pela obsessão crática com a avaliação externa, os exames, o determinante de todo o trabalho.
Aliás, neste contexto é preocupante a afirmação dos autores das metas curriculares, de que estas estabelecem o que os alunos deverão imprescindivelmente revelar, “exigindo da parte do professor o ensino formal de cada um dos desempenhos referidos nos descritores”.
Este cenário, aplicado em todas as áreas ou disciplinas, em turmas  de 26 alunos no 1º ciclo e de 30 a partir do 5º ano, constituídas por alunos com ritmos diferentes e assimetrias nos seus percursos e competências, deixa-me uma imensidade de dúvidas sobre a aplicação das metas curriculares, tal como estão definidas.
Apesar do MEC acenar com a referência aos modelos anglo-saxónicos como selo de qualidade, sempre a referência à qualidade e exigência, o que, aliás, está longe de acontecer, devo confessar que continuo apreensivo e temo, insisto, que as metas curriculares, nos termos em que são definidas possam constituir-se como parte do problema e não parte da solução.
Em síntese e como afirma a Associação de Professores de Português a propósito do Programa de Português para o ensino Básico que esteve em discussão pública até há dias e que entre o 1º e o 9º ano define perto de 1 000 metas curriculares, temos um modelo curricular de natureza “fortemente prescritivo, que vai empobrecer a educação e promover a retenção escolar dos alunos” na mesma linha, aliás, do entendimento do Conselho Nacional de educação. Reservas da mesma natureza têm sido expressas por outras Associações Profissionais de Professores de diferentes disciplinas.
Parece-me ainda importante recordar que alguns trabalhos de investigação que têm vindo a ser desenvolvidos, cito o da Professora Dulce Gonçalves da Universidade de Lisboa, evidenciam a desadequação e os problemas criados pelas metas curriculares.
Não será difícil antecipar que este novo Programa de Português para o ensino básico assente nas metas curriculares, tal como estão definidas, corre o sério risco de vir a ser parte do problema, o sucesso dos alunos, e não parte da solução.
É evidente que esta opção é coerente com a visão de educação, educação e ensino públicos que a equipa do MEC assume. 

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