AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

OS RESULTADOS ESCOLARES DE RAPAZES E RAPARIGAS

"Rapazes começam muito cedo a ficar para trás nas escolas portuguesas"

Uma notas telegráficas sobre o relatório do Júri Nacional de Exames sobre os exames de 2014 agora divulgado.
Uma primeira referência relativa ao facto do JNE sublinhar o facto de que se verifica maior abandono escolar e insucesso por parte dos rapazes que das raparigas. Nos exames de 9º ano as raparigas estão a maioria, enquanto nos exames de 4º e 6º predominam os rapazes. A demografia não explica esta alteração uma vez que têm nascido mais rapazes.
Para o JNE, este quadro pode ser “ eventualmente explicado por um maior abandono escolar precoce do ensino básico geral por parte dos alunos do género masculino, nomeadamente por terem acedido a outras vias formativas de carácter mais profissionalizante”. Deve, no entanto dizer-se que estes percursos têm uma oferta ainda muito pouco significativa que dificilmente explicam a alteração.
Esta situação é recorrente, aliás, vai-se prolongando para o ensino secundário e superior. e não me parece suficiente a "explicação" pelo maior abandono escolar precoce por parte dos rapazes. A questão central é porque se verifica este maior abandono.
Do meu ponto de vista e conforme os estudos e a experiencia sugerem os estilos educativos parentais no que respeita ao género, os modelos culturais e valores, as expectativas criadas sobre a escola, sobre os comportamentos, etc., são variáveis a ter em conta. Este cenário também ajuda a perceber a razão dos episódios de indisciplina escolar serem mais frequentes envolvendo rapazes.
Por outro lado, a introdução precoce, demasiado precoce, de vias "mais profissionalizantes" não me parece a melhor hipótese como tem sido sublinhado em sucessivos relatórios internacionais e estudos. Os alunos mais novos, estou a pensar sobretudo até ao 9º ano, que experimentam dificuldades escolares, precisam de apoio escolar e não de vias profissionais.
Esta é que me parece a questão central. No entanto, as mudanças nas escolas e a excessiva concentração e centralização, a insuficiência dos dispositivos de apoio ao trabalho de alunos e professores tornam extraordinariamente difícil o combate ao insucesso e abandono precoces, no ensino básico.
As questões de género fazem parte de um outro universo a trabalhar com as famílias e em espaços lectivos que não existem pois não fazem parte, evidentemente, das "matérias essenciais" definidas por Nuno Crato, pelo que assim iremos certamente continuar. Os rapazes, genericamente, portam-se pior e estudam menos e as raparigas portam-se melhor e estudam mais.
Uma segunda nota para a referência do JNE aos inconvenientes decorrentes da existência de uma 1ª fase de exames no 1º e 2º ciclo em pleno terceiro período de aulas. Mais uma "cratice" sem sentido que os resultados dos alunos na 2ª fase dos exames nem sequer justificam. A questão, mais uma vez, é mais apoios, menos alunos, melhores programas, não é mais exames, ainda por cima dentro do terceiro período que por regra já é curto.
Uma última referência à "surpresa" da diferença significativa  das médias obtidas nos exames de 12º de Português e Matemática A pelos alunos dos "cursos profissionais",  mais baixas que as médias obtidas pelos seus colegas dos cursos científico-humanísticos. Do meu ponto de vista, a surpresa seria esta situação  não se verificar.
A imprescindível "via profissionalizante", pela forma com está organizada e pelas características dos alunos que são "aconselhados" ou se sentem "empurrados" para ela, apesar dos que conscientemente optam por uma formação mais curta, leva a que não se estranhe a diferença na média de resultados obtidos.
Também aqui importa a promoção dos cursos profissionais como uma opção tão de "primeira" como os cursos científico-humanísticos e não uma espécie de "alunão" para onde se enviam os alunos de menor "qualidade".

4 comentários:

  1. Permita-me duas notas apenas:

    1 - Esta realidade que distingue o sucesso por género, sendo as raparigas mais bem sucedidas pelo menos até ao 9º ano, não será afectada pela maturidade que chega mais tardiamente aos rapazes, não?! Noto isso na minha centena de alunos de 9º ano deste ano lectivo: salvo raras excepções, em termos genéricos em cada turma, eles são muito mais infantis e menos responsáveis do que elas, o que se verifica até nos comentários e nas analogias que fazem a propósito das temáticas abordadas nas aulas (disciplina de Português).
    Costumo pôr em prática uma actividade de avaliação do oral com base em leitura recreativa, livre e autónoma, com apresentação individual da leitura à turma, e as opções dos rapazes são claramente mais ligeiras do que as das raparigas (não em volume, claro, mas em conteúdo/mensagem).

    2 - A forma como é feita a gestão dos apoios educativos nas escolas públicas transforma-os num tempo quase inútil e até contraproducente.
    As instruções são para que todos os alunos com insucesso em cada disciplina beneficiem pelo menos de um tempo semanal de 45 minutos de apoio, preferencialmente com o respectivo professor, o que muitas vezes é impossível, pois os professores têm várias turmas e o seu horário, embora constantemente acrescentado e desrespeitado, tem limite de horas, podendo o grupo de apoio ter um número ilimitado de alunos de uma turma. Resultado: os grupos de apoio chegam a ter 12-14 alunos a algumas disciplinas, como Matemática, por exemplo, todos eles com enormes dificuldades, sendo leccionados quase sempre ao final de um dia cheio de aulas, quando os colegas vão para casa. Para além do cansaço que os alunos acumularam ao longo do dia, muitos deles estando 9 ou 10 horas fora de casa, estes apoios têm sabor a castigo, o que, obviamente, não motiva o empenho e a aprendizagem.
    Eu própria lecciono dois tempos de apoio semanal de Português a alunos de duas turmas, das 16h e picos quase às 18h de um dia da semana, e não faço nada de mais angustiante e frustrante em toda a minha semana de trabalho!
    Como é que eu consigo pôr 6 ou 7 alunos de 14/15 anos a interpretar ou a escrever um texto com pés e cabeça, por exemplo, àquela hora do dia, quando a maioria chegou ao 9º ano sempre com negativa a Português e não tem em casa quem tão pouco valorize grandemente a escola?
    Quando passa essa tarde da semana, sinto um alívio, infelizmente.

    ResponderEliminar
  2. Permita-me duas notas apenas:

    1 - Esta realidade que distingue o sucesso por género, sendo as raparigas mais bem sucedidas pelo menos até ao 9º ano, não será afectada pela maturidade que chega mais tardiamente aos rapazes, não?! Noto isso na minha centena de alunos de 9º ano deste ano lectivo: salvo raras excepções, em termos genéricos em cada turma, eles são muito mais infantis e menos responsáveis do que elas, o que se verifica até nos comentários e nas analogias que fazem a propósito das temáticas abordadas nas aulas (disciplina de Português).
    Costumo pôr em prática uma actividade de avaliação do oral com base em leitura recreativa, livre e autónoma, com apresentação individual da leitura à turma, e as opções dos rapazes são claramente mais ligeiras do que as das raparigas (não em volume, claro, mas em conteúdo/mensagem).

    2 - A forma como é feita a gestão dos apoios educativos nas escolas públicas transforma-os num tempo quase inútil e até contraproducente.
    As instruções são para que todos os alunos com insucesso em cada disciplina beneficiem pelo menos de um tempo semanal de 45 minutos de apoio, preferencialmente com o respectivo professor, o que muitas vezes é impossível, pois os professores têm várias turmas e o seu horário, embora constantemente acrescentado e desrespeitado, tem limite de horas, podendo o grupo de apoio ter um número ilimitado de alunos de uma turma. Resultado: os grupos de apoio chegam a ter 12-14 alunos a algumas disciplinas, como Matemática, por exemplo, todos eles com enormes dificuldades, sendo leccionados quase sempre ao final de um dia cheio de aulas, quando os colegas vão para casa. Para além do cansaço que os alunos acumularam ao longo do dia, muitos deles estando 9 ou 10 horas fora de casa, estes apoios têm sabor a castigo, o que, obviamente, não motiva o empenho e a aprendizagem.
    Eu própria lecciono dois tempos de apoio semanal de Português a alunos de duas turmas, das 16h e picos quase às 18h de um dia da semana, e não faço nada de mais angustiante e frustrante em toda a minha semana de trabalho!
    Como é que eu consigo pôr 6 ou 7 alunos de 14/15 anos a interpretar ou a escrever um texto com pés e cabeça, por exemplo, àquela hora do dia, quando a maioria chegou ao 9º ano sempre com negativa a Português e não tem em casa quem tão pouco valorize grandemente a escola?
    Quando passa essa tarde da semana, sinto um alívio, infelizmente.

    ResponderEliminar
  3. Este comentário foi removido pelo autor.

    ResponderEliminar
  4. Olá Ana, relativamente à sua nota 2, "apenas" espelha o que dramaticamente acontece em muitas escolas.
    Quanto à sua nota 1, as diferenças entre rapazes em raparigas, matéria que por vezes contém aguns equívocos, creio que o trabalho educativo é justamente tentar, não é fácil no cenário que temos, responder diferenciadamente aos alunos (as diferenças podem ser de natureza múltipla) de forma promover equidade a a possibilidade de sucesso educativo, estamos a falar de abandono e insucesso, não estamos a falar de "excelência"

    ResponderEliminar