Uma criança de 13 anos é dispensada pelo Ministério Público
de frequentar a escola. Este enunciado é, no mínimo, estranho num país com a
escolaridade obrigatória instituída em 12 anos e que tem entre os seus direitos
fundamentais de cidadania, o direito à educação. Embora não seja jurista, tal
decisão, parece-me de difícil sustentação.
Mas a situação tem alguns contornos que vale a pena
considerar, a criança é de etnia cigana e vive num acampamento, excluída,
portanto.
A escola, na região de Viana do Castelo, com o apoio da
Comissão de Protecção de Crianças e Jovens tentou e, sublinhe-se, continua a
tentar, que a Gracinda, a criança dispensada dos seus direitos, aceda a
formação escolar, de natureza diferenciada, cuja importância é dispensável
acentuar.
A Procuradora-adjunta entendeu por bem arquivar o caso, “Atento
o meio cultural em que esta menor se insere, não existe qualquer medida de promoção
e protecção que se adeqúe à sua situação." Um despacho que me parece um
acto de “delinquência” e, naturalmente, criticado pela entidades envolvidas e
por alguns especialistas ouvidos no trabalho do Público sobre esta questão.
Já algumas vezes me tenho referido a decisões no âmbito dos
Tribunais de Família e de Menores absolutamente atentatórias dos direitos e do bem-estar
dos miúdos, que contrariam o princípio fundador do ordenamento jurídico
português no que respeita aos mais novos, o supremo interesse da criança.
A justificação com o meio cultural é absurda e criminosa.
Como é sabido, em Portugal, por razões culturais, também se realizam práticas
de mutilação genital feminina, procedimento delinquente, condenável e que
atropela direitos óbvios. A Procuradora-adjunta Marta Gonçalves entenderá, provavelmente,
que considerando o meio cultural nada haverá a fazer.
Para quem conhece minimamente este universo, são
conhecidas muitas decisões “delinquentes” de alguns decisores judiciais que
apenas devem reconhecer “o supremo interesse da criança” como figura jurídica e
não como princípio fundador inalienável das decisões que envolvam o bem-estar
de crianças e jovens, por mais difícil que possa entender-se a sua
operacionalização, é uma outra questão.
Este cenário, hoje relata-se apenas mais um exemplo,
evidencia a necessidade urgente de que os Tribunais de Família e de Menores
existam em todos os círculos, o que está longe de acontecer, que sejam dotados
dos recursos humanos necessários a uma tramitação célere dos processos em
apreciação e, aspecto fundamental, que se desenvolva um sólido trabalho de
formação dos agentes de decisão judicial.
Em nenhuma circunstância e muito menos quando
envolve menores, a administração do direito é apenas um exercício de amanuense
administrativo.
Estas situações acontecem dentro da etnia cigana (só com as raparigas). Logo que começam a despertar para a adolescência, a família já não vê com bons olhos a sua ida à escola. É por esta altura que a família escolhe o que será o seu marido, logo que tenha 15 anos (por vezes ainda mais cedo).
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