A imprensa de hoje divulga o resultado da
auditoria do Tribunal de Contas ao negócio de aquisição de 12 helicópteros EH
101 que, de um encargo previsto de 244 milhões de euros, chegou aos 364 milhões,
uma derrapagem de 50 % que envolve, diz o TC, duplicação de facturação.
Relembro um Relatório recente produzido no âmbito
da organização Transparency International, envolvendo 24 países europeus e em
Portugal sob a responsabilidade da Associação Transparência e Integridade,
Centro Inteli-Inteligência e Inovação e pelo Instituto de Ciências Sociais da
Universidade de Lisboa, em que se refere que
o combate à corrupção em Portugal apresenta “resultados mais baixos do
que seria de esperar num país desenvolvido”, concluindo, entre muitos outros
aspectos, que a “troca de favores” e a “cunha estão institucionalizadas “entre
colegas do mesmo governo”.
Nada de novo, nem no que respeita ao caso de hoje,
nem nos dados do Relatório. Em publicação anterior da Transparency
International, Portugal é um dos 21 países em que existe "pouca ou nenhuma
implementação" da Convenção anti-corrupção da OCDE. Considerando ainda
indicadores do Barómetro Global da Corrupção, também no âmbito da Transparency
International, 83% dos portugueses acham que piorou a questão da corrupção e
75% não acredita na eficácia do combate.
No entanto, como é constatado, está sempre
presente nos discursos partidários a retórica que sustenta o fingimento da luta
contra a corrupção e a promoção da transparência na vida política portuguesa e,
regularmente, emergem umas tímidas propostas que mascaram essa retórica, entram
na agenda e rapidamente desaparecem até ao próximo fingimento. até nova
iniciativa condenada ao mesmo trajecto. Pode acontecer que com o deslizar da
nossa soberania para outras paragens, alguma entidade ou grupo lá de longe
venha cá impor mudanças.
Do meu ponto de vista, nenhum dos partidos do
chamado “arco do poder”, está verdadeiramente interessado na alteração da
situação actual, o que, aliás, pode ser comprovado pelas práticas desenvolvidas,
por todos, quando foram ocupando o poder. A questão, do meu ponto de vista, é
mais grave. Os partidos, insisto no plural, mais do que NÃO QUERER mexer
seriamente na questão da corrupção e do seu financiamento, NÃO PODEM e vejamos
porque não podem.
Nas últimas décadas, temos vindo a assistir à
emergência de lideranças políticas que, salvo honrosas excepções, são de uma
mediocridade notável. Temos uma partidocracia instalada o que determina um jogo
de influências e uma gestão cuidada dos aparelhos partidários donde são, quase
que exclusivamente, recrutados os dirigentes da enorme máquina da administração
pública e instituições e entidades sob tutela do estado. Esta teia associa-se à
intervenção privada sobretudo nos domínios, e são muitos, em que existem
interesses em ligação com o estado, a banca e as obras públicas são apenas exemplos.
Os últimos tempos têm sido particularmente estimulantes nesta matéria.
A manutenção deste quadro, que nenhum partido
está evidentemente interessado em alterar, exige um quadro legislativo
adequadamente preparado no parlamento e uma actividade reguladora e
fiscalizadora pouco eficaz ou, utilizando um eufemismo, “flexível”. Assim, a
sobrevivência dos partidos, tal como estão, exige a manutenção da situação
existente pelo que, de facto, não podem alterá-la. Quando muito e para nos
convencer de que estão interessados, introduzem algumas mudanças irrelevantes e
acessórias sem, obviamente, mexer no essencial. Seria um suicídio para muita da
nossa classe política e para os milhares de boys de diferentes cores que se têm
alimentado, e alimentam do sistema.
Parece, assim, um problema complicado. De quem
faz parte do problema, não podemos esperar a solução.
A solução do problema sempre residiu no voto em branco. É a única forma de tirar legitimidade democrática aos vampiros do povo.
ResponderEliminarExcerto da canção de ZECA AFONSO
"No céu cinzento sob o astro mudo
Batendo as asas pela noite calada
Vêm em bandos com pé de veludo
Chupar o sangue fresco da manada.
A toda a parte chegam os vampiros
Poisam nos prédios poisam nas calçadas
Trazem no ventre despojos antigos
Mas nada os prende ás vidas acabadas
No chão do medo tombam os vencidos
Ouvem-se os gritos na noite abafada
Jazem nos fossos vítimas dum credo
E não se esgota o sangue da manada.
Eles comem tudo, eles comem tudo, eles comem tudo e não deixam nada"
saudações