AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

sexta-feira, 4 de novembro de 2011

NÃO MEXAM MUITO NAS AUTARQUIAS, CUIDADO COM OS VOTOS

Lamentavelmente, parece que só a crise veio obrigar-nos a pensar na forma como o estado, aos seus diversos níveis e estruturas, se organiza para assumir as suas enormes competências e atribuições. Todos temos consciência do gigantismo da administração, da forma como esta é usada pelos aparelhos partidários, da irracionalidade de muitos dos modelos de organização e funcionamento e, sobretudo, dos enormes custos e níveis de desperdício envolvidos. Agora, com o clima económico em alerta vermelho tudo parece ser objecto de cortes e tentativas de poupança. A mais recente notícia vem da ideia em estudo da Câmara de Lisboa de encerrar parte dos seus serviços um dia por semana. Estará em avaliação o impacto financeiro da medida, para que o executivo municipal possa decidir, ou não, nesse sentido. Já agora, talvez fosse de incluir no estudo a análise do impacto para os munícipes.
Por outro lado, sabe-se que as autarquias são grandes empregadores sendo que em muitos concelhos serão mesmo o principal empregador. Modelos de desenvolvimento que levaram ao abando da agricultura, promoveram a desertificação e um movimento fortíssimo de litoralização levaram a que em muitas zonas as oportunidades de emprego escasseassem. Nessas circunstâncias, as autarquias assumiram uma espécie de programa social assegurando empregos que, naturalmente, não eram justificados pelas necessidades das câmaras e que se juntavam aos criados pelas necessidades das clientelas partidárias. Tudo isto assume ainda um resultado colateral, positivo, constitui um bom contributo para a contabilidade eleitoral pois, quer as admissões, quer a manutenção do emprego não estão, obviamente, fora da gestão dos interesses partidários presentes, muito presentes, na vida autárquica e este é um cenário de toda a administração autárquica.
Lembro-me com frequência de ter assistido numa praça de uma vila do interior a um espectáculo muito curioso e elucidativo da gestão da coisa pública. Um funcionário recolhia diligentemente as ervas que cresciam entre as pedras da calçada. Colocava as ervas colhidas num balde junto do qual aguardava um outro funcionário que, quando finalmente (era demorado) o balde estava cheio, o despejava para um veículo de transporte que perto e a trabalhar permanentemente, tinha o condutor sentado ao volante. Sintetizando, três funcionários, em simultâneo, desenvolviam uma actividade que seria um exemplo notável do que não deve acontecer em matéria de gestão e eficácia.
Mesmo em zonas urbanas e de grande densidade demográfica o desperdício e ineficácia são significativos. Na zona onde moro, Almada, assisto a situações quase anedóticas não fora estar o dinheiro dos contribuintes em jogo. Neste contexto, mais do que medidas como encerrar os serviços um dia por semana, importaria racionalizar a organização e procedimentos, eliminar estruturas e serviços que se atropelam e justificam a sua existência dando cabo da paciência do cidadão, alocar recursos humanos e meios de forma diferenciada consoante as necessidades etc., etc.
Temo, no entanto, que muito do que se vai fazendo e anunciando acabe por não tocar nas questões de fundo do poder autárquico, e assente, sobretudo, em cortes cegos nos recursos humanos e nos orçamentos, com impactos severos na área da educação, por exemplo, ou ainda em medidas de cosmética sem impacto significativo.

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