AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

segunda-feira, 9 de março de 2015

VIOLÊNCIA DOMÉSTICA. "As vítimas não colaboram"

"Falta de colaboração das vítimas dificulta investigação de crimes por violência doméstica"

A minha experiência neste espaço de escrita diz-me que a tarefa de escolher um título para o que escrevemos nem sempre é uma tarefa fácil.
Serve esta introdução para referir a notícia do Público sobro o dramático universo da violência doméstica que continua indomesticável e a fazer aumentar o número de vítimas incluindo os homicídios. O Público afirma  em título, "Falta de colaboração das vítimas dificulta investigação de crimes por violência doméstica". Assenta esta afirmação na constatação reconhecida de que muitas vítimas recuam nas queixas e pedem a suspensão do processo.
Assim afirmado parece depreender-se que as vítimas assumem uma atitude de não colaboração na investigação ao sofrimento porque passam quando, na verdade, a peça refere-o, a violência doméstica, tal como o bullying, por exemplo, alimenta-se do medo e da insegurança das vítimas, não da sua "falta de colaboração". 
O mundo da violência doméstica é bem mais denso e grave do que a realidade que conhecemos, ou seja, aquilo que se conhece, apesar de, recorrentemente, temos notícias de casos extremos, é "apenas" a parte que fica visível de um mundo escuro que esconde muitas mais situações.
Por outro lado, para além da gravidade e frequência com que continuam a acontecer episódios gravíssimos de violência doméstica é ainda inquietante o facto de que alguns realizados em Portugal evidenciam um elevado índice de violência presente nas relações amorosas entre gente mais nova mesmo quando mais qualificada. Muitos dos intervenientes remetem para um perturbador entendimento de normalidade o recurso a comportamentos que claramente configuram agressividade e abuso ou mesmo violência.
Importa ainda combater de forma mais eficaz o sentimento de impunidade instalado, as condenações são bastante menos que os casos reportados e comprovados, bem como alguma “resignação” ou “tolerância” das vítimas face à situação de dependência que sentem relativamente ao parceiro, à percepção de eventual vazio de alternativas à separação ou a uma falsa ideia de protecção dos filhos que as mantém num espaço de tortura e sofrimento. Não é por falta de colaboração, insisto, é medo, insegurança e isolamento.
Assim sendo, torna-se muito importante que a comunidade assume uma atitude mais proactiva e atenta aos casos conhecidos, muitas vezes sabemos que existem na porta ao lado e ignoramos, que combata a sensação de impunidade do agressor com uma justiça eficaz e célere e que promova estruturas de acolhimento, apoio e protecção e apoio, bem como intervenções de natureza educativa junto de adolescentes e jovens que previnam a emergência futura destes episódios.
Não é tanto a "falta de colaboração das vítimas" que inibe o combate à violência doméstica, é mais a falta de "colaboração", ou seja, empenhamento, atenção e intervenção, da comunidade através de diferentes actores e áreas de competência.

Sem comentários:

Enviar um comentário