AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quinta-feira, 14 de junho de 2012

A FINALIZAÇÃO DO SECUNDÁRIO E O ACESSO AO SUPERIOR, MAIS UM EQUÍVOCO

O MEC decidiu, dentro da já habitual estratégia do "consenso de uma opinião só" ainda que na sua esfera de competências, que a nota da disciplina de Educação Física deixe de contar para o apuramento da média final do ensino secundário para efeitos de acesso ao ensino superior, embora seja usada para alunos que pretendam prosseguir estudos nesta área ou para cálculo da média de conclusão de estudos secundários.
A medida contém desde logo um aspecto incompreensível, a atribuição de um estatuto de segunda a uma disciplina que como outras de carácter geral integram os currículos. Por outro lado, o efeito de desvalorização da disciplina contrariando orientações europeias, que começou com um decréscimo das horas desta disciplina definidas nas novas matrizes curriculares, num país caracterizado por um excesso de sedentarismo nos estilos de vida dos jovens, seria de considerar.
A razão da decisão pode remeter para um potencial enviezamento que as notas de Educação Física poderão ter no acesso ao Ensino Superior,  o velho exemplo do aluno que quer ser médico mas não tem "jeito para a ginástica". Eventualmente, poderá acontecer também falta de "jeito para a Filosofia ou para o Inglês" sem que se justifique retirar estas disciplinas do cálculo da média de acesso.
No entanto, do meu ponto de vista, esta questão só acontece porque, digo-o de há muito, a conclusão e certificação de conclusão do ensino secundário e a candidatura ao ensino superior se sobrepõem quando deveriam ser processos separados.
Os exames nacionais destinam-se, conjugados com a avaliação realizada nas escolas, a avaliar e certificar o trabalho escolar produzido pelos alunos do ensino secundário e que, obviamente, está sediado no ensino secundário. Neste cenário caberiam todas as modalidades que permitem a equivalência ao ensino secundário, como o ensino recorrente.
O acesso ao ensino superior é, deveria ser, um outro processo que se desenrolaria sob a responsabilidade do ensino superior.
A situação existente, não permite qualquer intervenção consistente do ensino superior na admissão dos seus alunos, a não ser a pouco frequente definição de requisitos em alguns cursos, o que até torna estranha a passividade aparente por parte das universidades sempre tão ciosas da sua autonomia. Parece-me claro que o ensino superior fazendo o discurso da necessidade de intervir na selecção de quem o frequenta, não estará, na verdade, interessado em assumir a dimensão logística e processual envolvida.
Os resultados escolares do ensino secundário deveriam constituir apenas um factor de ponderação a contemplar nos processos de admissão organizados pelas universidades como, aliás, acontece em muitos países.
Sediar no ensino superior o processo de admissão minimizaria muitos dos problemas conhecidos decorrentes do facto da média do ensino secundário ser o único critério utilizado para ordenar os alunos no acesso. Todos nós conhecemos os clássicos exemplos de alunos que se dirigem a medicina porque as suas altíssimas notas assim o sugerem, acabando por reconhecer não ser esse o seu caminho e, por outro, um potencial excelente médico que deixará de o ser porque por três vezes ficou a décimas da média de entrada.
Enquanto não se verificar a separação da conclusão do secundário da entrada no superior todos os anos teremos situações desta natureza e acabam por sustentar medidas avulsas e, no mínimo, discutíveis como a que foi tomada em relação à Educação Física.

2 comentários:

  1. Lembro-me de uma amiga do secundário, brilhante, que optou por seguir um curso de média de entrada baixa (uma profissão que a deixa feliz e que desempenha com muito sucesso). Lembro-me da pena dos pais, por ela não ir para medicina e dos comentários das vizinhas "D. Zélia, não a deixe fazer isso... Ela tem média para ir para o que quiser!". E ela tinha que repetir muitas vezes aos pais que era mesmo isso que estava a fazer, a ir para o que queria.

    Há aqui também uma coisa que irrita, o pressuposto que o sonho de qualquer pessoa é ser médico. Acho ofensivo, rouba-nos a direito à individualidade.

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  2. Sem dúvida Joana, a questão é complexa, envolve as representações do que é sucesso e realização e as próprias questões do acesso ao superior para além de outros aspectos

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