AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

sábado, 3 de janeiro de 2015

PARADINHOS, GORDINHOS E COM PIORES NOTAS

É uma questão recorrente, os professores de Educação Física mostram-se verdadeiramente preocupados com o (des)trato que a disciplina tem vindo a sofrer por parte do MEC.
Na verdade se um dos grandes problemas que afecta a qualidade de vida de adolescentes e jovens é, justamente, o sedentarismo, como compreender o desinvestimento na disciplina de Educação Física que tem vindo a acontecer.
Um desinvestimento que segundo o presidente da Sociedade Portuguesa de Educação Física (SPEF), “começou claramente na actual legislatura”. O “primeiro sinal”, foi a redução em 2012 da carga horária no 3º ciclo e no ensino secundário.
O “segundo sinal” foi o facto de, de acordo com o mesma legislação, a EF deixar de contar para a nota final do aluno e para a média de acesso ao ensino superior. Este argumento assentava na "perversidade " de que uma má nota a EF poderia baixar a média de um aluno excelente a todas as outras disciplinas e pôr em causa o seu acesso à universidade. Além de que o argumento carece de fundamentação estatisticamente significativa, parece também evidente que tal situação se pode facilmente minimizar com as mais do que necessárias alterações no processo de acesso ao superior.
No entanto, o MEC, como sempre, opta pelo mais fácil, desvaloriza a disciplina de EF.
Algumas notas que julgo merecer reflexão.
Dados recentemente divulgados pela OMS mostram como é preocupante o problema do excesso de peso na população mais nova. Na Europa, mais de 27% das crianças com 13 anos e 33% com 11 têm excesso de peso. Portugal é um dos países com indicadores mais inquietantes, 32% das crianças com 11 anos têm peso a mais.
Nada de novo, recordo um estudo, “EPACI Portugal 2012 – Estudo do Padrão Alimentar e de Crescimento na Infância”, segundo o qual, 31.4% das crianças portuguesas entre os 12 e os 36 meses apresentam excesso de peso e 6.5% situações de obesidade. Os dados são preocupantes mas não surpreendem indo no mesmo sentido de dados envolvendo outras idades.
Um trabalho da Universidade de Coimbra divulgado em 2013 sublinhava, mais uma vez, o impacto que o sedentarismo tem na saúde das crianças. Este estudo envolveu 17424 crianças entre os 3 e os 11 anos e mostrou a forte relação entre hábitos fortemente sedentários, ver televisão por exemplo, e obesidade infantil e óbvias consequências na saúde e bem-estar dos miúdos.
Um outro trabalho de 2012 da Faculdade de Motricidade Humana envolvendo cerca de 3000 alunos que evidenciava o efeito positivo da actividade física no rendimento escolar para além dos benefício óbvios na saúde.
Também em 2012, um trabalho divulgado na Lancet referia que em Portugal, entre os adolescentes, dos 13 aos 15, quatro em cada cinco não são fisicamente activos.
A Direcção-Geral de Saúde tem vindo a recomendar às escolas que alimentos hipercalóricos, como doces ou bolos, não sejam expostos, devendo ficar visíveis aos olhos dos alunos os alimentos considerados mais saudáveis em como estão em curso medidas no sentido de baixar a publicidade a alimentos e bebidas com maior carga calórica.
Apesar de parecer uma birra ou teimosia acho sempre importante sublinhar a importância que deve merecer a questão dos hábitos alimentares, sobretudo nos mais novos.
Recordo ainda um estudo divulgado há meses da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto, encontrou 17% de rapazes e 26% de raparigas de quatro anos, sublinho, quatro anos, com excesso de peso e obesidade e níveis de colestrol elevados, um cenário verdadeiramente preocupante e de graves consequências futuras.
Dados apresentados no XIV Congresso Português de Obesidade, referiam que 22.6 % das crianças dos 10 aos 18 anos estão em situação de pré-obesidade e 7.8 % já são obesos.
Creio ainda de sublinhar que estudos realizados em Portugal mostram que a obesidade infantil é já um problema de saúde pública, implicando, por exemplo, o disparar de casos de diabete tipo II em crianças.
Na verdade, a obesidade infantil afecta um número muito significativo e crescente de crianças e adolescentes e assenta fundamentalmente nos estilos de vida dos mais novos de que releva o sedentarismo excessivo e a péssima qualidade genérica ao nível dos hábitos alimentares. É de registar que as escolas têm vindo a fazer um esforço no sentido de aumentar a qualidade alimentar da oferta, o que não parece ser acompanhado pelas famílias, ilustrado pela desproporcionalidade do consumo de água e de refrigerantes no contexto familiar. Ainda não há muito, estava na sala de espera no Centro de Saúde da minha zona e uma mãe andava de um lado para o outro com uma bebé que ainda mal andava e que, evidentemente, aparentava peso a mais. Para conseguir que a miúda se calasse ia-lhe dando bolachas que eram despachadas em pouco tempo. Tal situação mostra como é preciso insistir.
Sabe-se também que em adultos e sem surpresa os números pioram, 50% dos homens e 30% das mulheres estarão em situação de pré-obesidade ou obesidade.
As consequências potenciais deste quadro em termos de saúde e qualidade de vida são muito significativas, quer em termos individuais, quer em termos sociais. Assim, e como já tenho referido, um problema de saúde pública desta dimensão e impacto justifica a definição de programas de prevenção, educação e remediação que o combatam. Provavelmente, teremos algumas reacções contra o chamado “fundamentalismo nos hábitos individuais” mas creio que são também de ponderar as implicações colectivas e sociais do problema. No entanto, como sabemos, o excesso de peso e os riscos associados não serão, para a esmagadora maioria das miúdos e graúdos nessa situação, uma escolha individual, é algo de que não gostam e sofrem, de diferentes formas, com isso.
Ser o MEC a desvalorizar a prática da Educação Física é que parece francamente um mau sinal. Confesso que não estranho, o MEC também tem conseguido algo de absolutamente inesperado, desvalorizar a EDUCAÇÂO, substituindo-a pela ideia exlusiva de aprendizagem daquilo a que Crato chama de "saberes essenciais".

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