AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quinta-feira, 3 de julho de 2014

OS CUSTOS DA DEFICIÊNCIA

"Empresas usam indevidamente apoios à contratação de pessoas com deficiência"

De novo e sempre.
Um Relatório, "Monitorização dos Direitos Humanos das Pessoas com Deficiência em Portugal", divulgado no âmbito da terceira conferência anual da Associação Europeia de Estudos da Deficiência, indicia que existem empresas que usam indevidamente os apoios estatais para a contratação de pessoas com deficiência  obrigando estes trabalhadores a estágios sucessivos e a uma situação de precariedade. Este expediente é, aliás usado com outros grupos, jovens, por exemplo.
Nada de novo. Num mercado fortemente desregulado e em "flexibilização" acelerada, os direitos das pessoas ou a lei são irrelevâncias formais. Há pouco dias noticiava-se como algumas mulheres são obrigadas a assinar um compromisso anti-maternidade por alguns empregadores.
Em contextos desta natureza e dada os níveis fortíssimos de desemprego os grupos mais vulneráveis são duplamente penalizados, pela sua condição e situação de vida e por mercados e empregadores sem alma, desregulados que apenas conhecem "activos" descartáveis e a explorar e não pessoas.
No caso particular das pessoas com deficiência é de recordar que O “Estudo de avaliação do impacto dos planos de austeridade dos Governos europeus sobre os direitos das pessoas com deficiência”, coordenado pelo Consórcio Europeu de Fundações para os Direitos Humanos e a Deficiência  conhecido no final de 2013, traçou um retrato devastador do impacto que as políticas de austeridade e a crise económica têm tido nas condições de vida das pessoas com deficiência e, naturalmente, das suas famílias. Este impacto, muito diferenciado de acordo com as idades e problemáticas envolvidas, compromete seriamente os direitos básicos em matéria de educação, saúde, trabalho e apoios sociais. Em todas as áreas os cortes orçamentais têm efeitos pesadíssimos, sendo que as pessoas com deficiência em Portugal têm uma taxa de risco de pobreza 25% superior à das pessoas sem qualquer deficiência.
Como sempre não posso deixar de retomar algumas notas sobre esta matéria que não são informadas por qualquer discurso de natureza paternalista ou assistencialista, mas colocadas num plano de direitos humanos, de discriminação positiva de pessoas em situação particularmente vulnerável e na não aceitação do princípio de que equidade significa igualdade.
Talvez os burocratas que nos governam ou mandam em quem governa não saibam, por exemplo, que o desemprego no grupo social das pessoas com deficiência terá aumentado cerca de 70 % face a 2011, e estima-se que actualmente ronde os 75 %, uma taxa catastrófica.
Sabemos que os recursos são finitos e os tempos de contenção, mas pode-se afirmar que para as pessoas com deficiência os tempos sempre foram de recursos finitos e de contenção, ou seja, as dificuldades são recorrentes e persistentes.
Um estudo realizado, creio que em 2010, pelo Centro de Estudos Sociais da Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra, apontava para que uma pessoa com deficiência tenha um gasto anual entre 6 000 e 27 000 € decorrentes especificamente da sua condição e considerando diferentes quadros de deficiência. Este cálculo ficou incompleto porque os investigadores não conseguiram elementos sobre os gastos no âmbito do Ministério da Saúde.
O estudo, para além das dificuldades mais objectiváveis, referenciou ainda os enormes custos sociais, não quantificáveis facilmente, envolvidos na vida destes cidadãos e que têm impacto no contexto familiar, profissional, relacional, lazer, etc.
Creio também que é justamente no tempo em que as dificuldades mais ameaçam a generalidades das pessoas que se avoluma a vulnerabilidade das minorias e, portanto, se acentua a necessidade de apoio e de políticas sociais mais sólidas, mais eficazes e, naturalmente, mais reguladas.
Os números sobre o desemprego nas pessoas com deficiência são dramaticamente elucidativos desta maior vulnerabilidade. A vida de muitas pessoas com deficiência é uma constante e infindável prova de obstáculos, muitas vezes intransponíveis, em variadíssimas áreas como mobilidade e acessibilidade, educação, emprego, saúde e apoio social, em que a vulnerabilidade e o risco de exclusão são enormes. Assim sendo, exige-se a quem decide uma ponderação criteriosa de prioridades que proteja os cidadãos dos riscos de exclusão, em particular os que se encontram em situações mais vulneráveis.
As pessoas com deficiência e as suas famílias fazem parte deste grupo.

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