AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

OS VENTOS MALINOS DO INVERNO CRÁTICO SOBRE A INVESTIGAÇÃO

O texto de leitura obrigatória do Professor Moisés de Lemos Martins, Director do Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade da Universidade do Minho, com o título acima, leva-me a retomar algumas notas complementares sobre a forma como está a ser destratada a investigação e ciência, sobretudo no universo particular das ciências sociais. Este texto complementa de forma notável a excelente entrevista do Reitor da Universidade  de Lisboa.
Em primeiro lugar recordo uma também recente entrevista, também no Público, de Devon Jensen, professor universitário com trabalho desenvolvido sobre o papel das universidades, a sua relação com os governos e o mundo económico e empresarial, que apresentou em Lisboa uma conferência com a estimulante interrogação como título, "Is Higher Education Merely a Servant of the Economy?"
Da extensa entrevista uma primeira referência à importância crucial atribuída ao investimento em formação de nível superior ainda que em diferentes formatos e extensão. Esta afirmação contraria a lógica actualmente seguida em Portugal de desinvestimento no ensino superior e investigação por mais que Nuno Crato e Miguel Seabra se esforcem por demonstrar o contrário..
Parece-me também de sublinhar o relevo concedido ao investimento na formação e desenvolvimento na formação e investigação nos domínios das ciências sociais. Mais uma vez, este investimento e importância são afirmados ao arrepio da forma insustentável como em Portugal as Ciências Sociais são consideradas pelo MEC, como várias posições e discursos ultimamente produzidos e divulgados demonstram e aos quais aqui tenho feito referência. Recordo a discriminação em matéria de financiamento e os discursos que se vão ouvindo sobre o que deve ser a investigação de “qualidade” como as disparatadas, ignorantes e arrogantes afirmações de Pires de Lima. O texto de Moisés de Lemos Martins é extraordinariamente elucidativo deste tratamento discriminado das ciências sociais.
No mesmo sentido, parece interessante que, contrariando um discurso que se instala no sentido de definir a oferta formativa de ensino superior com um critério quase exclusivamente centrado na “empregabilidade”, Devon Jensen chama a atenção para a volatilidade e mudança dos mercados de trabalho, bem como para o papel de liderança que as instituições devem assumir na definição da sua oferta, ou seja e como já tenho referido, o ensino superior não deve ignorar o mercado de trabalho mas não pode andar “a reboque” desse mercado que, aliás, muda a uma velocidade enorme. Mais uma vez é de sublinhar a importância que neste contexto assumem as ciências sociais.
Uma última referência para o que Devon Jensen chama de “novo paradigma” no financiamento das universidades a que eu acrescentaria, da investigação.
Em termos simples, Devon Jensen afirma que sendo as empresas beneficiárias da qualificação dos seus trabalhadores devem, por isso, financiar as universidades para a formação. A experiência vai-me causando alguma reserva face aos “novos paradigmas” tantas vezes referidos a propósito das mais variadas matérias que, nas mais das vezes, de novo têm pouco e paradigma … nunca serão. Miguel Seabra e Nuno Crato também defendem uma nova visão para a investigação e ciência e o resultado parece muito preocupante.
Na verdade esta perspectiva levanta-me algumas questões. Em primeiro lugar, creio que se considerarmos que as empresas beneficiam da qualificação superior dos seus colaboradores então devem pagar-lhes em função dessas competências e dos benefícios que obtêm. Com salários mais elevados os mais qualificados pagarão, obviamente, um maior volume de impostos o que contribui mais para o financiamento do estado e, também, do ensino superior público. A situação por cá é assustadora pois verifica-se que empresas e também o estado pagam a pessoas qualificadas salários miseráveis e indignos, não sendo um salário mas antes um subsídio de sobrevivência. Como esperar que este mercado que assim funciona venha a envolver-se num “novo paradigma” financiando o ensino superior e da investigação?
Finalmente, com as empresas a financiar o ensino superior e a investigação, acentuar-se-ia a desvalorização do universo das ciências sociais e das humanidades. O que se passa com o financiamento à investigação nesta área mostram isso mesmo tal como é bem demonstrado no texto que justifica estas notas.
Sopram ventos adversos, malinos como lhes chamamos no Meu Alentejo, malignos como lhes chama Moisés de Lemos Martins.

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