Ao que refere o Público, dois sindicatos
representativos da classe médica aceitam aumentar o número de utentes por cada
médico de família a troco de compensações salariais “por desempenho”. A medida,
que poderá passar de uma média de 1550 utentes por clínico para mais de 1900, permitiria,
sustentam os sindicatos, diminuir significativamente o número de cidadãos sem
médico de família, muitas centenas de milhar, situação verdadeiramente inaceitável,
para mais nos tempos de dificuldades que atravessamos.
Não vou discutir a proposta do ponto de vista
técnico, mas gostava de deixar uma nota. Alguns lembrar-se-ão de algo que veio
a público sobre a avaliação dos médicos no âmbito do Sistema Integrado de
Avaliação de Desempenho adaptado à carreira médica.
Não está em causa, obviamente a avaliação de
desempenho, é uma ferramenta imprescindível à promoção da qualidade e eficácia
de pessoas e instituições pelo que faz todo o sentido definir um modelo de
avaliação também para os médicos.
As minhas dúvidas começam quando entre os critérios
se enuncia produtividade e "atitude profissional e comunicação" com
colegas, superiores, doentes e utentes, questão que hoje recordo a propósito do
aumento de utentes por médico e do pagamento “por desempenho”.
Sabe-se que existem muitos milhares de pessoas
sem médico de família que lutam por uma consulta, sem garantia de a conseguir,
indo a meio da noite para a porta do centro de saúde. Sabe-se que existem
médicos de família que são responsáveis por milhares de doentes. Muitas das
pessoas que recorrem às consultas são idosas que frequentemente sofrem de “sozinhismo”,
a doença de quem vive só, que se minimiza no convívio com outros sós na sala de
espera e na atenção de um médico que escuta, por vezes, mais a dor da alma que
as dores do corpo.
Neste cenário como avaliar "atitude" e
"comunicação". Já estive envolvido em circunstâncias, pessoais ou
acompanhando familiares, em que o médico claramente estava pressionado pelo
tempo que (não) podia dedicar, a atitude que não podia demonstrar, a
comunicação que não podia estabelecer. As muitas pessoas com horas de espera na
sala inibem-no na "atitude e comunicação" e pressionam-no na
"produtividade".
Temo que o aumento de utentes por médico e a
pressão acrescida sobre os profissionais, que beneficiarão de acréscimos
remuneratórios “por desempenho”, possa melhorar a “produtividade” mas ameace a
qualidade.
Ainda assim, nada que se estranhe num tempo em que os números mandam nas pessoas.
Não vou dissecar o método Hondt.
ResponderEliminarFaço apenas uma pergunta: Porque motivo o poder político não aproveita a boleia do aumento de doentes por cada médico de família e aumenta o número de eleitores necessários para que um deputado seja eleito por cada círculo?
Mistério...Mistério... Mistério... Ou não?!
saudações