O ensino superior em Portugal é, como muitíssimas outras áreas, vítima de equívocos e de decisões políticas nem sempre claras. Uma das grandes dificuldades que enfrenta prende-se com a demissão durante muito tempo de uma função reguladora da tutela que, sem ferir a autonomia universitária, deveria minimizar o completo enviesamento da oferta, pública e privada, que se verifica. Um país com a nossa dimensão não suporta tantos estabelecimentos de ensino superior, sobretudo, se atentarmos na qualidade. As regiões e autarquias reclamam ensino superior com a maior das ligeirezas. Durante algum tempo, a pressão vinda da procura e a incapacidade de resposta do subsistema de ensino superior público associada à demissão da tutela da sua função reguladora, promoveu o crescimento exponencial do ensino superior com situações que, frequentemente, parecem incompreensíveis à luz de um mínimo de racionalidade e qualidade. Portugal contará, segundo a informação disponível, com cerca de 160 instituições de ensino superior e como indicador relativo pode referir-se um rácio de 17,4 estabelecimentos por milhão de habitantes, enquanto a Espanha apresenta 7, um dado extraordinário.
Nesta matéria, a qualidade e o redimensionamento da rede, espera-se que o processo em curso de Avaliação e Acreditação se revele um forte contributo. Segundo dados recentes da A3ES de 5262 cursos em funcionamento em 2008 já encerraram 1221, o que parece bastante significativo. Uma consulta à oferta de licenciaturas e mestrados por parte do ensino superior público e privado mostra como imperiosa se torna a racionalização dessa oferta. Como afirma o Professor Alberto Amaral, o presidente da A3ES, “Portugal tem excelentes cursos mas criou-se imenso lixo no ensino superior”. Deixo alguns exemplos interessantes de designação de cursos de mestrado em estabelecimentos de ensino superior público e que vão no sentido das considerações da Coordenadora do CNE para o Ensino Superior e ex-reitora da Universidade de Aveiro, a Professora Helena Nazaré em entrevista de hoje no Público. Vejamos, Políticas de Bem Estar em Perspectiva: Evolução Conceito e Actores; Fruticultura Integrada; Design do Produto; Marketing Relacional; Negócios Internacionais; Resolução Alternativa de Litígios; Empreendedorismo; Biorremediação; Aconselhamento e Informação em Farmácia; Ciências da Complexidade; Estudos Sociais da Ciência; Gestão de Mercados de Arte; Instituições e Justiça Social, Gestão e Desenvolvimento; Novas Fronteiras do Direito; Branding e Design de Moda; Estudos Regionais e Locais; Design e Desenvolvimento de Fármacos; Alimentação - Fontes, Cultura e Sociedade; Ciências da Paisagem; Psicomotrocidade Relacional; Anatomia Artística; Gestão Integrada de Relvados Desportivos e Ornamentais; Geomática Ambiental; Comunicação de Moda; Comunicação e Desporto; Ciências Gastronómicas; As Humanidades na Europa: Convergências e Aberturas; Metropolização, Planeamento Estratégico e Sustentabilidade; Gestão de Pessoas.
Embora entenda que a oferta formativa de qualificação superior não deva ser liderada pelo mercado, longe disso, também não o pode esquecer. Existem cursos que apesar de alguma menor empregabilidade se inscrevem em áreas científicas de que não podemos prescindir com o fundamento exclusivo da empregabilidade, aparente ou real. Podemos dar como exemplo formações na área da filosofia ou nichos de investigação que são imprescindíveis num tecido universitário moderno. Será também importante que o processo permita desenvolver e incentive modelos de cooperação, universitário e politécnico, público e privado, que potencie sinergias, investimentos e massa crítica que promovam a imprescindível reorganização da rede.
O enviesamento da oferta de que acima falava, alimenta a formação em áreas menos necessárias e não promove a formação em áreas carenciadas. Tal facto, conjugado com o baixo nível de desenvolvimento do país e com uma opinião publicada pouco cuidadosa na informação, leva a que se tenha instalado o equívoco dos licenciados a mais e destinados ao desemprego, quando continuamos a ser um dos países da UE com menos licenciados, já o disse aqui muitas vezes.
Precisamos que, com lucidez e coragem por parte da tutela e das instituições, que se repensem os caminhos do ensino superior em Portugal.
Estimado Zé Morgado,
ResponderEliminarO seu texto tem um erro que continua a expandir na comunicação social. É errado dizer que Portugal tem Instituições de Ensino Superior a mais.
1. O número depende da dimensão das instituições em cada país. A U. do Porto contará como duas do Minho em número de alunos?
2. Só se devem considerar as instituições públicas (e essas são muito menos do que as que refere), pois as privadas existem em função do mercado...tout court!
3. O Reino Unido tem actualmente 115 Universidades (61 milhões hab. em 2009)
4. A Alemanha 70, num total de 300 contando com Institutos (81 milhões)
5.Acho que não custa muito entender que o nosso problema é não termos um número significativo de Universidades ao nível de poderem concorrer entre si...só assim podemos posicionarmos melhor nos rankins internacionais...e essa falta de concorrência continuará enquanto as actuais grandes continuarem a gerir o bolo entre elas.
6. A concentração das 2 instituições de Lisboa faz aliás parte da estratégia de aglomeração para controlar. A questão da dimensão (para concorrer internacionalmente é falácia)...o MIT tem 10 mil alunos...Stanford 19 mil, Oxford 21 000...a U. Técnica já tem actualmente 25 mil. A U.L. 23 mil...Se não concorrem com as internacionais não é por terem falta de alunos...é porque em Portugal não há concorrência.
Meu caro João Miguel Montenegro. Agradeço o seu comntário mas insisto que Portugal tem uma rede sobredimensionada de ensino superior, universitário e politécnico, público e privado que, só por si mas não como factor único, é um constrangimento à qualidade. Será interessante uma pesquisa sobre os níveis de qualificação dos corpos docentes de todos os estabelecimentos de que a tutela autorizou o funcionamento.
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