Um dia destes para ocupar a espera por alguém, sentei-me num banco a ver passar o mundo. Quase sem dar por isso sentou-se ao meu lado um Velho que, depois de cumprimentar, compôs um ar que não sou capaz de descrever, mas parecia assim um convite para conversar. Como é costume começámos com as banalidades do tempo, bom por acaso, e passámos à vida da gente. Quando lhe perguntei se ainda trabalhava, riu-se e disse-me que tinha um trabalho de que não havia reforma, era, disse com a maior serenidade, Escutador. Perante a minha perplexidade, repetiu devagar, sou um Escutador, não me falta trabalho, acrescentou. Não resisti à curiosidade de saber que escutava um Escutador.
O Velho começou, sempre num jeito manso, a explicar-me o que escuta. Escuta pessoas, muitas pessoas. Escuta miúdos que passam muito tempo sós e que, por vezes, gritam desesperadamente por alguém que os oiça. Escuta adolescentes que vivem perdidos falando para outros tão perdidos quanto eles que também só falam, não ouvem. Escuta gente, muita gente, mulheres e homens que não se escutam ou porque vivem sós, ou porque se sentem sós no meio de uma vida maior que eles, que grita tão alto que torna impossível escutar o que quer que seja. Escuta velhos, silenciosos, isolados, que apenas têm por companhia uma televisão que não os escuta mas que eles também não ouvem, o som é um ruído de fundo a disfarçar a solidão. Durante ainda mais uns minutos foi falando de quem escutava. Pois é este o meu trabalho amigo, escutar, resumiu por fim o Escutador.
Nessa altura, esgotou-se a minha espera e ainda meio perplexo despedi-me do Escutador com um banal, gostei de o ouvir. De escutar, disse o Velho acrescentando, olhe amigo, um dia ainda vai gostar e aprender a ser um Escutador, é que há poucos.
Escutar faz bem a quem é ouvido mas também a quem ouve.
ResponderEliminar