AS MINHAS CONVERSAS POR AÍ

segunda-feira, 11 de julho de 2011

A ATENÇÃOZINHA

A informação destes últimos dias tem alguns dados curiosos. No CM e no I refere-se que na administração pública foram detectados 450 casos de atribuição de prémios e promoções não fundamentados legalmente. O Público titula que foram canceladas 20 000 baixas nos primeiros quatro meses do ano, ou seja, em um de cada quatro casos avaliados a baixa foi retirada. Ontem, o CM titulava a atribuição de 531 milhões euros em subsídios ilegais. No I refere-se que o Governo irá proceder a uma verificação da justificação das nomeações do PS para a administração nos últimos anos. Aguarda-se a extensão da busca a todas as cores partidárias e à administração central, local, empresas municipais, empresas públicas, etc.
Uma última nota ainda para a informação do JN de que os estádios municipais construídos para o Euro custam às respectivas autarquias 55 000 € por dia.
Um estudo recente estimava que a perda em impostos não cobrados nos circuitos da economia paralela será da ordem dos 2,5 mil milhões sendo que, para comparação, o imposto a cobrar sobre o subsídio de Natal renderá 800 milhões de euros.
É de facto um cenário impressionante mas não surpreendente. O esquema, a “atençãozinha”, o “dar um jeitinho”, fazem parte da nossa cultura. Depois é uma questão de escala, pode ir de meia dúzia de robalos a milhões colocados em zonas francas. Diversas vezes aqui tenho me referido a essa espécie de traço da nossa cultura cívica, o “esquema”, "a atençãozinha" ou a sua variante "dar um jeito". Trata-se de um fenómeno, um comportamento, profundamente enraizado e com o qual parecemos ter uma relação ambivalente, uma retórica de condenação, uma pontinha de inveja dos dividendos que se conseguem e a tentação quotidiana de receber ou providenciar uma "atençãozinha" ou pedir ou dar um jeito, sempre "desinteressadamente", é claro.
A teia de interesses que ao longo de décadas se construiu envolvendo o poder político, a administração pública, central e autárquica, o poder económico, o poder cultural, a área da justiça e segurança, parte substantiva da comunicação social e toda a relação do dia a dia com o “esquema” dificulta seriamente um combate eficaz. Este combate passará, naturalmente, por meios e legislação adequada, mas passa sobretudo pela formação cívica que promova uma outra cidadania. Estarão lembrados que há algum tempo atrás foram divulgados estudos evidenciando a nossa atitude tolerante para com a corrupção, sobretudo a pequena corrupção, o “jeitinho”.
Certamente que poderíamos viver sem a "atençãozinha" ou o "jeitinho", mas não era a mesma coisa.

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