AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

domingo, 19 de janeiro de 2014

LEITORES, LIVROS, BIBLIOTECAS, "TABLETS"

A propósito da entrevista de Teresa Calçada, até há pouco responsável pela Rede de Bibliotecas Escolares, algumas notas depois de sublinhar o trabalho por si realizado ao longo destes anos.
Na entrevista é muito focado o papel dos recursos, livros e bibliotecas, e da sua acessibildade bem como do impacto das novas tecnologias e os riscos decorrentes das dificuldades económicas para este tipo de projectos.
Como várias vezes tenho afirmado e julgo consensual, a questão central não é de livros, bibliotecas (escolares ou de outra natureza) ou o papel dos "tablets", a questão central é o LEITOR, ou seja, o essencial é criar leitores que, quando o forem, procurarão o que ler, livros por exemplo, espaços ou recursos, biblioteca, casa ou escola e suportes diferente, papel ou electrónico.
Creio que também estaremos de acordo que um leitor se constrói desde o início do processo educativo. Desde logo assume especial importância o ambiente de literacia familiar e o envolvimento das famílias neste tipo de situações, através de actividades que desde a educação pré-escolar e 1º ciclo deveriam, muitas vezes são, estimuladas e para as quais poderiam ser disponibilizadas aos pais algumas orientações.
Nos primeiros anos de escolaridade é fundamental uma relação estreita com a leitura, não só com os aspectos técnicos, por assim dizer, da aprendizagem da leitura e da escrita da língua portuguesa, mas um contacto estreito e regular com a actividade de leitura, seja do que for, considerando motivações e culturas diferenciadas apresentadas pelos alunos. 
Só se aprende a ler lendo, só se aprende a escrever, escrevendo, etc.
Neste contexto, não posso deixar de ficar um pouco preocupado com o rumo da educação escolar, neste caso centrando-me no 1º e 2º ciclos, com a introdução das metas de aprendizagem com os conteúdos e volume que apresentam.
Como muitas vezes tenho afirmado e alguns estudos vão demonstrando, as metas curriculares, tal como estão definidas na formulação e quantidade, pois não tem que ser assim, transformam o trabalho do professor com turmas lotadas na gestão de uma checklist de realizações. Como exemplo, para Português no 1º ciclo temos um total de 177 objectivos e 703 descritores. Por anos, temos no 1º ano 33 objectivos e 143 descritores, no 2º ano, 47 objectivos e 168 descritores, no 3º ano, 51 objectivos e 202 descritores e no 4º ano, 46 objectivos e 190 descritores. Se juntarmos Matemática teremos mais 72 objectivos e 323 descritores. É obra!
Parece relativamente claro que com este caderno de encargos obrigatório, sublinhe-se, o tempo para ler, apenas ler, dificilmente se conseguirá.
A relação das crianças com os materiais de leitura e escrita assentará nos manuais e na aquisição pressionada dos ""descritores" e pouco mais. Restará o tempo das AECs onde, apesar de algumas experiências interessantes, também nem sempre têm os conteúdos mais adequados e o tempo de casa que em muitas famílias, cada vez mais famílias, é curto.
Neste contexto, embora desejasse muito estar enganado, acho difícil construir miúdos ou adolescentes leitores que procurem livros em casa, em bibliotecas escolares ou outras e que usem o "tablet" para ler e não para uma outra qualquer actividade do mundo que tornam acessível.
Oxalá me engane mesmo.

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