tag:blogger.com,1999:blog-7304926325203038559.post3673751536055941744..comments2024-02-14T18:03:34.864+00:00Comments on Atenta Inquietude: TEMPOS VELHOS, TEMPOS NOVOSZé Morgadohttp://www.blogger.com/profile/12753277778634048432noreply@blogger.comBlogger3125tag:blogger.com,1999:blog-7304926325203038559.post-75397855472898566402020-01-30T13:46:40.001+00:002020-01-30T13:46:40.001+00:00Olá José Pacheco, na verdade é também com a memóri...Olá José Pacheco, na verdade é também com a memória que se percebe o presente e se constrói o futuro. Também na educação. Abraço.Zé Morgadohttps://www.blogger.com/profile/12753277778634048432noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-7304926325203038559.post-54704407916226436382020-01-30T10:43:37.691+00:002020-01-30T10:43:37.691+00:00Santa Comba, janeiro de 2040
Enquanto estivermos v...Santa Comba, janeiro de 2040<br />Enquanto estivermos vivos, é nosso dever falar aos que não eram nascidos, para que saibam até onde se pode chegar – palavras de Primo Levi, sobrevivente de Auschwitz. <br />Um psiquiatra holandês, que assistiu à libertação do campo da morte dizia ser preciso anotar, “para todos ficarem a saber e nunca mais acontecer”. E fez-se necessário contar e recontar o terror, há vinte anos, quando contornos de novas inquisições e ditaduras ressurgiam. Duas décadas atrás, quando a extrema-direita e o populismo aumentavam a sua influência, citando Goebbels, negando o desastre climático e as câmaras de gás, foi necessário refrescar memórias. <br />Auschwitz aconteceu numa Europa supostamente culta, humanizada, mas que sucumbiu numa orgia de violência e desintegração humana sem precedentes. Primo Levi sobreviveu a Auschwitz, mas não resistiu à recordação de horrores e se suicidou. O seu último livro – “Os que Sucumbem e os que se Salvam” – reflete o temor de que tudo viesse a repetir-se. <br />Após a segunda guerra mundial, os Estados Unidos lançaram um projeto de reconstrução e de reestruturação econômica de países europeus: o chamado Plano Marshall. Mas, por se ter aliado a Hitler, Mussolini e Franco, o ditador Salazar privou o seu país dessa preciosa ajuda. <br />Nasci, exatamente, seis anos após o primeiro dia do pós-guerra e a meio dos quarenta e oito anos da ditadura de Salazar. Passando pela terra onde nasceu o ditador (Santa Comba), dolorosas recordações me assaltaram: as fomes infligidas aos vossos trisavôs, a injusta prisão do vosso bisavô, os maus-tratos por que passou a geração deste vosso avô. <br />Na escola do tempo de ditadura, o professor enchia-nos de pontapés, socos na cara e, pegando-nos pelos cabelos, batia a nossa cabeça contra o quadro negro. Nos idos de sessenta, conheci um professor que distribuía tapas pelas razões mais comezinhas. Mas do que ele gostava mesmo era da cruel “chamada ao quadro”. Quando o “Senhor Engenheiro” – ele não permitia que o tratassem por professor e nisso estava certo – sadicamente acariciava a caderneta dos alunos e a abria numa página ao acaso, um silêncio tumular prenunciava a tormenta – quem seria a vítima do dia? O suspense era quebrado, quando um nome era pronunciado e muitos suspiros de alívio se ouviam em surdina. “Fulano de tal! Ao quadro! Já!” – E o fulano lá ia, como ovelha para a degola. <br />O Dimas fazia parte do grupo dos mártires. Já havia sido contemplado com humilhações, que lhe deterioraram a auto-estima de jovem com quinze anos feitos. <br />Naquele dia, o “Engenheiro” estava mais carrancudo que o habitual. As tábuas do estrado rangeram de um modo mais tenebroso que o habitual. Os momentos que precederam o momento fatal pareceram ainda mais longos que o habitual. O “Engenheiro” apoiou os cotovelos na secretária e os seus dedos passearam pelas páginas da caderneta. A sua voz saiu mais cavernosa que o habitual. Mas o que era habitual não aconteceu. <br />O Dimas escutou o seu nome, mas não se levantou. Ouvimos um gotejar semelhante ao da chuva no telhado. Mas, lá fora, o dia estava solarengo. Era o Dimas, sentado na sua carteira, hirto… urinando.<br /><br />Abraço fraterno!<br />JoséJosé Pachecohttps://www.blogger.com/profile/16113394780015420451noreply@blogger.comtag:blogger.com,1999:blog-7304926325203038559.post-63385819911666472762020-01-30T10:43:24.601+00:002020-01-30T10:43:24.601+00:00Amigo João, permite que te agradeça o teu texto co...Amigo João, permite que te agradeça o teu texto com duas cartinhas das minhas:<br />Caldas da Raínha, janeiro de 2040 <br />Escrevo esta cartinha no dia em que se comemora os 95 anos da libertação de Auschwitz. Para que não se mate a memória do holocausto, para recordar que, no final da segunda década deste século, alguns bonsais humanos incentivavam práticas escolares reprodutoras da proto-história da humanidade. <br />A militarização da escola operada pela Prúsia do século XIX era reforçada por medidas absurdas emanadas de um poder público, que desconhecia que o adestramento não define a educação, que a educação é incompatível com uma organização autoritária da vida. <br />Há cerca de vinte anos, num tempo de pós-verdade, assistimos a um “regresso ao passado”. O pesadelo cessou, felizmente. Hoje, libertos de “militarizações”, os tempos são outros. Mas continua a ser necessário denunciar o autoritarismo, que fez do sistema educacional alemão do Terceiro Reich o ninho da serpente.<br />Nas cartas, que escrevi à Alice, vos falava de pássaros. Nesta, evocarei a simbólica pomba da paz, com ramo de oliveira no bico. Simbolicamente, anunciava o nascer de um novo tempo, onde práticas educacionais fósseis não faziam mais sentido. <br />Hoje, estão nas prateleiras dos museus da pedagogia. Mas, vinte anos atrás professaurios as reproduziam, condicionando sementeiras de humanidade, condenando sucessivas gerações de aves a uma sub-vida. Mesmo com o pombal aberto, as jovens aves não se arriscavam em voos divergentes.<br />Confirmando essa metafórica evidência, em pleno século XXI, ainda eram muitas as escolas onde se “dava aula”, na ignorância de que a aula não ensinava e de que havia muitos modos de aprender. No século XIX, num tempo em que já se questionava se seria possível ensinar a todos como se fosse um só, o Eça das Conferências do Casino escrevia: As crianças, enfastiadas, repetem a lição, sem vontade, sem inteligência, sem estímulo. O professor domina e põe todo o tédio da sua vida na rotina do seu ensino. <br />Mais de cem anos decorridos, a pretrexto de juvenis indisciplinas, de curriculares flexibilizações, ou de baixos índices de proficiência – que a escola da aula produzia! – burocratas e políticos boçais criavam a aparência do novo e deixavam tudo como dantes.<br />Mas, au bout du chagrin, uns fenêtre ouverte, une fenetre eclairé … e o amigo João, pai amoroso, responsável, preocupado com o futuro dos seus filhos, procurou e encontrou uma escola onde algumas professoras éticas ousaram criar um núcleo de projeto. Com os jovens a seu cuidado, começaram a construir projetos de vida e a produzir conhecimento útil à comunidade. Na produção de currículo, contemplaram a dimensão da consciência planetária, para obstar à destruição da vida em comum. Porque, nesses sombrios tempos, a Austrália estava sendo devastada pelo fogo. As geleiras estavam derretendo. Tragédias provocadas pela humana incúria, faziam perecer milhões de animais e aceleravam a extinção de espécies. Os Estados Unidos e o Irão ameaçavam começar aquilo que poderia ser a terceira (e última) guerra mundial… <br />Na contracorrente, o João, o Manuel, o Diogo, a Magda, a Conceição, o António, o André, o Bernardo e tantos outros amorosos educadores, anunciavam tempos de paz, a ultrapassagem da proto-historia da humanidade.<br />José Pachecohttps://www.blogger.com/profile/16113394780015420451noreply@blogger.com