AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

segunda-feira, 14 de janeiro de 2013

A INDOMESTICÁVEL VIOLÊNCIA DOMÉSTICA

A violência doméstica é uma das matérias que solicita permanente reflexão pelo que mais uma vez aqui trago umas notas.
No âmbito do período experimental de um novo modelo de avaliação de risco desenvolvido por uma equipa da Direcção-geral da Administração Interna, entre 15 de Novembro e 31 de Dezembro registaram-se nos distritos de Lisboa e Porto mais de 800 denúncias à PSP e à GNR de casos de violência doméstica.
Tal volume de ocorrências e ainda o facto conhecido de que nem todos os episódios são denunciados obriga, de facto, a medidas proactivas de combate a este tipo de situações.
Relembro que no âmbito do Dia Internacional para a Eliminação de Todas as Formas de Violência Contra as Mulheres em Novembro, se sublinhava os efeitos que os episódios de violência doméstica podem ter nos filhos, pois cerca de 41.5% das situações reportadas ocorrem na presença dos miúdos, com consequências negativas óbvias e que apenas acentuam a necessidade de se minimizar ou eliminar este tipo de ocorrências.
Segundo o Relatório do Observatório de Mulheres Assassinadas relativo a 2011 registaram-se 27 mortes em contextos de violência doméstica, um número menor que o de 2010, 43 casos, e contabilizam-se 4 queixas de violência doméstica por hora apresentadas às autoridades.
Também o Relatório da Direcção-Geral da Administração Interna refere em 2011 um decréscimo de participações de casos de violência doméstica embora na UMAR, União das Mulheres Alternativa e Resposta, os pedidos de apoio tenham subido 20%. Parece acentuar-se a desconfiança face ao sistema de justiça, apenas 10 a 15 % recorrem ao apoio e muitas pessoas afirmam que queixas anteriores foram inconsequentes. Do total de inquéritos instaurados, 83 % acabam arquivados, apenas 15 % chegam a julgamento que, com frequência, terminam com condenações. Quando se verificam condenações a maioria, 82 %, é com pena suspensa, veja-se que de 58 sentenças em processos-crime por violência doméstica relatadas à DGAI no primeiro trimestre de 2011, 52 por cento foram absolvições e 48 por cento condenações. Das condenações, apenas 6% merecem pena de prisão efectiva.
No entanto, de acordo ainda com o Relatório da Associação Portuguesa de Apoio à Vítima sobre 2011, o número de casos reportados de violência doméstica continua aumentar sendo ainda de registar um aumento muito significativo mais de 50% de denúncias realizadas por homens.
Por diferentes ordens de razões e embora a realidade se vá modificando lentamente, veja-se o aumento de denúncias por parte dos homens, parece assumir-se ainda uma espécie de fatalidade face à tolerância do crime de violência doméstica dirigida às mulheres, mas não só, provavelmente. Esta tolerância relativiza-se à dificuldade de prova, ao sistema de valores e situação de dependência emocional e económica de muitas das vítimas, à atitude conservadora de alguns juízes, etc. Permanece ainda com alguma frequência a dificuldade de promover a retirada do agressor do ambiente doméstico, procedendo-se à saída da vítima numa espécie de dupla violência que, aliás, também se verifica em situações de maus tratos a crianças, em que o agressor fica em casa e a criança é “expulsa”.
Importa ainda combater de forma mais eficaz o sentimento de impunidade instalado e ainda, como referi, alguma “resignação” ou “tolerância” das vítimas face à percepção de eventual vazio de alternativas ou a uma falsa ideia de protecção dos filhos em caso de separação do agressor. Nesta perspectiva, torna-se fundamental a existência de dispositivos de avaliação de risco e de apoio como instituições de acolhimento e, naturalmente, um sistema de justiça eficaz e célere. 

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