AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

quarta-feira, 30 de novembro de 2011

A INCUBAÇÃO DO MAL

Desde o início optei por não abordar no Atenta Inquietude matérias exteriores à realidade portuguesa e raríssimas vezes tenho fugido a esta opção.
No entanto, retorno à tragédia de Oslo, que agora reentrou na agenda devido à decisão de especialistas noruegueses que consideraram Anders Breivik inimputávelde por doença mental. Tal decisão, segundo o Público, é susceptível de discussão, conforme opinião de especialistas portugueses ouvidos. Não tenho competência para este tipo de discussão mas gostava de retomar algumas notas, não tanto sobre este caso mas, fundamentalmente, a propósito deste caso.
Disse na altura que para além do sentimento de dor e perda, a perplexidade seria o que melhor caracterizaria a sociedade norueguesa naqueles dias, patente, aliás, em muitos testemunhos. Porquê? Porquê na Noruega, comunidade aberta, tolerante e segura? Porquê um norueguês e não um terrorista associado a redes conhecidas? Porquê? Porquê?
A dificuldade de responder a estas questões é da mesma ordem da dificuldade de encontrar meios seguros de evitar tragédias deste tipo. O episódio, com contornos semelhantes ao protagonizado por Timothy McVeigh que em Oklaoma, em 1995, causou 180 mortos e mais de 600 feridos, assumido por uma só pessoa, inteligente, socialmente integrada, numa sociedade aberta é, de facto, muito difícil de prevenir.
A questão, do meu ponto de vista, remete sobretudo para a necessidade de percebermos e estarmos atentos a um tipo processo que designo como "incubação do mal" que se instala nas pessoas, muitas vezes logo na adolescência, a partir de situações de mal-estar que podem passar relativamente despercebidas mas que, devagarinho, insidiosamente, começam interiormente a ganhar contornos que identificam os alvos, sentidos com os causadores desse mal-estar.
A fase seguinte pode passar por duas vias, uma mais optimista em que alguma actividade, socialmente positiva possa drenar esse mal estar, nessa altura já ódio e agressividade, ou, a outra via, em que aumenta exponencialmente o risco de um escalada que pode ser um tiroteio num liceu, a bomba meticulosamente e obsessivamente preparada ou o ataque a uma concentração de jovens de um partido que representa o "mal", independentemente de, nesta altura já se poder considerar que existe um "mal-estar" tão grande que já é doença e que terá como eventual consequência a inimputabilidade criminal.
Por mais policiada que seja uma sociedade é extraordinariamente difícil prevenir processos desta natureza em que o mal se vai incubando e em que as ferramentas de acção são acessíveis.
Como bem afirmaram na altura as autoridades norueguesas, a questão não é abdicar da abertura e da tolerância que caracteriza a sua, nossa, sociedade. A questão passará sobretudo por uma permanente atenção às pessoas, ao seu bem-estar, tentando detectar, tão cedo quanto possível, sinais que indiciem o risco de enveredar por um caminho que se percebe como começa, mas nunca se sabe como acaba.
Na Noruega, nos Estados Unidos ou em Portugal.

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