terça-feira, 30 de junho de 2009

PRIORIDADES

Preparava-me para comentar a troca de galhardetes entre o Presidente da PT, Henrique Granadeiro, e a Presidente do PSD, Ferreira Leite, relativa às influências exercidas pelos governos sobre empresas estatais e sobre a comunicação social. É o tipo de discussão de que ninguém sai bem, toda a gente tem telhados de vidro. Alguém que não tenha estado imigrado nas últimas décadas não terá qualquer dúvida sobre estas tentativas por parte de quem ocupou o poder, logo desde o PREC com o PCP e, por exemplo, a acção de Saramago no DN, lembram-se? Esta gente deveria estar caladinha.
No entanto, mais abaixo no Público on-line vejo uma notícia sobre a alteração dos critérios de atribuição do subsídio social de desemprego de forma a abranger mais pessoas.
Este é que, no momento, é o verdadeiro drama da sociedade portuguesa. Todos os discursos, ideias, iniciativas, procedimentos, o que quiserem, deveriam dirigir-se para os problemas que afectam directamente mais de meio milhão de portugueses e indirectamente, através do impacto na qualidade de vida das famílias atingidas, um número bem maior.
A tentativa por parte do poder de condicionar empresas e comunicação social é, obviamente, grave no plano político e no plano ético, mas não sejamos ingénuos, faz parte do arsenal de procedimentos destinados a perpetuar, claro, o poder. Por isso, todos os que a ele acedem assumem as mesmas práticas, não tapem o sol com a peneira. Mas não se esqueçam de que, actualmente, o desemprego é a prioridade das prioridades.

A EXTENSÃO DA QUALIDADE OBRIGATÓRIA

Em sociedades cada vez mais desenvolvidas a qualificação dos cidadãos torna-se progressivamente mais exigente, como é óbvio. Sem qualificações de base a entrada num mercado de trabalho que solicita níveis de qualificação mais sólidos é mais difícil, senão impossível, pelo que a ausência de qualificação é o primeiro grande risco de exclusão social. Nesta perspectiva, o alargamento da escolaridade obrigatória para 12 anos é, em princípio, uma medida positiva. Também é reconhecida a importância das experiências iniciais nos processos educativos daqui decorrendo que assegurar a universalidade da resposta em educação pré-escolar é, tão-somente, promover equidade no acesso a um dos direitos a fundamentais, o direito à educação de todas as crianças.
Dito isto, importa, no entanto e como aqui já tenho referido, não esquecer a qualidade dos processos. Ainda temos números muito preocupantes de insucesso e abandono na escolaridade obrigatória. Assim, tanto quanto planear a adequada extensão da escolaridade é imprescindível melhorar os níveis de eficácia do sistema educativo. E em minha opinião melhorar níveis de eficácia não significa baixar os níveis de exigência e, assim, aumentar o sucesso, não significa aproveitar uma boa iniciativa, o reconhecimento de competências adquiridas por quem há muito abandonou o sistema, (Estou a falar do Programa Novas Oportunidades), para numa certificação apressada e escassa em conteúdos consistentes, proporcionar equivalências escolares que comporão as estatísticas mas não qualificam os indivíduos.
É sempre mau negócio em educação o descurar da qualidade.

TRABALHO DE MÃE

Um dia destes estava à bica num café pequenino, daqueles de bairro, e ouvi, não pude deixar de o fazer, uma conversa entre duas mães que me pareceram mães, isto é, mulheres que adoptaram os filhos, porque há mulheres, poucas felizmente, que são mais prestadoras de serviços à infância, frequentemente em outsourcing, do que propriamente mães. Uma delas, mais faladora, mostrava alguma preocupação e inquietações relativamente à educação de um gaiato, pelo que percebi, de uns oito anos. Achei curioso o discurso e vou tentar recuperá-lo.
Pois é, muitas vezes, nem sei o que fazer, ele faz asneiras, vou para me zangar com ele e lembro-me que estou tão pouco tempo com ele que se me zangar, nem esse tempo me sabe bem. Eu acho que ele vem cansado da escola, está lá desde as 8, vai com o pai porque eu saio às 7 de casa, vou buscá-lo eu já perto das sete e meia, eu também venho cansada. Depois é a lida do jantar e do banho, estás a ver que tempo é que eu tenho para ele. Dizem que a gente devia brincar com os filhos, falar com eles, mas quando? Ao jantar, aproveitamos para ir vendo as notícias que é quando temos alguma hipótese. Por vezes ainda começo a falar com ele ao deitar mas ele adormece logo e eu também vontade não me falta. Este ano não consegui ir às reuniões da escola, foram sempre a horas que eu não podia. Lá no trabalho se falto começam logo a fazer má cara, como as coisas estão, sabes como é. Não sei se aconteceu contigo, mas este ano pediram para comprar muitas coisas para a escola. Não foi nada fácil, está tudo muito caro, a gente tem que fazer alguns sacrifícios mas fica difícil, lá comprámos o computador, ele ficou contente e não quer outra coisa. Às vezes já me explica algumas coisas, eu percebo pouco daquilo mas ele fica contente de me explicar, mas é um bocadinho ao fim-de-semana, sempre com falta de tempo. Mas é a vida assim, a gente é mãe, é para isto não é, a gente é que quisemos que eles nascessem e ainda bem. E quando vejo o ar dele a dormir, bem quieto, até parece que está rir-se para dentro, fico contente e acho que vale a pena a luta dos dias.
Sabes o que ele me disse no outro dia já nem me lembro a que propósito, “mãe, se os miúdos pudessem escolher as mães, eu escolhia-te à mesma”.
Eu também.

segunda-feira, 29 de junho de 2009

VADE RETRO CRISIS

O Ministro Teixeira dos Santos anuncia o fim da crise. Este tipo de declarações, a que os políticos dificilmente resistem, é, do meu ponto de vista inadequado. Lembramo-nos todos quando há uns tempos atrás, já confrontados com um quadro bem negro em temos financeiros e económicos, o poder político afirmava que a crise se manteria longe de nós e que, na pior das hipóteses, se se aproximasse estaríamos preparados para ela.
Dez por cento de desempregados, uma subida exponencial do sobre endividamento e do crédito malparado das famílias, a falência de milhares de pequenas e médias empresas, os níveis de pobreza preocupantes com o aumento fortíssimo do recurso às instituições de apoio social, veja-se os dados dos Bancos Alimentares, etc., mostram como fomos, estamos a ser, duramente atingidos.
Neste quadro, vir afirmar que, apesar de alguns sinais positivos publicados pelo INE, de saudar naturalmente, a crise está no fim, parece-me que excede o que entendo ser dever das lideranças, criar confiança e optimismo, porque as pessoas têm que “sentir” que essa confiança e optimismo são realistas e, nas actuais circunstâncias, não me parece que o sintam. Podem ter, até, um perverso efeito contrário, aumentar a desconfiança e o pessimismo.
Como sempre digo, os políticos, convencem-se que a realidade é a projecção dos seus desejos.

PPR - Pobres Pensões e Reformas

O JN publica hoje um estudo muito interessante sobre o valor das pensões dos reformados com base nos dados da Segurança Social. Os dados disponibilizados mostram, por um lado, o volume do problema dos baixos valores médios e, por outro lado, a assimetria na sua distribuição.
Segundo os critérios mais utilizados existem em Portugal cerca de 1,8 milhões de pobres, ou seja, com rendimento inferior a 360 €, o limiar de pobreza, e, curiosamente, o mesmo número de pensionistas. Vejamos alguns dos dados. O valor médio das pensões é de 385 € e só Lisboa e Setúbal apresentam valores médios acima do salário mínimo nacional, 450 €. A assimetria é fortemente evidenciada pelo facto de a pensão média mais a baixa, a de Bragança, ser de 272 € e a mais alta, a de Lisboa, ser de 504 €. Só quatro concelhos, Lisboa, Setúbal, Porto e Aveiro apresentam valores médios das pensões acima do limiar de pobreza.
Estes dados são, deveriam ser, um dos eixos centrais de qualquer conjunto de políticas que verdadeiramente se orientem para o desenvolvimento e bem-estar das pessoas. O país vive e vai viver até Outubro num clima de campanha eleitoral e, de uma forma geral, os verdadeiros problemas das pessoas, os retratados no trabalho do JN por exemplo, andarão, provavelmente, ausentes das preocupações e presentes na retórica que nos submerge. Um país com este retrato não pode, obviamente, ser um país desenvolvido. A par do desemprego, embora desejemos acreditar que o desemprego é mais conjuntural enquanto a pobreza e baixo valor das pensões parece estrutural, este universo é a urgência das urgências.

UM MUNDO SEMPRE COM SOL

O Expresso deste fim-de-semana traz na Única um trabalho muito interessante sobre o sonho e a utopia. Os pragmáticos e ultra-liberais acharão, certamente, uma perda de tempo, mas o trabalho é, de facto, estimulante. Trago aqui apenas uma pequena referência, foram ouvidas algumas crianças entre os cinco e os dez anos sobre os seus sonhos. Registei o do Manuel, seis anos, “no meu mundo haveria sempre sol”. Sobretudo aos que leram todo o trabalho pode parecer estranho esta escolha, mas a ideia de um mundo sempre com sol afirmada por um miúdo de seis anos é, para mim, A Utopia, com toda a energia propulsora que têm, ainda, as utopias.
Já uma vez aqui referi que na minha primeira viagem a Moçambique, há já alguns anos, encontrei pessoas que, como disse, pareciam tão pobres que nem sonhos acreditavam poder comprar. Gente que vive sem sol, sem aconchego, sem algo que lhes ilumine a alma e o futuro. Muitos putos que andam, por vezes, bem perto de nós, mesmo sem estarem naquele estado de pobreza, vivem também em mundos sem sol.
O Manuel está certo, se for ele a construir o mundo, vai haver sempre sol, para todos.

domingo, 28 de junho de 2009

PROTECTOR SOLAR

Em matéria de protecção e segurança infantil Portugal ainda tem um caminho grande a percorrer, sendo um dos países com mais acidente com crianças, os acidentes rodoviários são os mais frequentes. A imprensa de hoje chama a atenção para os milhares de crianças que nas próximas semanas serão amontoadas em autocarros e despejadas nas praias no âmbito dos programas de férias e de ocupação de tempos livres. A Associação para a Promoção da Segurança Infantil exprime a sua preocupação com a segurança no transporte de muitas delas, provavelmente a maioria. É também referido que a enorme pressão dos pais sobre as instituições leva a que seja descurada a segurança pois estas não possuem veículos adequados em número suficiente. Finalmente e no que respeita à fiscalização é contada uma história fantástica. Num autocarro em que a GNR procedia à fiscalização, um senhor agente perguntou à miudagem o que era necessário para ir em segurança para a praia, a resposta em uníssono e naquele tom típico dos gaiatos foi “protector solar”. Notável.
Esta resposta ingénua evidencia o quanto de pequeno começa uma espécie de enviesamento de prioridades tão presente nos nosso tempos. Não temos muitos recursos mas usamo-los no acessório e não no essencial. Mais do que ser importa parecer, o embrulho é mais importante que o conteúdo. Para se ser é preciso ter e, claro, se não tens não és. Carpem diem.
Daqui a anos, alguns destes meninos ainda vão aprender que se forem ao solário podem mostrar aquele invejável bronze que põe os outros a invejar a estadia, imaginam, numa praia de sonho, em que, obviamente, passamos “montes” de dias.

TIRARAM-ME O DR. CANAS

De há uns dias para cá sempre que lia os jornais ou via noticiários televisivos debatia-me com a vaga sensação de que me faltava qualquer coisa, um “je ne sai quoi”, que não entendia. Procurava recuperar as rotinas de preparação, verificava o kit de sobrevivência, um saco de pastilhas para a paciência, o comando à mão, a embalagem de Vomidrine, o dicionário, não vá aparecer alguém a eruditar, dois ou três palavrões prontos a saltar, enfim, o básico, mas nada. Continuava com a mesma sensação de que algo me faltava. Hoje, de repente, ao ouvir o porta-voz do PS sobre a decisão do Presidente sobre a data das eleições, fez-se luz, faltava-me o Canas, sim o Dr. Vitalino Canas. De facto, eu tinha lido há uns dias que o porta-voz do PS passaria a ser João Tiago Silveira, o Dr. Canas terá sido uma das vítimas das europeias, mas passou-me de todo. É verdade, tiraram-me o Canas. Não percebo muito bem porque é que se muda um porta-voz. Trata-se de alguém que porta a voz de outro alguém que não a sua e o Dr. Canas, talvez com a concorrência do Dr. José Lello e do Dr. Santos Silva, era um homem que portava como ninguém his master’s voice, perdão a voz do PS. Não, sem o Dr. Canas nada será como dantes, a lucidez e profundidade dos seus comentários permanecerão insubstituíveis. Difícil tarefa a do Dr. João Tiago Silveira.

sábado, 27 de junho de 2009

FELIZMENTE HÁ IDEOLOGIA E VALORES

A semana passada as águas agitaram-se com o Manifesto dos Iluminados, os 28 economistas que, como faróis que se assumem, vieram iluminar o que entendem ser o caminho a seguir em matéria de economia. A vigésima nona iluminada do grupo, a Dra. Ferreira Leite, numa tirada à Pacheco Pereira, veio afirmar que “é o que ando dizer há muito tempo”, claro, génios é assim. E toda a gente ficou impressionada. Nestas ocasiões lembro-me da famosa expressão de Clemenceau, “a guerra é algo importante demais para ficar na mão dos generais”. Pois é, a economia é importante demais para ficar na mão dos economistas, veja-se a crise económica e financeira que atravessamos ligada a políticas que os iluminados sempre subscreveram, a égide do deus mercado. Merece, pois, registo a tomada de posição de um grupo de pessoas também muitas ligadas à economia, mas também às ciências sociais, que, estando sobretudo no meio académico, estão menos permeáveis ao poder político, aos outros poderes e à protecção do Santo Mercado. Sublinham a prioridade à questão do desemprego, explicando e justificando esta opção.
Finalmente, parece-me ainda de sublinhar que, contrariamente ao que se quer fazer crer, a ideologia e valores, não se esbatem ou, pior, não se substituem por saberes e instrumentos supostamente neutros, inquestionáveis e definitivos.
Não, não é tudo a mesma coisa e o Mercado não pode determinar a nossa vida.

TEMPO

Uma das coisas que mais gosto no meu Alentejo é a diferença na relação com o tempo, quando comparada com a urgência dos outros dias. O tempo, para a maioria de nós, é um bem escasso, aliás, como outros bens. No meu Alentejo o tempo não parece tão escasso. Hoje um jantar com amigos no meu Alentejo mostrou isso mesmo, o tempo deu para tudo. Misturou-se as viagens com os ovos em tomatada com sabor de funcho, misturou-se as lérias com um belo tinto. Falou-se da África, das suas pessoas, das suas misérias e das suas muitas grandezas. Entre um queijinho e a meloa deu para conversar sobre a vida da gente e da gente com vida. E deu, sobretudo, para apreciar a magia dos putos felizes, no caso a Leonor, nove meses de gente e uma boa disposição muito, mas muito maior que ela.
Eu acho que é de ter tempo e de ter gente com tempo à volta dela. É assim o meu Alentejo.

sexta-feira, 26 de junho de 2009

ONDE É QUE TENHO O VOMIDRINE?

Desde pequeno que convivo com um problema que não sendo muito grave é o que se pode chamar um problema chato, enjoo com facilidade. Em miúdo saía de carro e cinco minutos depois já tinha o estômago às voltas. Fui convivendo com isto e em adulto, com alguma frequência, ainda me acontece o mesmo desde que não seja eu a conduzir. Resisto melhor nas viagens de avião, se a turbulência não for demais, de barco está fora de questão. O Vomidrine é o meu mais inseparável bem de viagem. No entanto, de há algum tempo atrás a situação tem-se agravado. O meu desconforto já não está basicamente ligado às viagens de carro mas, cada vez mais, às viagens pela realidade do nosso cantinho através da imprensa. Deixo alguns exemplos das últimas horas, o despudorado exemplo da substituição do Provedor de Justiça, os prémios de gestão dos administradores do BCP, as andanças do caso Freeport, a história da Fundação para as Comunicações Móveis, o ex-futuro negócio da PT com a Media Capital em que a suspeita se levanta com o futuro negócio mas que também se alimenta quando passa a ex., a afirmação da Dra. Ferreira Leite de que Santana Lopes é um exemplo democrático para os militantes do PSD, a novela sobre os estilos do Engenheiro, a Dra. Ferreira Leite a clamar que rasga e rompe com tudo o que está a ser feito pelo governo, o TGV de que a oposição contestava a construção e que também contesta, pelos eventuais custos, o adiamento, a cacofonia em que se transformou o debate político substituindo o essencial pelo acessório, a ideia pelo insulto, etc.
Onde é que eu guardei o Vomidrine? Estou mesmo a precisar.

ÉS EXCELENTE MAS JÁ NÃO CABES

Retorno a algum discurso que já aqui tenho afirmado sobre a questão da avaliação de professores e dos equívocos gerados. Em primeiro lugar deve sublinhar-se a imprescindível existência de avaliação, ferramenta insubstituível na promoção da qualidade.
O modelo imposto em Portugal, decorrente de um pecado original no Estatuto da Carreira Docente, a divisão dos professores em titulares e outros, está ferido de uma insanável contradição agora exposta pelo estudo da Deloitte, querer defender e promover o mérito e, simultaneamente, definir quotas para a excelência. Mais uma vez vejamos, Se um qualquer profissional, à luz dos critérios, sejam quais forem, que avaliam a qualidade do seu desempenho, merecer uma avaliação de excelente, tem, necessariamente, de obter esse patamar, dizer-lhe que é excelente mas já não cabe na quota é atacar o mérito e incentivar a desmotivação. O problema, como é óbvio, deve-se ao facto do ME ter colado, erradamente, a avaliação à progressão na carreira. Já disse e repito, que a progressão na carreira se deve fazer por concursos com critérios transparentes, entre os quais, obviamente a avaliação de desempenho ou seja, quando vários professores concorrerem a patamares acima na carreira os que melhor desempenho tiverem, terão, naturalmente, mais probabilidades de progredirem. Parece simples. O resto é manha política e incompetência.
PS - Afinal, em mais uma "simplexificação" típica do desnorte e incompetência, as quotas podem ser transitórias. A justificação é algo de ininteligível e, claramente, colada à agenda política. A PEC - Política Educativa em Curso, ao seu melhor nível.

A MÁQUINA DE RECICLAR PALAVRAS

Como é sabido, tudo o que é muito usado acaba por se ir gastando e, por vezes, deteriorando de tal forma que precisa de se substituir. É o caso das palavras, como toda a gente precisa das palavras para comunicar, muitas delas de tanta utilização alteram-se e, às vezes, ficam num estado que já nem conseguimos perceber o que elas queriam dizer quando foram construídas.
Uma vez, um Homem Inventor, muito inteligente, e que tinha inventado muitas máquinas fantásticas que ajudaram os outros homens em diferentes aspectos, pensou que poderia ser muito útil inventar uma máquina para reciclar palavras. Essa máquina, se ele a conseguisse inventar teria várias vantagens. Uma, a principal, é que tornaria mais fácil que as pessoas se entendessem, as palavras voltavam ter o mesmo sentido e valor para que foram criadas. Outra vantagem, também importante, é que dispensaria que se construíssem novas palavras para substituir o sentido e valor perdido pelas originais. Com isto na cabeça e no desejo começou o trabalho de inventar a máquina de reciclar palavras.
A tarefa já dura há muitos anos e o Homem Inventor, já velho, muito velho, ainda não conseguiu que a máquina reciclasse a primeira palavra. Eu acho que ele escolheu mal, começou por tentar reciclar a palavra “solidariedade”.

quinta-feira, 25 de junho de 2009

O EQUÍVOCO

A Dra. Manuela Ferreira Leite, ao comentar as afirmações de Jorge Miranda sobre a atitude do PSD no caso da eleição parlamentar do Provedor de Justiça afirma que, em democracia é impróprio alguém "rebelar-se quanto ao resultado de uma votação". A afirmação parece correcta na forma mas enferma de um enorme equívoco. As votações na Assembleia da República não são votações “democráticas”, são votações “partidocráticas”, os deputados, na sua esmagadora maioria, são uns yes man sem consciência própria que, esquecendo que são mandatados pelo povo, carregam no botãozinho que o chefe mandar. É exactamente por assim acontecer que a credibilidade e confiança nos políticos bateu no fundo, os cidadãos se afastam da participação cívica. Este lamentável episódio da substituição do Provedor de Justiça é apenas mais um exemplo.

O COMPUTADOR É APENAS UM LÁPIS MAIS SOFISTICADO

A utilização das novas tecnologias na educação, designadamente, na sala de aula e em particular com os alunos mais novos, tem sido objecto de muitas abordagens. Em Portugal com o Programa Magalhães a discussão tem sido enorme e, nas mais das vezes, centrada no acessório, a política do Portugal dos pequeninos, e não no essencial, qual o papel do computador na sala de aula. A propósito da apreciação de Don Tapscott algumas notas em estilo telegráfico.
1 – O contacto precoce com as novas tecnologias é, por princípio, uma experiência positiva para os miúdos, para todos os miúdos, se considerarmos o mundo em que vivemos e no qual eles se estão a preparar para viver. Nós adultos estamos a pagar um preço elevado pela iliteracia, os nossos miúdos não devem correr o risco da iliteracia informática.
2 – O Programa Magalhães é, do ponto de vista expresso acima, uma boa medida. Tem erros, tem propaganda política, tem marketing, tem isso tudo mas, creio, o princípio é positivo.
3 – O computador na sala de aula é mais uma ferramenta, não é A ferramenta, não substitui a escrita manual, não substitui a aprendizagem do cálculo, não substitui coisa nenhuma, é “apenas” mais um meio ao dispor de alunos e professores para ensinar e aprender. Em termos provocatórios, por vezes afirmo que o computador é apenas um lápis mais sofisticado.
4 – É preciso evitar o deslumbramento provinciano do novo-riquismo com as novas tecnologias, reafirmo, são apenas ferramentas que a evolução nos disponibiliza e não algo que nos domina e é visto como a panaceia, quase como Don Tapscott afirma.
5 – O que dá qualidade e eficácia aos materiais e instrumentos que se utilizam na sala de aula não é a tanto a sua natureza mas, sobretudo, a sua utilização. Posso ter um computador para fazer todos os dias a mesma tarefa, da mesma maneira, sobre o mesmo tema, etc. Rapidamente se atinge a desmotivação e ineficácia, é a utilização adequada que potencia o efeito as capacidades dos materiais e dispositivos.
6 – Para além de garantir o acesso dos miúdos aos materiais é fundamental disponibilizar a formação e apoio ajustados aos professores sem os quais se compromete a qualidade do trabalho a desenvolver.
7 – Finalmente, como em todas as áreas, é imprescindível avaliar o trabalho realizado, única forma de garantira a sua qualidade.

A CARTA DA SETÔRA LEONOR

No átrio da escola um dia depois do último exame vinha o Vítor mais uns colegas de turma do 9º C. Cruzaram-se com o Professor Velho, o que está na biblioteca e fala com os livros. Estranhando a presença deles na escola interpelou-os sobre as razões da presença.
Então, esqueceram-se de ir de férias?
Olá Velho, ninguém se esquece de ir de férias, é que a Setôra Leonor, a DT, aquela muita fixe, tinha pedido para que quem pudesse vir cá hoje falar com ela. Ela é a fixe, a gente gosta dela viemos quase todos e ela deu-nos uma carta para cada um levar. Queres ver a minha?
Se achares que posso, gostava.
Lê.
“Meu caro Vítor,
Quero dar-te os parabéns pelo trabalho que fizeste durante o ano e agradecer a ajuda que me deste para que as coisas tenham corrido bem nas aulas. Aconteceram algumas coisitas, sabes quais, mas agora nem vale a pena falar disso. Quero também que dês os parabéns aos teus pais pelo resultado da ajuda e preocupação que te deram e tiveram contigo. Agradece-lhes também, por mim, a ajuda que me deram. Agora vais de férias e é bom que te divirtas. Acho que já não vou ser tua professora mas espero ver-te em Setembro. Escolhe bem o caminho que queres fazer porque, embora vás ter gente a ajudar-te, não podes esquecer, é o teu caminho.
Gostei de te conhecer. Boas férias.
Leonor”
Tens razão Vítor, a Setôra Leonor é fixe.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

EXERCÍCIOS DE CONTABILIDADE

Na partidocracia instalada estamos habituados a que as lideranças partidárias pautem os seus discursos e práticas políticas pelos “interesses partidários de ocasião”, embora sempre mascarados pelos supremos interesses das comunidades, ou seja, do país. Esta discussão em torno das datas para as eleições é só um exemplo, mais um, da gestão dos interesses partidários, avaliando-se, sobretudo, que efeitos para a contabilidade eleitoral de cada um dos partidos poderá ter a realização separada ou conjunta das legislativas e autárquicas. Pode entender-se os partidos assumem projectos de poder a que se chega, felizmente, através do voto, mas seria mais saudável se os discursos fossem sérios e mais transparentes.
Como é evidente, a realização conjunta das eleições não “põe em causa” a democracia, como diz a Dra. Manuela Ferreira Leite. O que põe em causa a democracia é o facto das lideranças partidárias terem promovido modelos de organização política e práticas de funcionamento que inibem a participação cívica dos cidadãos fora dos aparelhos e lógicas partidárias, ou seja, como já tenho referido, o facto de os partidos que deveriam ser eixos fundamentais da democracia se terem transformado em donos da democracia.

AS PREVISÕES E A CONFIANÇA

Os analistas da área da economia, tal como em outras áreas, são sempre excelentes a fazer prognósticos no fim do jogo. Gostava de não afirmar isto, mas não é fácil encontrar estudos ou análises que tenham previsto os contornos e profundidade da crise financeira e económica que atravessamos. Cá no jardim apareceram agora 28 iluminados a pretenderem iluminar com a sua luz o nosso destino no que respeita à política em matéria de economia. Curiosamente, um bom número deles desempenhou cargos de governação em sucessivos elencos com o excelente resultado que agora conhecemos. De novo, o estranho sindroma dos ex-governantes que sabem sempre o que fazer depois de saírem do governo, enquanto lá estiveram notámos pouco a sua altíssima capacidade.
À luz deste quadro vou fazer um enorme esforço para acreditar que estas previsões da OCDE, segundo as quais ainda não batemos no fundo, estejam erradas. Por uma vez, os meus desejos poderiam ser a realidade.
A divulgação sistemática de previsões negativas, mesmo que sustentadas, tem o efeito de promover um ambiente de falta de confiança e optimismo que contamina os projectos individuais e colectivos. Por outro lado, previsões excessivamente optimistas também nos fazem duvidar e, também assim, perder a confiança pela dúvida que levantam.
A confiança será nesta altura um dos maiores bens e, simultaneamente, a melhor ferramenta para lidar com os “amanhãs que choram” ou com os “amanhãs que cantam”, dependendo das perspectivas. As lideranças políticas mais eficazes serão as que melhor nos devolverem esse bem e essa arma.

HISTÓRIA DO ACHISTA

Como se trata de uma história começa assim, era uma vez uma terra muito engraçada. É uma terra com gente muito boa e muito divertida. Um dos maiores divertimentos das pessoas daquela terra é acharem. Eu explico, a maioria as pessoas estão convencidas de que sabem alguma coisa sobre quase tudo e então manifestam as suas opiniões que, na maioria das vezes, não passam disso mesmo, opiniões porque não têm conhecimento suficiente sobre as matérias de que falam. De forma quase absoluta começam as suas frases por um “Eu acho ..” entoado de forma definitiva, alguns até reforçam o “Eu acho” com um popular “Cá p’ra mim”. De entre todos, distingue-se uma das pessoas lá da terra, até lhe chamam o Achista, é o maior dos opinadores. Não há um tema, dos mais simples aos mais sofisticados, sobre o qual o Achista não …ache, claro. Participa em todos os debates que se organizem sobre qualquer matéria, fala, acha, com o maior dos à vontade em qualquer circunstância, sempre com um ar de tal forma sério e convincente que ninguém se atreve a discutir os seus achismos. Ao fim e ao cabo estamos a falar de um Achista. Com o tempo acabou mesmo por se tornar num respeitado Achista, autor até de livros bem sucedidos onde divulga os seus achismos.
Se estiverem minimamente atentos poderão reconhecê-lo num jornal ou televisão perto de si, há sempre um Achista, apenas mudam os apelidos.

terça-feira, 23 de junho de 2009

SERÁ ELOGIO?

Por este ano, esta será, provavelmente, a última referência aos exames aqui produzida. E para finalizar, creio que fica bem uma palavra de contentamento e partilha com a Senhora Ministra. É verdade, a Senhora Ministra exprimiu hoje uma palavra de satisfação com a “normalidade” com que decorreu a época de exames, sublinhando “o profissionalismo” de todos os envolvidos, professores, escolas, serviços do ME e outras entidades, que presumo poderem englobar as forças policiais que transportam os exames, os mecânicos que cuidam dos carros das forças policiais que transportam os exames, os funcionários das bombas de combustível que abastecem os carros das forças policiais que transportam os exames, enfim, toda a gente sem a qual a operação exames não teria corrido com “normalidade” e “profissionalismo”.
É muito importante e significativa esta palavra da Senhora Ministra. Como é sabido, somos um país onde as coisas não correm com “normalidade”, os exames raramente se fazem em condições de “normalidade”, os professores e as escolas revelam, habitualmente, pouco “profissionalismo” e “normalidade" no seu desempenho, contribuindo para a turbulência e caos que sempre acontecem nesta época. O mesmo se pode dizer de todas as outras entidades envolvidas cuja falta de “profissionalismo” e funcionamento com “normalidade” é por demais conhecido. Por tudo isto, um grande bem-haja à Senhora Ministra por esta palavra de reconhecimento, chegámos, graças certamente ao mérito da liderança da 5 de Outubro, ao tempo da “normalidade” e do “profissionalismo”.
Porque será que existem elogios que parecem insultos?

ENGANARAM-ME

(Foto de Jorge Alfar)

Vida? Qual vida?
Futuro? Qual futuro?
Caminho? Qual caminho? Por onde? Para onde?
Ser? O quê?
Gostam de mim? Deixaram-me só.
E tu? Também partiste. Porquê? Tinhas prometido que ficávamos sempre juntos.
Enganaram-me, todos. Só me falaram de certezas e apenas me deixaram as dúvidas.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

"DEMASIADO ELEMENTAR" OU "ADEQUADO"?

Assim não vale. Sou um cidadão comum interessado nos problemas da comunidade e gosto de me sentir esclarecido em matérias que não domino. Nesse sentido, espero que os especialistas nessas matérias me ajudem nesse processo de esclarecimento. Vem esta introdução a propósito do filme que, de há uns anos para cá e chegando a época de exames estreia sempre com assinalável impacto, refiro-me ao filme “A Facilidade dos exames”. De uma forma, para mim estranha e frequentemente, já aqui o disse, desrespeitadora do trabalho de alunos e professores a apropriação dos resultados dos alunos, advenham eles do eventual “facilitismo” ou da real competência, ou falta dela, dos alunos parece mais obedecer a uma qualquer agenda política dos muitos actores envolvidos do que a uma verdadeira e esclarecedora leitura e interpretação.
Veja-se o exemplo do exame de hoje, o de Matemática. A Associação dos Professores de Matemática afirma que o exame está “adequado”. Se atentarmos na Sociedade Portuguesa de Matemática liderada pelo Génio Crato, o exame “é de novo demasiado elementar”. Em que ficamos? Adequado? Demasiado elementar? Eu não sei avaliar o grau de dificuldade do exame, mas sou capaz de avaliar que estas discrepâncias estão para além da matemática e do seu conhecimento.
Alguém pode ajudar a entender?

FÉRIAS

Depois do último exame é cíclico e natural, Quando as aulas chegam ao fim começa o problema das férias, ou seja, substitui-se a preocupação com o trabalho e instala-se a preocupação com o descanso, numa curiosa alternância. Num tempo em que cada vez menos podemos recorrer à rede familiar para a guarda dos miúdos, assiste-se ao desenvolvimento de uma oferta sem fim que, com custos maiores ou menores e de iniciativa pública e privada, nos é disponibilizada. Para tentar ajudar nas escolhas dos pais, aqui ficam algumas sugestões, numa versão minimalista.
Pois temos a oferta de praia, com banho incluído, boné e lanche. Os meninos farão construções na areia e jogos próprios da praia incluindo barulho e levantar areia para cima da vizinhança. Para experiências mais radicais pode optar-se por experiências envolvendo acampamentos, actividades de ar livre, do tipo brincar aos cowboys, (lembram-se?), orientação e percursos pedestres, observação da natureza e assim.
Para os pais mais preocupados com o choque tecnológico os meninos têm à sua disposição ciber-campos e podem potenciar o seu gosto pelas novas tecnologias com ensinamentos sobre informática. Quanto aos meninos com veia artística, pois poderão frequentar “ateliers” e “oficinas” da mais variada natureza, música, pintura, modelagem, escultura, teatro, fantoches, canto, etc. Numa perspectiva mais cultural os nossos filhos podem sempre recorrer a programas de férias envolvendo visitas a museus e exposições onde se aperceberão da obra dos grandes mestres.
O ideal seria mesmo que os miúdos pudessem passar por tudo isto nas suas férias. Muito provavelmente chegariam ao fim a suspirar pelo início das aulas para descansar um pouco e a achar bem mais leve o trabalho que o descanso.
Boas férias!

HISTÓRIA DO MIÚDO QUE NÃO PASSOU

Um dia destes, mesmo à beira das aulas acabarem, o Professor Velho, aquele que está na biblioteca e fala com os livros, encontrou o João no pátio da escola assim com uma cara meio aborrecida. Estranhou, porque ele anda sempre a rir e interpelou-o no sentido de saber se alguma coisa não estava bem.
É verdade Velho, estou assim um bocado chateado, a DT disse-me que não deveria passar, agora tenho que dizer ao meu pai e, se calhar, não vai correr bem.
Percebo que estejas chateado, mas terás que pensar no que é que não correu bem.
Esse é que é o problema, estou um bocado perdido e sem saber o que vou fazer para o ano.
Porquê João?
Velho, os setôres dizem-me que estou distraído nas aulas, falo muito, às vezes não faço os trabalhos de casa, sou um bocado preguiçoso, não sou muito organizado, sou descuidado, baralho facilmente as tarefas que tenho que fazer, não me esforço o que devia e mais coisas. O meu pai diz-me que sou um “cabeça no ar”, não faço nada de jeito, passo o tempo na playstation e no computador, estudo pouco, nunca mais cresço e mais coisas. A minha mãe diz-me que deveria ser como a minha irmã, passa sempre, ser arrumado, andar só com os colegas que são bons alunos, para descansar mais para poder estudar melhor e mais coisas. A minha avó diz que eu assim não vou ser ninguém, não vou aprender nenhuma profissão, que vou ter uma vida má e mais coisas. Estás a ver Velho? Estou mesmo um bocado aflito, como é que eu vou mudar isto tudo, não achas muita coisa?

domingo, 21 de junho de 2009

EXCESSO DE ZELO? NÃO, É MESMO INCOMPETÊNCIA

Ouve-se e não se acredita. Há minutos, a RTP1 informou que, contrariando a legislação nacional, internacional e a prática da própria TAP, o Comandante de um avião que realizaria um voo Paris – Lisboa impediu Carlos Lopes, um conhecido e muito premiado atleta paralímpico de embarcar porque, sendo cego e viajando com o seu cão-guia, este teria de usar açaimo dentro da cabina. Curiosamente, Carlos Lopes participou há algum tempo num trabalho de natureza publicitário mostrando como a TAP é uma companhia atenta aos problemas das pessoas com deficiência, sendo filmado a bordo de um avião com o seu cão-guia, sem açaimo, claro.
O porta-voz da companhia veio dizer que se tratou de um excesso de zelo. E que tal considerar incompetência, ignorância e, também, intolerância?

SERÁ DO CALOR?

Um olhar ligeiro sobre a imprensa de hoje deixou-me algumas perplexidades. Não pelas referências aos filmes em exibição em qualquer media perto de si, “Os estilos do Engenheiro”, “A grande crise”, “O diário de Cristiano Ronaldo” ou “O pequeno Martim e a sua pequena mãe”, mas por algumas soltas, como se costuma dizer, que são, parecem, estranhas. Sem hierarquizar reparem.
Em Maio baixou de 8,4% as visitas dos portugueses aos Centros Comerciais. Mas que está a acontecer? A fugir dos Centros Comerciais? Para onde estarão as famílias portuguesas a ir, sobretudo nas tardes do fim-de-semana? Não se entende, temperatura sempre simpática, montes de montras onde se vê tudo o que queremos e a que não chegamos, entretenimento para os miúdos e para os olhos dos papás, banquinhos para o descanso dos mais velhos, etc. Será que estamos a ficar exigentes e já nem o Dolce Vita nos garante a dolce vita?
Um professor, membro de uma Comissão de Protecção de Crianças e Jovens, está acusado de abuso sexual sobre um adolescente por si tutelado. Professor de gente nova? Protector de gente nova? Abusador de gente nova? Que raio de confusão de papéis!
Um homem descrito pelos vizinhos como “bom rapaz, pacífico, educado e trabalhador” enfiou quatro tiros na mulher e na filha. Tratar-se-á de outra mudança de estilo, aqui no sentido inverso, do português suave ao animal feroz?
Francisco Louçã, em entrevista ao CM, afirma estar a disputar as eleições para formar governo e ser Primeiro-ministro. Não deu para perceber, mas parece que disse isto sem se rir.
Como parece um bocadinho cedo para a silly season será do calor ou o mundo anda mesmo esquisito?

sábado, 20 de junho de 2009

POBRES PUTOS POBRES

O JN cita hoje um estudo da Fundação Europeia para a Ciência que, utilizando dados oficiais da União Europeia, (A.C. – Antes da Crise, 2006), conclui que em Portugal, uma em cinco crianças em Portugal é pobre, 39 % vivem com constrangimentos financeiros e que os diversos apoios apenas conseguem eliminar a taxa de pobreza em um quinto do seu valor. O estudo é diferenciado, considera várias dimensões do bem-estar das crianças e no que respeita à Educação os resultados são ainda mais preocupantes, ocupamos a 27ª posição em 29 países. Na média de Bem-estar geral ocupamos a 21ª, a mesma que na Saúde e Condições Materiais. Na Prevenção de Risco conseguimos estar nos dez primeiros o que é positivo. Este quadro é, deveria ser, a base de um eixo fundamental das políticas nacionais.
O investimento no sentido de alterar este quadro é, obviamente, um investimento no futuro. No entanto, continuamos com políticas que dificilmente combatem as enormes disparidades entre os “favorecidos” e os “desfavorecidos, assistimos ao desenvolvimento de discursos políticos e práticas políticas de natureza liberal cada vez mais agressivas, minimizando ou desvalorizando a necessidade de políticas sociais e depositando no mercado a gestão da equidade de oportunidades, modelo falhado e gerador de pobreza.
Como gosto de manter algum optimismo, pode ser que a actual crise e os seus devastadores efeitos possam ser, como dizem os políticos, uma janela de oportunidade para repensar os modelos de desenvolvimento e a imprescindibilidade de políticas sociais consistentes e eficazes.

OS SALTOS DOS COELHOS

Era uma vez uma terra onde havia muitos coelhos. Lá naquela terra tinham decidido que todos os coelhos deveriam aprender a dar saltos e arranjaram uns mestres de salto para ensinar os coelhos a saltar. A certa altura, para ter uma ideia se os coelhos já sabiam dar bons saltos mandaram que todos, no mesmo dia, dessem um salto com um comprimento que determinaram. A grande maioria dos coelhos saltou aquele comprimento, uns mais à vontade que outros. Estranhamente, em vez de felicitarem os coelhos que saltaram e tentar perceber porque é que alguns não tinham sido capazes, desataram todos a discutir em grande algazarra. Uns clamavam que o salto era muito curto e por isso muitos coelhos tinha saltado, outros achavam que o comprimento estava adequado e era normal haver alguns coelhos que não saltem bem, outros achavam que tinham preparado bem o terreno para que os saltos corressem bem, outros ainda achavam que o trabalho dos mestres de saltos tinha sido bom e por isso a maioria saltou. Por outro lado, ainda havia alguns que achavam o contrário, os mestres de saltos não eram assim tão bons e, por isso, alguns coelhos não conseguiram saltar.
Fartos de ouvir esta confusão os coelhos não percebiam muito bem porque é sendo eles a dar os saltos, toda a gente falava do salto e ninguém ligava aos saltadores.
Parece que estou a falar das provas aferidas mas não, é mesmo dos saltos dos coelhos.

sexta-feira, 19 de junho de 2009

ENTRE O MODELO E O SIMPLEX

Lembram-se? No início era o Modelo. Bem feito, à prova de falha, funcional, de excelente qualidade, é sabido que os chilenos são bons nisto de avaliar professores. Tinha assim um bocadinho de burocracia a mais, grelhas sem fim, exigia um tempo assustador, colocava professores a avaliar professores de áreas com as quais não tinham o mínimo de afinidade, observava-se um número razoável de aulas, levava-se em conta o sucesso dos alunos e tudo. Vá lá saber-se porquê a malandragem dos professores protestou, é certo que foram poucos, à volta dos 100 000, por mais de uma vez. O ME, num gesto de magnanimidade e capacidade de diálogo, repensou e montou o Simplex, ou seja, o Modelo simplificado, de tal maneira simplificado que já não é Modelo, longe disso, ou melhor, transformou-se mesmo num modelo do que não deve ser feito em matéria de política educativa. Reparem que, de tão simplificado, é possível avaliar um professor sem saber como dá aulas, embora, convenhamos que esta coisa de dar aulas na vida profissional de um professor é apenas uma minudência que dispensa sem problemas a avaliação.
E quando se pensava que as coisas evoluiriam no sentido de, finalmente, se avançar para um dispositivo de avaliação eficaz e exequível, eis senão quando, o ME oscila entre o Simplex e o Modelo, ou seja, entre o mau e o péssimo.
Deve ser isto a que se chama coerência, visão, estratégia e rumo sem alteração. Ou então, se calhar, é mesmo só incompetência e manha política.

MÃES PRECOCES

De acordo com um trabalho de hoje do DN, em 2008 verificaram-se 7000 gravidezes entre adolescentes que resultaram em 5800 partos. Embora se registe uma diminuição, Portugal continua a ser um dos países da Europa com mais alta taxa de gravidez na adolescência. Tal facto, evidencia a atenção que esta situação deveria receber. No entanto, ainda há pouco tempo tivemos uma enorme discussão pública sobre a distribuição de preservativos nas escolas e foi possível a perceber a grande disparidade e diferenças de ponto de vista sobre a questão. Embora nestas matérias, como em todas as que dizem respeito à vida das pessoas, se deva considerar o universo de valores em presença, bem diferentes, é fundamental não esquecer as consequências devastadoras e dramáticas que a maternidade adolescente pode implicar, veja-se o caso em “exibição” numa televisão perto de si da mãe Ana Rita de 15 anos em greve de fome pelo direito a ficar com o Martim nascido quando ela tinha 13 e que um tribunal decidiu encaminhar para adopção. Sabemos, a experiência mostra, que uma adolescente pode revelar-se uma excelente mãe, tanto quanto uma mulher madura pode ser uma péssima mãe. Não podemos, nem devemos, promover avaliações prévias de competências maternais, a ética e a moral impedi-lo-iam, mas podemos combater discursos hipócritas sobre a educação em matéria de sexualidade e comportamentos de risco. Estes discursos alimentam a manutenção de situações que promovem em adolescentes, muitas vezes sem projecto de vida, um caminho e uma experiência para a qual não estão preparadas nem desejam, e promotora de sofrimento para todas as pessoas envolvidas, a começar, obviamente por uma criança, que sem ser ouvida, entra a sofrer neste mundo.

UM HOMEM COM UM NOME ESTRANHO

Era uma vez um Homem que tinha um nome estranho. Era um Homem sempre cheio de incertezas, nunca sabia muito bem o que deveria pensar, tinha imensas dúvidas sobre o que fazer. Estava permanentemente a interrogar-se se aquele seria o melhor caminho, se seria a melhor decisão e, muitas vezes, acabava por não se resolver e ficava, como que a olhar para dentro e a pensar tudo, de novo, sempre com enorme dificuldade de sair do ponto em que estava.
As pessoas que conheciam o Homem sentiam vontade de o ajudar naquela labuta de se entender a si próprio, mas também sentiam grande dificuldade nessa tentativa porque, de facto, não era muito fácil perceber em quê, como e por onde poderia ser útil o seu contributo e, também essas pessoas, acabavam por se sentir bloqueadas e sem saber como proceder para sair daquela situação.
Agora me lembro, não vos disse o nome do Homem. Chama-se Labirinto e, como sabem, na nossa vida não é nada fácil entendermo-nos com labirintos.

quinta-feira, 18 de junho de 2009

NÃO SE ESQUEÇAM DO TRABALHO DE MIÚDOS E PROFESSORES

Sou dos que entendem como positiva a realização de provas de âmbito nacional que possam aferir o nível de competências dos alunos e, simultaneamente, fornecer um indicador de eficácia do sistema, tanto mais justificado quanto mais autonomia as escolas possuam. Lamentavelmente, esse objectivo começou a ficar comprometido de há algum tempo para cá. Por um lado, insisto numa ideia que já tenho referido, temos vindo a assistir à lenta transformação da educação num terreno altamente contaminado pela mais exacerbada luta político-partidária, envolvendo as estruturas oficiais, estruturas representativas dos professores e estruturas representativas dos pais. Este cenário influencia políticas, análises e procedimentos. É neste contexto que se entende a discussão sobre a eventual excessiva facilidade das provas para promover estatísticas favoráveis ou o discurso de apropriação de resultados por parte do ME, entre outros aspectos. Por outro lado, descredibiliza perante alunos, pais e professores o trabalho realizado, precisamente pelos alunos, pelos professores e o apoio e envolvimento que muitos pais tentam providenciar. Instala-se a ideia de que não serve para nada, não mede coisa nenhuma e desvaloriza-se, assim, o esforço e trabalho de alunos e professores.
Ficaremos à espera de outras medidas da qualidade e eficácia do sistema, designadamente o trabalho realizado no âmbito de projectos como o PISA. Será que não é mesmo possível pensar que a qualidade da educação, o futuro dos miúdos e o nosso, exigiriam uma outra atitude, efectivamente preocupada com a qualidade e menos centrada nos sempre presentes interesses partidários de ocasião?

O ERRO

A comunidade agitou-se com um erro presente no exame de Biologia, pois apesar da inocuidade do erro, é um erro. Como se costuma dizer, só não erra quem não faz, é normal, o que provavelmente agita as mentes é um erro num exame e ainda por cima sob a tutela de um infalível Ministério da Educação, produtor de políticas educativas sempre certas, estas sim sem erros. O povo costuma dizer que Deus não dorme e castiga-nos. Pois é, um erro num exame da responsabilidade deste ME, parece mesmo vingança divina. Acertam sempre? Nunca se enganam? Tomem lá um errozinho para aparecer num exame e agora corrijam-no, há que ser humildes, aprendam com o Líder, um chazinho de humildade só faz é bem.
Já agora, aproveitando o balanço poderiam rever outros erros, os professores titulares, o modelo de avaliação implantado (não é a avaliação, é o modelo), o legislação sobre apoios educativos, etc.
Eruditando um pouco, como diria o meu amigo Malangatana, lembro a famosa expressão atribuída a Séneca, "errare humanum est, sed perseverare diabolicum", errar é humano, persistir é diabólico.

O ESTILO, O CONTEÚDO E A SERIEDADE

A entrevista de José Sócrates à SIC e, sobretudo, os comentários que se seguiram mostram um pouco do que é a política do Portugal dos pequeninos. Devo dizer que não sou propriamente um apoiante das políticas genericamente seguidas, sou um militante contra a partidocracia instalada, embora tenha concordâncias pontuais. O Primeiro-ministro, como qualquer pessoa nas mesmas circunstâncias, está a tirar lições, não pode deixar de o fazer, dos resultados das europeias e a procurar manter, aquilo que do seu ponto de vista, é o grande objectivo, ganhar as próximas eleições. A entrevistadora procurou perceber que eventuais alterações ou ajustamentos entenderia Sócrates promover nas suas políticas no sentido de manter esse objectivo e ele, mal ou bem, melhor ou pior, procurou responder, com um discurso cujo conteúdo não é novo mas com nuances de forma. Até aqui nada de novo. A seguir comecei a ouvir um debate na SIC-Notícias onde estavam, Graça Franco, aquele miúdo malcriado e convencido, o Ricardo Costa, um politólogo, um tal Adelino Maltez, com ar blasée com imagens disparatadas e supostamente humorísticas, Nicolau Santos e o inimitável e mítico Mário Crespo. Lamento estar a escrever isto sem ter assistido a tudo, mas não aguentei, o que mereceu especial análise foi o estilo, se de “animal feroz”, se de animal dócil, se era humilde, se era genuíno, se estava cansado, etc. num escrutínio psicológico tipo Coluna de Revista. No meio lá aparecia algum comentário mais substantivo, sobretudo de Nicolau Santos, enfim, um péssimo exemplo do que me parece dever ser análise política. É mais ou menos como pedir a um elemento da claque do Benfica para comentar um discurso de Pinto da Costa e esperar um análise lúcida. Haja seriedade.

A MINHA FILHA TOMA BANHO TODOS OS DIAS

Um dia muito comprido e cumprido, além de demasiado quente para o meu gosto, deixou-me a imaginação à beira do colapso. Por tal motivo aqui fica uma pequenina história que hoje me caiu da lembrança num evento em que participei no qual se discutia a relação entre os pais e a escola, reflectindo-se sobre os nós, os laços e os equívocos que essa relação contém.
A história foi-me contada há já alguns anos por um engraçadíssimo professor do 1º ciclo, velhote, seguramente um daqueles que estão sentados, quietos, na memória boa dos seus alunos, sempre a olhar por e para eles. Dizia então esse Mestre que a Mãe de uma sua aluna olhava indignada para a ficha trimestral de avaliação da filha que acabara de receber e zangada interpelou-o, “O Sr. Professor diz aqui que a minha filha é pouco asseada, mas ela toma banho todos os dias”. A senhora reagia ao “pouco assídua”que estava escrito na ficha.
Pois é, na relação dos pais com a escola, para além dos nós e dos laços, temos equívocos, os da linguagem, os dos papéis, os das responsabilidades e competências que tantas vezes são confundidos com culpa, as políticas educativas que enquadram esta matéria, etc.

quarta-feira, 17 de junho de 2009

AS REGRAS E OS LIMITES

O Relatório da OCDE ontem divulgado contém um conjunto importante de dados que merecem alguma reflexão mais diferenciada. Por razões de espaço, umas notas sobre o tempo excessivo que os professores gastam a “tomar conta” dos alunos e que inibe a eficácia e qualidade do trabalho de ensino propriamente dito.
Como costumo dizer, independentemente das idades, é preciso tomar conta dos alunos porque … os alunos não sabem (não querem) tomar conta de si. Isto levanta a questão central de, como na educação escolar e na educação familiar estamos a lidar com uma das “irredutíveis necessidades das crianças”, o estabelecimento de regras e limites. De facto, é minha convicção, estamos a lidar mal com o não, o que promove miúdos e adolescentes a funcionar com uma latitude excessiva face a regras e limites. No seu funcionamento diário temos assim muitas crianças e adolescentes que, conhecendo, naturalmente as regras e os limites do funcionamento, por exemplo em sala de aula, não são regulam, por si, o seu comportamento obrigando a que, permanentemente, os adultos, professores ou pais, tenham de proceder a essa regulação.
Temos, assim, que reajustar a nossa acção, com uma particular atenção à definição das regras e dos limites que, embora de forma flexível, são imprescindíveis ao bem-estar de crianças e jovens.

OS NOSSOS CANTEIROS DE FLORES

O Público de hoje, 16, traz uma interessante peça de Bárbara Wong sobre o trabalho realizado em Portugal por Javier Urra, “O Que Ocultam os Filhos, O Que Escondem os Pais” centrado no nível de transparência do diálogo pais-filhos, ou seja, a existência e a gestão de segredos entre ambos. Javier Urra também constata a existência de “dois tipos de casas em Portugal, o hotel e o lar”. O que ele chama de hotel é aquilo que eu, numa expressão que não é minha mas cujo autor não recordo, designo por um grupo de pessoas com a chave do mesmo apartamento”. Mas vamos ao “contar tudo” ou ao saber tudo”. É normal muitos pais terem a tentação de “saber tudo”o que passa nos e com os filhos. Até existem pais (mães sobretudo) que acreditam mesmo que os filhos contam tudo. Do meu ponto de vista, só por ingenuidade ou voluntarismo os pais assim podem pensar. Por outro lado, filhos “que contem tudo”, provavelmente estarão doentes. Ninguém conta tudo a ninguém, todos nós, mais crescidos ou menos crescidos, temos um canteiro algures guardado em nós com umas plantas, flores ou cactos, mais bonitas ou menos bonitas, bem cheirosas ou nem por isso, que só nós conhecemos, que são as nossas. Somos nós que cuidamos desse canteiro, que regamos, que podamos, que adubamos, que substituímos as flores. Esse canteiro é fundamental para o nosso bem-estar, embora nos possa, de quando em vez, causar algumas inquietações.
A grande e essencial questão, Javier Urra sublinha isso, é a confiança e disponibilidade para se conversar sobre o que é preciso, não sobre o tudo. Essa confiança e disponibilidade são o que nos permite entender a família como um “porto de abrigo” que nos acolhe, a todos, pais e filhos, sobretudo em momentos de mar tormentoso.

terça-feira, 16 de junho de 2009

EXAMINAR O QUÊ?

Os exames nacionais do Secundário têm cumprido nos últimos anos duas funções em simultâneo, certificar o cumprimento do Ensino Secundário e ordenar o processo de candidatura ao Ensino Superior. Sempre me pareceu uma má decisão, a certificação dos saberes do Secundário é uma tarefa do Secundário e o acesso ao Superior é uma tarefa do Superior e, portanto, deveriam estar separadas. Mas isso seria uma outra conversa. Voltando aos exames que hoje se iniciam e considerando o facto de a educação se ter transformado, também, numa arena de interesses políticos, partidários e corporativos, creio que, mais do nunca, estarão outros aspectos em exame.
Estará em exame o grau de dificuldade dos exames. Exames mais acessíveis tenderão a ser interpretados como forma de promoção de sucesso escolar com objectivo de promover estatísticas favoráveis ao ME como, aliás, tem acontecido. Exames menos acessíveis serão considerados como excessivamente selectivos.
Estará em exame a política do ME. Com o ano conturbado que se viveu e o clima que a PEC – Política Educativa em Curso instalou nas escolas, os resultados nos exames tenderão a ser instrumentalizados, quer sejam mais positivos, o empenho e o profissionalismo resistente dos professores, quer sejam menos positivos, a perturbação introduzida nas escolas teria de ter consequências.
Estará em exame o trabalho dos professores e escolas, tanto o desenvolvido nas aulas como o desenvolvido em dispositivos de apoio e em condições de funcionamento contributivas para o maior ou menor sucesso. Também aqui os resultados, seja qual for o sentido, serão apropriados pelas diferentes visões em campo. Ou serão apropriados por estruturas representativas dos professores ou pelo discurso do ME.
Finalmente, estará em exame o conhecimento e o grau de preparação dos alunos, justificação primeira da sua existência.
Aguardemos então pelas primeiras apreciações, o grau de dificuldade dos exames.

HISTÓRIA DA MIÚDA TRISTE

Um dia o Manel estava na biblioteca da escola e de forma concentrada percorria as prateleiras com ar de quem procura. O Professor Velho, o que está na biblioteca e fala com os livros, voltava do chá da manhã e vendo o Manel foi oferecer ajuda.
Olá Manel, posso ajudar-te a procurar alguma coisa.
Olá Velho, ando à procura de um livro de rir.
Livro de rir?! Não estou a entender.
Conheces aquela miúda, a Lara, que veio há pouco tempo para a nossa turma?
Sei quem é, mas não conheço muito bem.
Pois é Velho, a Lara está sempre triste. Está tão triste que quando a gente chega ao pé dela, olha para nós e eu acho que os olhos dela roubam o riso à gente, ficamos tristes também. Lembrei-me que se houvesse um livro de rir ela já se ria e não ficava com os nossos risos.
Talvez te possa ajudar, espera um pouco.
O Professor Velho foi à sua secretária e voltou com um caderno. Quando o Manel lhe pegou ficou espantado.
Velho, estás a brincar, o caderno não tem nada escrito.
Manel, vais experimentar assim, sentas-te com a Lara e mais alguns colegas, os que quiserem, começam a lembrar-se das coisas cómicas que vos aconteceram e vão escrevendo no caderno. Eu acho que toda a gente se vai rir e a Lara vai devolver os vossos risos que ela tem guardado, mas não sabe o que fazer com eles. Se calhar, esqueceu-se de como se ri.

segunda-feira, 15 de junho de 2009

CARTA AOS ALUNOS DO SECUNDÁRIO

Meus caros,
Pois é, eles aí estão os exames nacionais. Durante os próximos dias o programa está assegurado, exames e mais exames. O trabalho realizado durante o ano, durante os anos, vai ser testado. Alguns de vós sentir-se-ão relativamente tranquilos enquanto outros, a maioria, começam a sentir a ansiedade a subir. É normal, afinal trata-se de um exame e um bocadinho de ansiedade ajuda-nos a estar mais concentrados. Para alguns de vocês os resultados serão muito importantes para acederem ao ensino superior na escola e no curso que vos interessa, mas para todos significa cumprir uma tarefa da vossa vida escolar, o que é sempre significativo. Muita gente, pais, professores, colegas, vos dá conselhos nesta altura, “estuda mais”, “descansa um pouco”, “devias fazer assim”, “era melhor desta maneira”, “não te esqueças de nada”, “toma atenção”, “começa pelas mais fáceis”, “revê no fim”, etc. É normal, é certo que às vezes ainda nos inquieta mais, mas, como diz o Paulo Bento, é preciso encarar esta época com tranquilidade.
Como é de prever alguns de vós acharão os exames mais fáceis e outros mais difíceis, depende sempre do que cada um sabe e dos conteúdos do exame, aquela história clássica de “ainda bem que saiu isto, sabia bem” ou, pior, “logo havia de sair isto que não estava tão preparado”, nada a fazer, é as circunstâncias e em toda a nossa vida nos defrontamos com circunstâncias mais ou menos favoráveis. Sabemos que a vossa tarefa não é fácil mas estou convencido que para a maioria de vós as coisas vão correr bem, o vosso trabalho e a ajuda de professores e pais merece.
Boa sorte e divirtam-se, se possível.

O RAPAZ QUE CRESCEU DEPRESSA

Era uma vez um Rapaz, desculpem mas as histórias têm de começar assim, que mesmo em pequeno não parecia pequeno. Eu explico. Logo de gaiato interessava-se mais por estar perto dos adultos que dos miúdos da sua idade, tinha comportamentos que espantavam as pessoas pois eram praticamente a cópia de um adulto bem comportado. Gostava de conversar com os adultos e interessava-se pelos temas de conversa que, normalmente, são mais habituais nos adultos. Não revelava particular interesse por coisas típicas dos mais pequenos. Nunca lhe conheceram uma asneira ou disparate daqueles que os miúdos fazem. A família revia-se enlevada nos elogios que os outros pais faziam, “que maturidade!”, “tão adulto!”, “que inteligente, nem parece ter a idade que tem!”. Estranhamente, até a roupa de que gostava era mais do género adulto certinho do que de miúdo. Os pais sempre o incentivaram neste estilo e alguns professores felicitavam os pais pela excelente educação que o Rapaz revelava. E assim se foi passando a vida do Rapaz que cresceu depressa. Estranhamente para toda a gente quando ficou mais crescido começou a entristecer e sentir-se infeliz. Todas as noites o Rapaz sonhava que era pequeno e brincava com os miúdos e miúdas da sua idade a todas as brincadeiras que tinha visto fazer e nunca quis participar, sonhava que fazia asneiras nas aulas e que pregava partidas a professores e aos outros adultos. Sonhava que era adolescente e tinha uma namorada com quem trocava beijos às escondidas, fumava uns cigarros sem os pais saber e saía com os amigos para ir a ouvir a música. Sonhava que dizia asneiras e se vestia como os outros rapazes. Quando acordava e se olhava no espelho percebia que a sua infância e juventude não passavam de sonhos e voltava a sentir-se infeliz.
Ninguém pode passar sem ser puto e jovem, ninguém pode crescer depressa.

domingo, 14 de junho de 2009

O RESPEITO PELOS CABELOS BRANCOS

Sabemos como o mundo é composto de mudança tomando sempre novas qualidades, Camões disse-o no Séc. XVI. No entanto, as novas qualidades que o mundo toma nem sempre parecem qualidades. Vem isto a propósito do aumento exponencial de casos de violência dirigida a idosos, triplicaram entre 2000 e 2007. Uma das alterações mais significativas dos últimos anos, na minha opinião, é a percepção social dos traços de autoridade, ou seja, a forma como a generalidade das pessoas encara a autoridade através de diferentes traços. Uma farda era percebida como um traço de autoridade, algumas profissões eram percebidas como um traço de autoridade, por exemplo, os professores, médicos, funcionários da administração pública, etc. eram percebidos com autoridade, a idade, é este o meu ponto, era também percebida como um traço de autoridade. Deste quadro resultava que, para a generalidade das pessoas, a presença destes traços era suficiente para inibir comportamentos menos ajustados. Só para dar um exemplo, quando eu era pequeno, bastava a entrada do professor para que nos calássemos. No que respeita aos velhos ainda me lembro de expressões como “tenho respeito pelos seus cabelos brancos” ou “respeito-o pela sua idade”.
Hoje em dia, com a alteração da percepção dos traços de autoridade, já não basta a sua presença para regular comportamentos pelo que, também por aqui, se pode perceber este aumento da violência contra os velhos. Isto significa que, mais do que nunca, os processos educativos precisam de entender e adaptar-se a estas mudanças para que os valores embora, volto a Camões, tomando sempre novas qualidades, se mantenham como qualidades.

O QUE SOMOS E O QUE PARECEMOS

Umas das expressões que recorrentemente oiço e recorrentemente me incomoda é “isto é um país de ricos” e argumenta-se sempre com os telemóveis, carros, férias, uso de restaurantes, etc. Talvez valha a pena, sem que queira inquietar o vosso Domingo, perceber como, de facto, não somos um país de ricos. Segundo o INE e considerando os dados do primeiro trimestre deste ano, 40,6 % dos trabalhadores têm um salário líquido inferior a 600 €, 12,4 % acima de 1200 € e 0,6 % acima de 3000 €. Se considerarmos as assimetrias regionais, o Norte e os Açores têm a percentagem mais alta de pessoas com menos de 600 € líquidos, 49,7 % e 55,3 % respectivamente.
Não, definitivamente não somos um país de ricos. A convergência com outros países sempre prometida e sempre adiada é apenas isso mesmo, um desejo adiado. Mais provavelmente somos um país em que os valores que de mansinho se instalaram, consubstanciados no “és o que tens”, nos têm levado a uma definição de opções e prioridades que nos fazem parecer sem ser.
Mas isso é uma outra história.

sábado, 13 de junho de 2009

A ESCOLA NOVA DA ESCOLA DA PONTE

Ao longo dos mais de trinta anos da sua existência a Escola da Ponte foi-se habituando a iniciativas mais ou menos óbvias, designadamente por parte do ME, no sentido de lhe dar fim. O Projecto liderado durante muito tempo por José Pacheco segurou-se por uma razão óbvia, a qualidade do trabalho desenvolvido, reconhecido nacional e internacionalmente.
O último episódio ameaçador do Projecto Escola da Ponte é um edifício novo. A Escola tem instalações degradadas e o ME e a autarquia de Santo Tirso acharam por bem que partilhasse um novo edifício com outra escola. À primeira vista até nem parece estranho, mas quem conhecer a forma de trabalho da Escola da Ponte percebe com clareza que a co-habitação com outra escola no mesmo edifício não é facilmente compatível e porá em risco a essência do seu trabalho, o que está a preocupar os encarregados de educação dos alunos da Escola da Ponte.
Talvez não fosse descabido recuperar a ideia de autonomia da escola que o ME sempre refere para, de facto e não apenas na retórica, se entender que Projectos como o da Escola da Ponte são vitais, embora não absolutos, nada é, para o desenvolvimento da qualidade no nosso sistema educativo.

OS SOBRESSALTOS DO CORAÇÃO

A agenda das consciências tem conteúdos que não deixam de ser surpreendentes. Não me passava pela cabeça que hoje se assinala o Dia Mundial do Ritmo Cardíaco mas é verdade. No fundo até me parece justificada a preocupação com o ritmo a que o nosso coração bate.
Nos últimos tempos há mais que motivos para as arritmias, O PS, sobretudo os seus dirigentes, ainda está tentar recuperar o ritmo depois da surpresa dos resultados das europeias. O Dr. Portas, excitadíssimo com a votação do CDS-PP depois de uma morte anunciada pelas sondagens ainda nem caiu em si, o coração parece que salta do peito. Parte do país sentiu o coração a bater mais forte com os valores envolvidos na obscena transferência de Cristiano Ronaldo para o Real Madrid, a outra parte teve o mesmo sintoma mas pela indignação com o negócio. Com as dificuldades sentidas, designadamente endividamento e desemprego, muitos dos portugueses vivem com o coração aos saltos. A ansiedade sobre se a actual gripe pandémica H1N1, ex-mexicana e ex-suína, afinal vem ou não também não ajuda nada à tranquilidade.
Com as autárquicas e as legislativas à vista e depois das europeias, a excitação vai ser mais que muita, vai ser uma prova dura para muitos corações. Há cautela, estou de volta de uma chávena de chá verde, dizem que faz bem ao coração.

POR CIMA DO CÉU

Aqui no meu Alentejo está uma noite daquelas. Quente, brisa branda e um céu que visto daqui parece sempre maior do que quando se vê de Almada. Estava a pensar que lá mais acima deve estar fresco e lembrei-me dos Mestres artesãos que trabalham por cima do céu. Sorte a deles.
Eu explico, aqui bem pertinho, nas Alcáçovas, é a terra do Mestre João Chibeles Penetra um dos artesãos que fazem chocalhos. Aliás, Alcáçovas sempre foi reconhecida como uma terra donde saíam os melhores chocalhos das mãos dos mestres chocalheiros. Pois o Mestre João e o seu amor aos chocalhos deram corpo ao Museu do Chocalho que justifica a visita e mais abaixo ainda se encontram os petiscos alentejanos da Taberna do Gasolina que dão alma a qualquer motor. Mas como ia dizendo, quanto se começa nas lérias a gente perde-se, a propósito do céu, lembrei-me dos mestres que trabalham por cima do céu. É verdade, o Mestre João gosta de referir que os mestres chocalheiros são os únicos que trabalham por cima do céu. A parte de cima dos chocalhos chama-se o céu e os mestres trabalham por cima do céu quando estão a pôr a asa no chocalho. Aprendeu esta léria há já muito tempo, conta ele, com um moiral na feira de Garvão.
Deve ser bom trabalhar por cima do céu, sobretudo numa noite como esta.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

O TRABALHO DAS CRIANÇAS

Manda a agenda das consciências que hoje nos lembremos do Dia Mundial contra o Trabalho Infantil.
A situação nesta matéria deixou, felizmente, de apresentar os números impressionantes de há alguns anos atrás, de acordo com a Autoridade para as Condições do Trabalho, apenas foram detectados este ano quatro casos. É certo que algumas situações passarão despercebidas e muitas outras existirão numa zona de fronteira, de difícil a avaliação, sobretudo na área do que poderemos chamar de “ajuda familiar”. No entanto, tem emergido uma situação que pode levantar sérias dúvidas, o chamado trabalho artístico, a participação de crianças em espectáculos e publicidade. Para além das questões legais e, naturalmente, das implicações económicas, coloca-se uma questão de valores.
De facto, numa sociedade fortemente mediatizada a participação das crianças em espectáculos com audiências e impacto social significativo, pode ser demasiado atractivo para muitas famílias. Ver o rebento como actor ou figurante da novela da noite ou presente numa campanha publicitária de larga divulgação, pode ser uma tentação que, eventualmente até de forma inconsciente, negligencie a qualidade de vida e o bem-estar dos miúdos.
Finalmente e numa nota lateral sobre trabalho infantil, o actual quadro legislativo permite que uma criança de 10 anos, a frequentar o 5º ano, possa estar na escola 11 HORAS POR DIA, cinco dias na semana. Com este quadro, estranhamente, ainda se levantam vozes a afirmar que os miúdos trabalham pouco. A última foi a da Presidente do Conselho Nacional de Educação, Ana Maria Bettencourt.

HOJE NÃO É DIA DE FALAR DE POBRES

É só para estragar a festa. De facto, num tempo em que o país e o mundo exulta ou espanta-se com a contratação de Cristiano Ronaldo pelo Real Madrid por 93 milhões de euros, num tempo em que se sabe que o miúdo com bons pés e sem cabeça, vai ganhar, consta, 10 milhões por ano, que se sabe estar em Los Angeles de férias e que comemorou o contrato com uma despesazinha de 15 000 euros numa noite em companhia de Paris Hilton, que bom gosto, logo haviam de continuar a falar de crise e de pobreza, Até já vi alguém da ONU afirmar que a verba envolvida poderia alimentar 8,5 milhões de etíopes, minudências.
Sempre que falo de futebol reafirmo o meu gosto pelo mesmo mas, sem demagogia, este negócio é um insulto ético. Poderia falar da crise, dos desempregados sem subsídio, das necessidades dos Bancos Alimentares, da aflição urgente das instituições de solidariedade social, da luta pela sobrevivência diária de milhares de reformados e pensionistas, mas não falo disso. Hoje, não é dia de falar de pobres.
Só do pobre do Cristiano Ronaldo.

TELEVISÃO A PARTIR DOS 6 MESES, UAU!!!!!!

Estou verdadeiramente entusiasmado, assisti há minutos a publicidade da ZON informando que, finalmente, tem disponível na sua grelha de canais o BabyFirst, destinado a crianças dos seis meses aos seis anos, sim dos seis meses aos seis anos. O cabo permite esta inesgotável capacidade de diferenciar a oferta e os alvos. Por curiosidade consultei o site do BabyFirst e fiquei descansado, os conteúdos têm a participação de especialistas em desenvolvimento infantil e em educação, se tem especialistas está bem. Aquelas horas que os miúdos portugueses passam em média à frente do ecrã, entre 4 e 6 segundo os diferentes estudos, podem ser agora alargadas aos mais pequenos que não tinham oferta especializada. Têm sido, aliás, bem frequentes as manifestações de desagrado das crianças dos seis meses aos seis anos face à escassez da oferta televisiva a si destinada, sendo assim obrigados a consumir produtos destinados a populações bastante mais velhas, portanto, inadequados e, até, perigosos.
Também os pais podem a partir de agora ficar bastante mais descansados. Aquela ideia de pendurar um plasma por cima do berço do bebé, em vez do ultrapassado “mobile”, ganha agora todo o sentido, vai apoiar o seu desenvolvimento. Uma outra ideia pode ser colocar um ecrã bem grande à frente daqueles parques onde se trancam os putos, o que fará, naturalmente, maravilhas pelo seu desenvolvimento. É ainda de registar o tempo livre que os pais irão ganhar pelo facto de os seus bebés e crianças ficarem a desenvolver-se à frente da televisão, o que lhes permitirá a eles próprios seguirem outros canais.
Assim sim, está protegido o superior interesse da criança e a comunicação familiar.

quinta-feira, 11 de junho de 2009

A EXPLICAÇÃO PARA TODOS

A propósito da realização dos exames nacionais que se iniciam na próxima semana a imprensa de hoje apresenta vários trabalhos sobre a “explicação”. Ao que parece embora afectada também pela crise, na procura desde o início do ano, nesta altura mais próxima dos exames a os “centros de explicação” estão com taxas de ocupação satisfatórias, dizem os seus responsáveis.
A instituição explicação é velha e orienta-se em duas grandes direcções, a ajuda ao aluno pouco trabalhador e motivado que pressionado pela família vai para a explicação à procura d um sucesso menos trabalhoso, ou, por outro lado, tenta minimizar dificuldades que a escola, pelas mais variadas razões não consegue atenuar. Como alguns dos responsáveis ouvidos nos diferentes trabalhos da imprensa referem, uma explicação de última hora não garante sucesso, importa regularidade e continuidade nesse trabalho. Em alguns das peças noticiosas também se refere algo de muito importante, muitos alunos não são eficientes na forma como se organizam para estudar, são pouco autónomos. Quando este tipo de matéria, os métodos de estudo, não é trabalhado na escola, surge, obviamente, a necessidade da ajuda externa para suprir ou minimizar essas dificuldades.
Por outro lado, sabemos todos que as explicações são caras, mais caras se forem individuais, constituindo-se, aliás, como um excelente nicho de mercado em educação. Tal facto significa que o acesso à explicação está, naturalmente, condicionado pelas disponibilidades económicas das famílias, independentemente do actual cenário de crise. Quer isto dizer que a aposta e o investimento em recursos e apoios disponibilizados na escola pública, promovendo ao limite a sua qualidade é, continua a ser, a única forma de garantir a equidade de oportunidades para o sucesso, caso contrário só estará acessível a quem tenha dinheiro para o comprar.

UM MIÚDO CHAMADO PENSADOR

Era uma vez um miúdo chamado Pensador. Tinha uns treze anos e a sua vida não andava fácil. Tinha um comportamento que lhe criava algumas dificuldades. Não havia assunto ou circunstância em que estivesse envolvido que não fizesse uma enorme quantidade de perguntas, pensava algum tempo nas respostas, voltava às perguntas e, por vezes, algum tempo depois, ainda tornava à mesma questão sempre iniciando as suas frases por um “Estive a pensar e …”. Já trazia esta forma de funcionar desde pequeno mas os adultos, usando a sua adulta autoridade, mandavam-no calar quando faltava a paciência para tanto pensar, os colegas, às tantas já nem lhe ligavam e diziam lá está o Pensador.
Agora mais crescido e com uma sólida capacidade de argumentação, já não era tão fácil que se calasse por indicação dos adultos e, por outro lado, os colegas, apesar de o acharem chato, até achavam graça à sua permanente inquietação e às discussões que desencadeava, quando se cansavam voltavam costas. O Pensador não desistia e continuava com o seu “Estive a pensar e …” mas, aos poucos, percebeu que as pessoas iam deixando de falar com ele e, até, responder às questões que colocava.
Os professores, quase todos, agiam como se ele não estivesse na turma e fugiam de qualquer diálogo, os colegas deixavam-no só.
O Pensador começou a pensar que a sua vida ficava complicada, assim só arranjava problemas e tentava encontrar forma de resolver esta situação. De tanto pensar encontrou a solução, deixou de pensar.
Passou a ter uma vida muito mais tranquila. Até já gostavam dele, chamavam-lhe Pensador Certinho.
Ninguém deu por isso, mas o Pensador aprendeu a pensar só para si.

quarta-feira, 10 de junho de 2009

CARTA A PORTUGAL

Meu caro Portugal,

Em novo 10 de Junho volto a escrever-te. Se bem te lembras na carta que te enviei o ano passado já te dizia que não te sentia bem, achava-te em baixo, como diz o teu povo, hoje acho mesmo que não estás nada bem. Neste ano que passou instalou-se por todo o mundo uma complicada situação a que tu também não conseguiste fugir. Muita gente sem trabalho e sem esperança em dias melhores. As lideranças que acolhes também não parecem capazes de prover a esperança. Entretêm-se nos jogos da política pequenina, provavelmente por falta de competência para a política grande. Como se não bastasse a crise instalada ainda aparece uma rapaziada a gerir empresas e bancos que conseguem delapidar milhões que, em decisões difíceis de entender, terão de ser pagos com o dinheiro e sacrifícios do cidadão. Os casos de corrupção e manhosices dos pequenos e grandes poderes não têm fim e ninguém parece substantivamente empenhado em contribuir para o seu fim.
Pois é meu caro e velho Portugal, estás a atravessar um período nada fácil. Imagina que ouvi há minutos o teu Presidente da República preocupado com o facto da tua juventude não estar em boas condições físicas, nas provas físicas de admissão às escolas militares, existem situações, disse ele, em que mais de 40% dos candidatos reprovam por deficiente condição física. Que está a acontecer meu velho? Os adultos de “baixa” ou desempregados, os jovens sem condição física e os velhos a lutarem pela sobrevivência. Não pode ser, temos que dar a volta a isto. Apesar de pequeno tens que protestar, não podemos aceitar não ter futuro meu caro, temos que nos organizar para um projecto de futuro.
Espero que para o próximo ano te possa encontrar em melhor estado. Até lá recebe um abraço de confiança.
10 de Junho de 2009

UM HOMEM FORA DO TEMPO

Era uma vez um Homem que tinha falas estranhas. A propósito de todos os assuntos as suas ideias surpreendiam pela antiguidade. Nem parecia um homem do seu tempo. Acreditava em coisas nas quais já ninguém acreditava há imenso tempo. Julgava que os diferentes aspectos da vida da gente ainda se passavam como há muitos anos se verificava. O Homem defendia valores e ideias que há muito tinham sido abandonados pela quase totalidade das pessoas. O Homem estranhava a reacção ao seu discurso e aos seus pensamentos. Tanto quanto eles eram estranhos para quem os ouvia. O Homem insistia, não encontrava razão para ser diferente. As pessoas também se foram habituando e deixaram de dar importância. Um dia, o Homem estava no jardim a ler e adormeceu. Ao seu lado, uma Pessoa que o conhecia reparou que na palma da mão do Homem, que o abandono do sono deixava exposta ao olhar, estava escrito qualquer coisa que aguçou a curiosidade da Pessoa e permitiu, finalmente, perceber o Homem.
Na palma da mão do Homem estava inscrito o seu prazo de validade. Estava fora de prazo há muito tempo.

terça-feira, 9 de junho de 2009

POLÍTICA PARTIDÁRIA A MAIS, EDUCAÇÃO A MENOS

De forma muito frequente tenho expressado neste espaço a minha profunda discordância com variadíssimos aspectos da PEC – Política Educativa em Curso. Destaco pelo seu impacto, alguns aspectos do Estatuto da Carreira Docente, designadamente, a insustentável divisão dos professores em titulares e outros, o modelo de avaliação que de avaliação já não é nada e de modelo tem pouco, alguns dos aspectos do Estatuto do Aluno, o DL 3/2008 condenando muitos alunos à falta de apoios de que precisam, a pressão estatística de certificação travestida de qualificação, etc. Parece pois clara a necessidade de inflexão de políticas.
No entanto, a ideia da Fenprof de associar o resultado das eleições de domingo à mudança de políticas parece-me mais um mau exercício de política partidária. Desde os primeiros Governos Constitucionais que a pasta da Educação tem sido da responsabilidade do PSD ou do PS. Veja-se o estado a que o sistema educativo chegou nas mãos do centrão. Achar que a subida do PSD e a expectativa de uma eventual vitória nas legislativas alterem substantivamente as políticas educativas, ou é ingenuidade ou política partidária. Continuo a assumir o atrevimento de pensar que a Plataforma Sindical prestaria um melhor serviço aos professores e à educação, se insistisse na demonstração perante a comunidade de como algumas das medidas de política educativa são más para os alunos, são más para os professores e, naturalmente, para as famílias.

MEDIDA DE SAÚDE PÚBLICA

O veto de Cavaco Silva à lei de financiamento dos partidos pode nem vir a ter efeitos práticos pois pode vir a ser reconfirmada no Parlamento. Lembremo-nos de que a lei foi aprovada por unanimidade partidária. No entanto, este veto é um sinal público, mais um, para a partidocracia instalada, uma das causas mais importantes da descredibilização da classe política e da desmobilização dos cidadãos na participação cívica extremamente difícil fora das estruturas partidárias. Se recordarmos o indecoroso espectáculo que tem sido a substituição do Provedor de Justiça, que acabou por renunciar ao cargo um ano depois de ter finalizado o mandato e sem ser substituído porque PS e PSD não se entenderam quanto ao sucessor, percebemos quanto enviesada anda a vida político-partidária, entendem-se todos facilmente no que toca ao aumento do seu financiamento mas não se entendem sobre o Provedor de Justiça, uma minudência num estado democrático.Não é, pois, de admirar que os níveis de abstenção aumentem a cada acto eleitoral.

HISTÓRIA COM JUSTIÇA

O Manel entrou na biblioteca da escola com ar de quem tinha ouvido alguma coisa que não o convenceu. O Professor Velho, o que está na biblioteca e fala com os livros, foi ter com ele e estranhou a cara.
Então Manel, passa-se alguma coisa?
Velho, estivemos na aula de Formação Cívica a discutir sobre o que é a justiça e ser justo. Mas fiquei um bocado baralhado com a conversa. Escuta lá, os professores são justos?
Eu acho que os professores procuram ser justos embora, por vezes, possam ser injustos.
Também acho. Velho, os pais são justos?
Os pais são como os professores, tentam ser justos mas, às vezes, podem ser não conseguir e serão injustos.
Claro. Velho, os polícias são justos?
Manel, é como os professores e os pais. Tenho para mim que os polícias querem fazer as coisas de forma justa mas, se calhar, não conseguem sempre.
Também me parece. Velho, as pessoas que mandam, assim na política, os políticos, são justos?
Muitas vezes não são justos, mas acham sempre que sim.
É o que diz o meu pai. Velho, aquelas pessoas que estão no tribunal, os juízes, são justos?
Manel, embora a função deles seja ser justo, em algumas situações podem não ser.
Esquisito um juiz não ser justo. Velho, os miúdos são justos?
Eu podia dizer-te que sim mas não é verdade, os miúdos não são sempre justos.
Estás a ver Velho, foi o que eu disse à Setôra. Vocês que são velhos fizeram um mundo em que não se pode confiar em ninguém. Não é justo.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

DE BAIXA

De acordo com o DN, um estudo recente envolvendo 24 países europeus revelou que Portugal é o segundo país em que os trabalhadores ficam mais tempo sem trabalhar por razões de saúde, 11,9 dias por ano de “baixa”. As maleitas de maior incidência são as afecções músculo-esqueléticas, stress e doenças psíquicas. Para além de um honroso segundo lugar, que mostra como somos capazes de estar tão doentes como os melhores e de, estranhamente, não estar identificada como causa das doenças a célebre biscatite, doença para fazer biscates, os dados não surpreendem.
Basta atentar na relevância das causas de doença. Somos, de facto, um povo muito afectado por problemas de coluna, dobramo-nos de forma excessiva aos tratos que nos dão, e musculares, mexemo-nos pouco, somos mais do género ficar à espera do que o futuro nos traz, pode ser um subsídio ou o euromilhões. Quanto ao stress, basta viver cá para se perceber como é agitada e stressante a nossa vida. Manter o emprego, esticar um orçamento familiar que encolhe num mês que estica, aceder a todos gadgets inúteis que a publicidade e o life style exigem, assistir ao ruído cacofónico e estéril da nossa cena política, não são tarefas que se levem com tranquilidade, para citar Paulo Bento. Finalmente, as doenças psíquicas que nos afligem e impedem de trabalhar. Claro que a degradação ambiental produzida por discursos que por vezes parecem insultar a nossa inteligência, a toxicidade de muitos comportamentos que nos insultam os valores, só pode influenciar a nossa saúde mental induzindo estados depressivos ou a negação da realidade de natureza esquizóide.
Isto não está fácil, ainda meto uma baixa.

É PRECISO QUE ALGO MUDE PARA QUE TUDO FIQUE NA MESMA

Depois de assentar a poeira levantada pelos resultados eleitorais de ontem voltaremos à realidade mais dura, designadamente, a crise e os seus efeitos. Voltaremos também ao Portugal dos Pequeninos e às suas manhosas incidências, o BPN, o BPP, a corrupção, a impunidade, a injustiça da justiça, etc.
A propósito, ficamos hoje a saber que um dos barões do cavaquismo, um inspirador “self-made man”, Dias Loureiro, que numa “brilhante” carreira” política e empresarial se transformou num dos mais bem sucedidos gestores cá no burgo, afinal, não tem praticamente bens em seu nome, umas ninharias em contas bancárias e o património disperso por off-shores e em nome de familiares. Tocante esta preocupação com o bem-estar da família e dos mais próximos neste homem até há pouco Conselheiro de Estado e que se encontra mergulhado no poço sem fundo dos crimes no BPN e SLN.
Porque será que nunca mais perde actualidade a mítica referência de Lampedusa em “O Leopardo”, “tudo deve mudar para que tudo fique na mesma”? Lamentavelmente parece o destino.

O HOMEM QUE SÓ FALAVA VERDADE

Era uma vez um Homem que nasceu com um problema que nenhum médico, e muitos tentaram, conseguiu entender. O Homem só conseguia dizer a verdade, quando tentava dizer alguma coisa que não fosse verdade a sua boca recusava-se a falar. Como é evidente este problema só se revelou na altura em que o Homem começou a falar de forma mais evoluída. Os seus pais começaram a sentir-se pouco à vontade para saírem com ele. O Homem, em qualquer circunstância, dizia sempre o que achava ser verdade, causando frequentes embaraços. Durante a juventude sofreu bastante com este seu funcionamento, as pessoas incomodavam-se seriamente com as verdades que o Homem dizia.
O Homem tinha a esperança de que quando crescesse a sua vida ficasse um pouco mais fácil, acreditava que entre os adultos dizer a verdade fosse mais tolerado. A sua expectativa não se verificou, antes pelo contrário, ninguém parava ao seu lado, a verdade, afinal também para os adultos, parecia insuportável. Saltava de emprego em emprego, de relação em relação, mas tudo corria mal, a verdade acabava sempre por atrapalhar. Entristeceu devagarinho e depois entrou em depressão profunda, sempre calado, até que partiu sem sobressalto e sem incomodar ninguém.
O mundo não está mesmo preparado para lidar com os Homens que só falam verdade.

domingo, 7 de junho de 2009

OPOSIÇÕES FORTES, MELHOR POLÍTICA

Está acabado, contrariamente às minhas expectativas não ganharam todos, o PS perdeu, Sócrates dixit. Continuo a insistir que para além da contabilidade dos votantes, importa atentar nos não votantes, mais de seis em cada dez eleitores não votaram. Este dado será o grande condicionador das próximas eleições, autárquicas e legislativas. No entanto, deve salientar-se a importância do crescimento do peso eleitoral das oposições, à esquerda e à direita do PS. É essencial para a qualidade das democracias a existência de oposições fortes que minimizem e regulem tentações absolutistas e regulem as políticas definidas. Oposições fortes podem minimizar a arrogância dos discursos e dos comportamentos de quem governa na medida em que se assumem como alternativas políticas. A propósito, fiquei preocupado por ouvir, numa curta declaração à RTP, o Ministro da Cultura, Pinto Ribeiro dizer qualquer coisa como estas eleições “não eram a sério”. Sendo, parece, um homem da cultura manifestamente não entende o que se passou hoje.
Esperemos pois, que oposições mais fortes contribuam para melhores políticas. Daqui a uns meses veremos o resultado.

ANTES DE DIZER QUE GANHARAM, PENSEM NO QUE SE PERDEU

Antes de começar a retórica do ganharam todos, pensem no que se perdeu. Costumo dizer que uma das vantagens da velhice é ter história e ter histórias. Hoje, dia eleições para o Parlamento Europeu, ao andar pela rua sem notar nada que lembrasse o acto eleitoral, lembrei-me das primeiras eleições realizadas em Portugal depois de 1974, livres, como lhes chamámos. Realizaram-se a 25 de Abril de 1975 e tratava-se da eleição para a Assembleia Constituinte. Provavelmente, os mais novos não saberão e alguns dos mais velhos não se lembrarão mas votaram uns esmagadores 91,2% dos cidadãos inscritos. Depois de um período sem eleições livres a mobilização foi espantosa, lembro-me de que se viam autênticas romarias para os locais de voto. Passei cerca de 5 horas numa fila de gente para votar e não se ouvia um protesto, antes pelo contrário, o clima parecia de festa, a festa da cidadania e da democracia.
Hoje, quando forem conhecidos os primeiros resultados virão as lideranças partidárias, todas, reclamar vitória, a curiosidade está apenas nos critérios de justificação porque todos “ganharão”. Em bom rigor, a posição política que mais eleitores terá atraído será justamente a abstenção, não será de espantar um valor superior a 60%. Este é que é o verdadeiro resultado eleitoral a carecer de análise. Que fizemos da nossa mobilização para a participação? Que fizemos da nossa capacidade de acreditar que o voto faz sentido? Porque se instalou esta atitude de descrença e indiferença? Porque estaremos convencidos de que “não adianta” “são todos iguais”?
Estas e outras questões, creio, deveriam ser o mais sério objecto de análise de toda a gente que, daqui a umas horas, encherá os espaços da comunicação social.

VIZINHANÇA

(Foto de Gonçalo Afonso Dias)

Todo o mundo é composto de mudança, tomando sempre novas qualidades, dizia Camões. Quando era miúdo, na minha terra, como em todas as terras, havia vizinhos, às vezes mais da família que a família. Estas relações de vizinhança eram a base da vida da comunidade. Ajudavam nos problemas, partilhavam as alegrias, faziam companhia na solidão. Muitas vezes, nem lhes chamávamos pelos seus nomes, eram só vizinhos e vizinhas. Eram tudo.
Hoje, as pessoas vivem mais juntas mas mais sós, o vizinho é apenas o tipo do andar de cima que troca um envergonhado bom-dia no elevador. Continuo a não o chamar pelo nome, nem sequer sei qual é, mas também não é o vizinho, é apenas o tipo do andar de cima.

sábado, 6 de junho de 2009

A NOVA PRESIDENTE DO CONSELHO NACIONAL DE EDUCAÇÃO

Ontem não tive oportunidade de colocar umas brevíssimas notas sobre a entrevista de Ana Maria Bettencourt, a nova Presidente do Conselho Nacional de Educação. O CNE é um órgão consultivo do Governo para as políticas educativas. Poderia ter uma função institucional importante dada a sua constituição e competências, se os governos consultassem. O problema é que o actual Governo, na sua arrogante omnisciência e infalibilidade não consulta, ou melhor, consulta apenas quem, antecipadamente, sabe que terá exactamente o mesmo pensamento que o seu. Lembro que o CNE presidido por Júlio Pedrosa divulgou alguns pareceres e produziu iniciativas de excelente mérito mas sem acolhimento na PEC – Política Educativa em Curso.
Quanto a Ana Maria Bettencourt, gostei do sublinhar da importância da qualidade na educação portuguesa, não gostei da cedência ao populismo ao afirmar que alunos e professores precisam de trabalhar mais, os alunos portugueses passam horas excessivas na escola, não precisam de trabalhar mais, precisam de trabalhar melhor. O trabalho diário dos professores pode ser optimizado, claro que pode, mas o problema não é, obviamente, pouco trabalho dos professores, é, outra vez, melhor trabalho, melhores apoios e melhores recursos. Os problemas dos resultados escolares baixos não se resolvem com mais “chumbos”, resolvem-se, insisto, com melhor trabalho e melhores dispositivos de apoio.
Finalmente, não entendo a insistência ao longo da entrevista na citação do sistema finlandês. O PS, origem de Ana Bettencourt, claro, parece ter uma relação fetichista com a Finlândia. Portugal e as suas comunidades escolares têm particularidades e especificidades contextuais que não autorizam comparações, independentemente do que de excelente qualidade se possa fazer nas escolas finlandesas.
Esperemos para ver.

CABEÇAS SEM DONO

Pode parecer uma coisa estranha mas existem coisas pequenas que, quando reparamos bem nelas acabam por parecer do tamanho do mundo, outras vezes olhamos para o mundo e ele próprio parece pequeno. Aqui no meu Alentejo lembrei-me de Moçambique, já vos tenho trazido histórias de lá, mais uma. Em Inhambane, terra da boa gente, estava uma noite à conversa com o velho Bata, aquele que sabia escrever nem que fosse com uma Parker e era capaz de ler até à última letra, e começámos a falar, não me recordo porquê, daquelas pessoas que passam a vida a querer agradar aos outros, que dizem, pensam e fazem o que alguém mandar, de pessoas que “não existem” por si, que não têm ideias próprias, etc. Depois de umas trocas de exemplos e considerações sobre as nossas experiências de vida nesta matéria, o velho Bata rematou.
Sabe, há pessoas que têm a cabeça guardada numa gaveta e quando têm que sair e pôr um chapéu, vão buscar a cabeça para o segurar, são umas cabeças sem dono.
Esta coisa de uma cabeça sem dono pareceu-me curiosa. De vez em quando ainda me interrogo se consigo mesmo ser o dono da minha cabeça e noto como, de facto, tanta gente tenta ser o dono da cabeça dos outros.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

CAMPANHA ELEITORAL E DIA MUNDIAL DO AMBIENTE

Estou a ver a síntese das últimas sondagens mas a lembrar-me que no calendário das consciências hoje se assinala o Dia Mundial do Ambiente.
Como é habitual surge a retórica da protecção do ambiente, da mudança de comportamentos e atitudes, da defesa da biodiversidade, etc. etc. Pode parecer-vos disparatado mas talvez fosse interessante reflectir também sobre o ambiente social e político de que a campanha eleitoral para as europeias nos deu bons exemplos.
Algumas notas. Trocar insultos e não ideias é mau para o ambiente. Proteger os riscos dos investimentos especulativos e negociatas manhosas de banqueiros sem escrúpulos com o nosso dinheiro é mau para o ambiente. Decisões estranhíssimas dos tribunais que fundamentadas em burocracias e papéis são gravosas para a vida dos miúdos, são péssimas para o ambiente. Discursos arrogantes que “esquecem” as dificuldades tremendas que milhares de portugueses atravessam fazem mal ao ambiente. Utilizar estas dificuldades como arma política em declarações demagógicas e populistas degrada o ambiente. O indecoroso espectáculo do longo desentendimento relativo à substituição do Provedor de Justiça e a unanimidade rapidamente encontrada sobre a lei de financiamento dos partidos, situação sublinhada por Jaime Gama é devastador para o ambiente.
Parece, pois, que dimensões como seriedade política, ética, valores, tolerância, sentido de estado e de serviço, bem-estar comum, etc. são bens em vias de extinção. Será que ficarão confinados a um qualquer parque “ecológico” para não nos esquecermos que já existiram?