Logo no início da legislatura a Ministra Isabel Alçada anunciou uma, tão imprescindível quanto urgente, alteração no desenho e conteúdos curriculares do 3º ciclo do básico. Aplaudi mas logo refreei o aplauso quando duas semanas depois a Ministra, apoiada nas declarações do Professor João Formosinho, coordenador do processo de mudança veio dizer que afinal se trataria de um "mero ajuste" e que tocaria sobretudo nas áreas não curriculares do Estudo Acompanhado, Formação Cívica e Área de Projecto.
Já aqui escrevi que o número de disciplinas e a extensão e natureza dos conteúdos curriculares se associam de forma bem significativa a algumas das questões mais frágeis do sistema educativo, designadamente no 3º ciclo, insucesso, absentismo e indisciplina, tudo dimensões fortemente ligadas aos níveis de motivação e funcionalidade percebida pelos alunos nos conteúdos curriculares.
Também já aqui referi que a passagem da intenção de alterar desenhos e conteúdos para um "mero ajuste" não terá sido alheia a reacções que na altura considerei informadas pelo que poderemos chamar de corporativismo científico, ou seja, discursos ambíguos sobre a necessidade de alterar as disciplinas "desde que não seja a minha", alimentando a pressão para que não se altere um modelo excessivamente disciplinarizado. Esta lógica tem informado o sistema educativo mas também o sistema de formação de professores durante demasiado tempo, o que suporta esta disciplinarização sem sentido, 14 disciplinas para 25,5 horas de aulas no 3º ciclo. Acresce o impacto que este quadro tem num modelo de ensino altamente "manualizado". É curioso notar, se bem estivermos atentos, a frequência com que a propósito de qualquer saber, se defende a existência de mais uma disciplina.
O ME vem agora assegurar que não haverá alterações de natureza curricular para o próximo ano lectivo. Considerando o calendário, a pouca distância a que estamos do arranque, ainda bem que não se verificarão mudanças, basta a confusão e instabilidade decorrentes do processo de reordenamento da rede, designadamente, com a trapalhada insustentável dos mega-agrupamentos.
No entanto, cada ano que passa sem que se produzam alterações sérias e consensuais no desenho e conteúdos curriculares, no 3º ciclo são vitais, perde-se uma oportunidade de melhorar a qualidade do sistema.
Mas como o ME é especialista em promover novas oportunidades, talvez seja estratégia.
É uma questão de prioridades: arcar com a responsabilidade de reformar drasticamente o sistema de ensino no 3º ciclo (ter de mandar muitos professores para a rua) vs o futuro do País. Infelizmente, o imediato sobrepõe-se sempre ao estruturante.
ResponderEliminarNão tenho a certeza de que fosse necessário "mandar professores para a rua", depende dos modelos de funcionamento das escolas e das salas de aula
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